Internacional

EUA processam Snowden por publicação de livro em que denuncia “massivo sistema de vigilância global”

Em 2013,o ex-consultor da NSA trouxe a lume o programa de vigilância dos EUA
Em 2013,o ex-consultor da NSA trouxe a lume o programa de vigilância dos EUA
FOTO REUTERS/Bobby Yip

De acordo com o processo, Snowden publicou o livro sem submetê-lo “à apreciação e revisão” de agências encarregadas de fazer esse trabalho, “violando assim os procedimentos a que ficou obrigado” pela assinatura de acordos de confidencialidade com a CIA, bem como com a NSA, agências para as quais trabalhou. Além disso, falou publicamente sobre assuntos relacionados com informação sigilosa, o que, lê-se no processo, também constitui uma “violação desses acordos”

EUA processam Snowden por publicação de livro em que denuncia “massivo sistema de vigilância global”

Helena Bento

Jornalista

No dia em que é publicado simultaneamente em 22 países o livro de memórias de Edward Snowden, o analista que publicou milhares de documentos confidenciais sobre o programa de vigilância dos EUA e foi acusado de espionagem e apropriação de segredos do Estado por causa disso, os EUA avançaram com um processo contra Snowden, alegando que o livro, intitulado “Vigilância massiva, registo permanente” (edição Planeta), “viola os acordos de confidencialidade assinados tanto com a CIA como com a NSA”.

De acordo com o processo, Snowden publicou o livro sem submetê-lo “à apreciação e revisão” de agências encarregadas de fazer esse trabalho, “violando, assim, os procedimentos a que ficou obrigado pela assinatura desses acordos”. Além disso, falou publicamente sobre assuntos relacionados com informação sigilosa, o que, lê-se no processo, também constitui uma “violação dos acordos de confidencialidade”.

Em comunicado publicado no seu site, o Departamento de Justiça dos EUA afirma que o objetivo não é “travar ou impor restrições à publicação e distribuição do livro”, mas sim “impedir” que o analista “fique com quaisquer receitas de venda”, uma vez que “não o submeteu a uma revisão antes da publicação”. É ali ainda explicado que, além de Snowden, está a ser processada também a editora, a Macmillan norte-americana, “para garantir que nenhum dinheiro” feito com a publicação do livro chegue às mãos do analista “enquanto o caso está a ser analisado pelo tribunal”. “A informação confidencial deve servir para proteger a nossa nação, não para ser utilizada em proveito próprio”, afirmou G. Zachary Terwilliger, procurador do estado de Virginia.

“Ajudei a tornar tecnologicamente exequível para um governo coligir as comunicações digitais do mundo inteiro”

Numa passagem do livro cedida pela editora para efeitos de pré-publicação, Snowden conta que durante os sete anos em que trabalhou na Comunidade da Informação (CI) americana, teve a oportunidade de “participar na mais significativa mudança na história da espionagem americana – a passagem da vigilância de alvos individualizados para a vigilância massiva de toda a população”. “Ajudei a tornar tecnologicamente exequível para um governo coligir as comunicações digitais do mundo inteiro, arma­zená-las por períodos indefinidos e consultá-las à vontade”, diz.

Também conta como chegou à CIA — numa altura em que as agências “estavam a violar todas as regras que tinham estabelecido no empenho de contratar talento técnico”, nomeadamente a regra de não contratar ninguém que não “tivesse pelo menos um bacharelato, ou, mais tarde, no mínimo frequência uni­versitária”, sendo que ele não tinha nenhuma dessas coisas — e como se apercebeu do esquema de vigilância massiva montado pelos EUA depois de ter ido trabalhar para o Havai, contratado pela NSA.

“Nas profundezas de um túnel sob uma plantação de ananases – uma antiga fábrica subterrânea de aviões da era Pearl Harbor –, sentava-me diante de um terminal que me dava um acesso quase ilimitado às comunicações de praticamente qualquer homem, mulher ou criança que à face da Terra usasse um telefone ou um computador. Entre essas pessoas havia cerca de 320 milhões de cida­dãos americanos, meus compatriotas, que na condução normal das suas vidas quotidianas eram vigiados numa grosseira contravenção não só da Constituição dos Estados Unidos como dos valores mais básicos de qualquer sociedade livre”.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: hrbento@expresso.impresa.pt

Comentários
Já é Subscritor?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate