Remunerar prestadores de cuidados de saúde com base na qualidade e não na quantidade de doentes atendidos
Alteração do modelo de financiamento do sistema de saúde permitirá ganhar eficiência e aumentar a prevenção, dizem especialistas
José Fernandes
Projetos Expresso. É uma das medidas propostas no estudo sobre “Organização e o Financiamento do Sistema de Saúde em Portugal” e que permitirá baixar custos. O estudo analisou as principais fragilidades do SNS e delineou sugestões de melhoria para o bem-estar da população e para garantir o equilíbrio do sistema. À segunda-feira, o “Mais Saúde, Mais Europa” reúne os principais destaques da agenda da semana, num projeto do Expresso com apoio da Apifarma
Francisco de Almeida Fernandes
"O surgimento da pandemia covid-19 expôs de forma ainda mais assertiva a relevância e a urgência de um sistema de saúde resiliente e sustentável”, diz ao Expresso o consultor Hermano Rodrigues, da EY-Parthenon. O especialista esteve envolvido no estudo sobre “Organização e o Financiamento do Sistema de Saúde em Portugal”, em parceria com o ISEG e a pedido do Health Cluster Portugal, que analisou as principais fragilidades do SNS e delineou sugestões de melhoria. Em causa está o modelo de reembolso do Estado aos prestadores de serviços de saúde, que atualmente é feito com base no número de doentes atendidos e não privilegia a prevenção da doença. “Neste modelo [Value-Based Healthcare], a remuneração dos prestadores passa a depender dos resultados alcançados e não do volume de serviços prestados”, explica.
Esta nova visão implica o tratamento com uma perspetiva integrada, “menos focada na doença isolada ou aguda e mais atenta ao bem-estar geral do indivíduo”, acabando por favorecer a prevenção, a melhoria da qualidade dos serviços e a gestão eficiente. Significa isto que, adotando esta estratégia, será possível poupar nos custos e aumentar a satisfação dos doentes numa altura em que desafios como o envelhecimento e as comorbilidades colocam cada vez mais pressão no sistema, ameaçando a sua sustentabilidade a longo prazo.
“Num modelo value-based, o “valor” é calculado com base nos resultados em saúde para os pacientes e nos custos incorridos para atingir tais resultados”, garante Hermano Rodrigues, EY-Parthenon
Entre as medidas sugeridas pelo estudo, pede-se mais autonomia e responsabilização dos diferentes agentes – públicos, privados e sociais -, a alteração para um modelo de reembolso baseado nos ganhos em saúde e a garantia de que os doentes têm acesso aos cuidados de forma atempada. No campo da prevenção, tanto a investigação científica como a recolha de dados, por exemplo através de ensaios clínicos, permitem uma atuação rápida e antecipada no desenvolvimento de doenças, área em que os especialistas acreditam que o país pode melhorar. “A digitalização dos processos e a telemonitorização pela utilização de dispositivos médicos é uma aposta clara e de nicho que Portugal deve aproveitar”, acredita Joaquim Cunha. O diretor executivo do Health Cluster Portugal diz ainda que “somos reconhecidamente early adopters de tecnologias noutros segmentos, temos empresas muito bem posicionadas para alavancar e posicionar Portugal nesta área”.
O investimento em ciência e saúde é visto como essencial para dar corpo a um dos pilares que orientam a estratégia europeia para o futuro, a resiliência. É, também, um dos grandes objetivos da Presidência Portuguesa do Conselho da UE, cuja atividade o “‘Mais Saúde, Mais Europa” continua a acompanhar em permanência até julho através de dois artigos semanais. Adicionalmente, a iniciativa do Expresso com o apoio da Apifarma promove o debate com o evento “Cancro: Cada Dia Conta”, a 26 de maio.
Conheça a agenda da semana:
Segunda-feira, 10
Discutir o potencial da biotecnologia para a saúde e para a economia será o foco do evento «Construir a partir da biotecnologia: das vacinas ao crescimento económico para a Europa», organizado pela Associação Europeia de Bioindústrias (EuropaBio) e a Associação Portuguesa de Bioindústria (P-Bio). Além de representantes destas e outras coletividades sectoriais, marcam presença o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior Manuel Heitor e representantes de empresas dedicadas à investigação científica nesta área.
No centro da discussão vão estar as aprendizagens que a pandemia de covid-19 permitiu ao longo dos últimos 16 meses, nomeadamente no que respeita à colaboração entre instituições e países no desenvolvimento de vacinas, baseadas na biotecnologia, em tempo recorde. “A pandemia deixou clara a importância de construir um ambiente que apoie a I&D e a inovação no domínio da saúde na Europa”, assinala Heitor Costa, diretor executivo da Apifarma, que diz ainda ser evidente “que as parcerias público-privadas podem apresentar resultados para combater as ameaças à saúde pública”.
“Os modelos value-based emergem como uma potencial resposta para promover a sustentabilidade dos sistemas de saúde e, simultaneamente, uma melhoria da qualidade e dos resultados dos cuidados de saúde”, aponta Hermano Rodrigues. Este será, aliás, um dos temas discutidos pelo grupo europeu La Valletta, que se reúne esta terça e quarta-feira. A questão do acesso a medicamentos e terapias inovadoras está na génese deste comité, nascido após a assinatura da Declaração de La Valletta, em 2017.
A iniciativa junta dez países europeus e representa cerca de 160 milhões de cidadãos, tendo como missão a cooperação e partilha de informação sobre financiamento, negociação de preços e compras conjuntas, entre outros objetivos ligados à acessibilidade de medicamentos. A reunião acontece à porta fechada.