As quatro horas do funeral do homem que “vai mudar o mundo”
Joe Raedle
Depois de seis dias de luto e homenagem em três cidades dos Estados Unidos - Raeford, Houston e Minneapolis -, amigos e família, quase todos de branco, despediram-se de George Floyd, o homem que morreu vítima da violência policial. O funeral decorreu esta terça-feira
A morte de George Floyd, vítima de violência policial, inspirou protestos e manifestações em vários pontos do mundo. “Não consigo respirar”, repetiu nos últimos minutos de vida, quando o polícia que o imobilizava espetava o joelho no seu pescoço durante 8 minutos e 46 segundos. Floyd morreu em Minneapolis a 25 de maio.
Depois de seis dias de luto e homenagem em três cidades dos Estados Unidos - Raeford, Houston e Minneapolis -, amigos e família, quase todos de branco, disseram-lhe adeus esta terça-feira. A cerimónia fúnebre, financiada pelo pugilista Floyd Mayweather, decorreu numa igreja de Houston e contou com diversos oradores, familiares, políticos e alguns ativistas pelos direitos civis. Mais de 500 pessoas estiveram presentes, usando máscaras contra a covid-19, entre as quais algumas famílias de vítimas da brutalidade policial e racial. No cortejo fúnebre e à porta ficaram centenas de populares.
“Third Ward, Cuney Homes, foi onde ele nasceu, mas toda a gente vai lembrar-se dele em todo o mundo. Ele vai mudar o mundo”, disse o irmão, Rodney Floyd, aqui citado pela agência Associated Press.
Getty Images
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“Obrigado ao mundo pelo que fizeram pela minha família inteira”, disse na Igreja Fountain of Praise Kathleen McGee, tia do homenageado, aqui citado pelo “Washington Post”. “O mundo conhece George Floyd. Eu conheço Perry Jr.” Perry é o nome do meio de George.
“Enquanto eu respirar, a justiça será feita pelo Perry”, anunciou a sobrinha, Brooke Williams, apontando a mira para Derek Chauvin, o polícia que cravou o joelho no pescoço de Floyd. “As leis têm de mudar. Chega de crimes de ódio, por favor. Alguém disse para fazermos a América grande outra vez, mas quando é que alguma vez a América foi grande?” Brooke referia-se ao slogan da campanha presidencial de Donald Trump “make America great again”. Depois de contar algumas histórias, de revelar a fé no “sorriso e cérebro” que o tio George tinha em si, deixou um seco “agora é tudo o que eu tenho, memórias”.
Entre algumas mensagens mais emocionais surgiu também a trégua para anúncios. O mayor de Houston, por exemplo, revelou que a polícia deixou de estar autorizada a recorrer à manobra mata-leão quando tem alguém sob custódia, conta o “Post”. Os presentes aplaudiram Sylvester Turner.
Antes passou um vídeo de Joe Biden, ex-vice-presidente dos Estados Unidos e candidato democrata à Casa Branca em novembro de 2020. “Porque é que neste país os afro-americanos acordam sabendo que podem perder a vida simplesmente por estarem a viver?”, questionou. Biden lamentou ainda que crianças como Gianna, a filha de seis anos de Floyd, tenham de perguntar o que se passou com os pais delas. “Agora é tempo de justiça racial. Essa é a resposta que devemos dar para as nossas crianças quando perguntarem ‘porquê?’. Porque, quando houver justiça para George Floyd, estaremos em direção à justiça racial na América. E depois, como disseste, Gianna, o teu papá terá mudado o mundo.”
O elogio fúnebre ficou entregue ao reverendo Al Sharpton, o pastor da Igreja Baptista e ativista pelos direitos civis. “O Presidente fala em meter nas ruas o exército mas ele não disse uma palavra sobre os oito minutos e 46 segundos do homicídio policial de George Floyd. Ele desafiou a China pelos direitos humanos. Mas e o direito humano de George Floyd?”, questionou. “Até sabermos que o preço da vida de um negro é o mesmo do que a vida de um branco, voltaremos a estas situações uma e outra vez.”
Al Sharpton não deixou passar o episódio em que Donald Trump desfilou numa avenida para ser fotografado ao pé de uma igreja, o qual foi antecedido por uma carga policial. “O Presidente usa balas de borracha e gás lacrimogéneo para retirar das ruas manifestantes pacíficos e depois leva a bíblia e caminha à frente de uma igreja e usa a igreja como um adereço.”
Durante o elogio fúnebre, conta o “Post”, Sharpton fez uma pausa e chamou alguns familiares de outras vítimas de violência policial e racial que se tornaram símbolos também eles da luta contra o racismo e abusos dos direitos humanos e civis. À medida que o pastor pediu aos familiares de Trayvon Martin, Eric Garner, Botham Jean, Pamela Turner, Michael Brown e Ahmaud Arbery para se levantarem, as palmas encheram aquele lugar. “Todas estas famílias vieram apoiar esta família porque eles sabem melhor do que ninguém a dor que vão sofrer pela perda que tiveram.”
Depois de quatro horas, “Big Floyd”, num caixão dourado, foi finalmente enterrado ao lado da mãe, no cemitério Houston Memorial Gardens, em Pearland.
O funeral foi transmitido em direto pela agência Efe: pode rever AQUI