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O que é o Antifa, o movimento que Trump quer classificar como organização terrorista?

O que é o Antifa, o movimento que Trump quer classificar como organização terrorista?
Warrick Page/Getty Images

Os seus membros identificam-se com ideologias de extrema-esquerda, descrevendo-se a maioria deles como revolucionários anticapitalistas. Vestem-se de negro, muitas vezes cobrindo a cara com máscaras e capacetes para não serem identificados pelas forças de segurança e pelos grupos de extrema-direita que combatem. Apesar da agenda assumidamente antifascista, o movimento já mereceu a crítica de destacadas figuras da esquerda americana

O que é o Antifa, o movimento que Trump quer classificar como organização terrorista?

Hélder Gomes

Jornalista

O Presidente dos EUA, Donald Trump, anunciou este domingo que o país iria classificar o movimento Antifa como uma organização terrorista. A decisão surgiu na sequência dos protestos violentos que se seguiram à morte por asfixia do afro-americano George Floyd por um agente da polícia de Minneapolis na segunda-feira passada. Muitos manifestantes juntaram-se nos últimos dias no exterior da Casa Branca, o que levou a segurança pessoal de Trump a colocá-lo num bunker.

Esta não é a primeira vez que o Presidente norte-americano aponta o dedo aos elementos do Antifa. Mas que movimento é este? O dicionário da Merriam-Webster apresenta duas definições genéricas de Antifa: 1) uma pessoa ou um grupo que se opõe ativamente ao fascismo; 2) um movimento antifascista. Ainda segundo aquele dicionário, o primeiro uso conhecido do termo remonta a 1946, sendo que etimologicamente este decorre da palavra alemã “Antifa”, uma abreviatura de “antifaschistisch”, ou seja, “antifascista”.

Em 1932, o Partido Comunista Alemão fundou a Antifaschistische Aktion, uma frente multipartidária destinada a combater o nazismo. Os membros do Antifa identificam-se com ideologias de extrema-esquerda, descrevendo-se a maioria deles como revolucionários anticapitalistas. Vestem-se de negro, muitas vezes cobrindo a cara com máscaras e capacetes para não serem identificados pelas forças de segurança e pelos grupos de extrema-direita que combatem.

O recurso justificado à violência

O movimento defende o recurso à violência no confronto com forças que classificam como fascistas, autoritárias, racistas, xenófobas ou homofóbicas. Não se conhece o número de pessoas que em todo o mundo se identificam como Antifa. O movimento não tem líderes oficiais e organiza-se em células locais autónomas, mantendo um elevado secretismo. O Expresso tentou contactar algumas destas células com presença nas redes sociais, mas não obteve resposta.

Os críticos da decisão de Trump lembram que os EUA não têm uma lei para o terrorismo doméstico e que o Antifa não é um movimento com um líder ou uma estrutura definida, escreve o jornal “The New York Times”. “O argumento é que o antifascismo militante é inerentemente de autodefesa por causa da violência historicamente documentada que os fascistas representam, especialmente para as pessoas marginalizadas”, diz o professor de História do Dartmouth College, no estado de New Hampshire, Mark Bray, citado pelo diário norte-americano. Autor do livro “Antifa: The Anti-Fascist Handbook”, o académico lembra que muitos Antifas também participam em formas mais pacíficas de organização comunitária.

O uso da violência é justificado por considerarem que se os grupos racistas e fascistas são autorizados a organizar-se livremente, “isso resultará inevitavelmente em violência contra comunidades marginalizadas”. Mais pessoas começaram a juntar-se ao movimento nos EUA após a eleição em 2016 de Trump como Presidente para combaterem a ameaça que a chamada ultradireita representa, sinaliza o académico, acrescentando que os Antifas recorrem frequentemente a táticas semelhantes às de grupos anarquistas e professam ideologias sobrepostas.

“Um grande presente para a direita”

Apesar da agenda assumidamente antifascista, o movimento já mereceu a crítica de figuras destacadas da esquerda americana, designadamente a presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, e o linguista e filósofo Noam Chomsky. A condenação mais recente do movimento teve o seu ponto alto em 2017. Em agosto desse ano, em Charlottesville, nos EUA, um supremacista branco avançou com um carro sobre uma multidão de ativistas antirracismo, matando Heather Heyer, e provocando dezenas de feridos. Entre os ativistas contavam-se muitos Antifas.

Apenas cinco dias após os acontecimentos trágicos, Chomsky dizia à revista “Washington Examiner” que o movimento não era senão “uma franja minúscula da esquerda” e representava “um grande presente para a direita”, incluindo a direita militante, que, segundo ele, estaria exuberante. Os seus ativistas estão frequentemente mal organizados e o que fazem é muitas vezes errado e genericamente autodestrutivo, continuava o filósofo. E dava exemplos da tal conduta errada: o bloqueio de conversações, a destruição de propriedade ou o recurso à violência física.

Quando a confrontação passa à violência, é sempre o mais duro e o mais brutal que vence, sublinhava ainda Chomsky. Apesar de se demarcar de Trump, que reiteradamente faz equivaler supremacistas brancos a antifascistas, o filósofo não foi poupado após as críticas que fez: foi comparado ao Presidente americano e houve mesmo quem defendesse que Mitt Romney, candidato do Partido Republicano às eleições de 2012, era agora mais de esquerda do que Chomsky. “Li muitas críticas delirantes. A algumas delas respondi. A essas não vou responder”, atalhou, em entrevista concedida ao jornal “Público” em 2018.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: hgomes@expresso.impresa.pt

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