Como a Inteligência Artificial já deteta e prevê incêndios - e até ajuda a perceber por onde se propaga
MIGUEL PEREIRA DA SILVA
Elaborado para trabalhar 24 horas todos os dias da semana, independentemente das condições climatéricas, o sistema da empresa portuguesa Bee2Fire protege empresas de biomassa, florestas e até zonas arqueológicas através da detenção precoce de incêndios. Com alerta imediato. Em Portugal (e lá fora) já há quem o use
Quase 147.000 hectares arderam em Portugal no ano de 2024. O terceiro pior ano nesta década, apenas ultrapassado pelos mais de 560 mil hectares em 2017 e os 165 mil hectares em 2016. Na tentativa de evitar que ocorram catástrofes semelhantes a empresa Bee2Fire, detida pela ItGest, desenvolveu um sistema inteligente de deteção precoce e previsão de incêndios.
A Bee2Fire nasceu fruto da preocupação com os incêndios florestais e com as alterações climáticas. O objetivo seria integrar ferramentas de inteligência artificial (IA) para monitorizar e prevenir incêndios. Através da IA e com recurso a câmaras ótico-térmicas e técnicas de espetrometria, são recolhidas imagens e interpretadas em tempo real até uma distância de 15 quilómetros. “O sistema deteta uma coluna de fumo e [avalia] se está, de facto, a começar um incêndio para poder alertar as autoridades de forma a poderem atacar, gerir e parar o incêndio o mais rapidamente possível”, explica Anselmo Bueno, diretor executivo da Bee2Fire.
Como a prevenção é um “pilar fundamental” neste projeto, o sistema de deteção funciona “24 horas por dia, sete dias por semana em qualquer condição climatérica”. Para ser capaz de detetar um incêndio durante a noite, foi integrada a imagem térmica no sistema de ótica para detetar o calor do fogo.
Uma das preocupações essenciais era garantir uma instalação fácil, por isso, é aproveitado o equipamento existente. “Em dois dias o equipamento está instalado e a funcionar perfeitamente. O importante é que esteja a uma altura de, pelo menos, 15 metros para ter uma visão ótima do que queremos proteger”, diz ao Expresso o responsável pelo projeto. É também realizada uma avaliação da densidade da vegetação, a topografia, as condições climáticas e as possíveis fontes de risco.
Exemplo de um dos equipamentos de deteção instalados da Bee2Fire
D.R.
O sistema é constituído pelas câmaras, mas conta também com dados das estações meteorológicas para o algoritmo perceber através da velocidade do vento e temperatura de que forma se vai desenvolver o fogo, assim como também é possível incluir dados de satélite e sensores para analisar a qualidade do ar e o nível de dióxido de carbono (CO2). “Com todos estes dados, o sistema Bee2Fire vai analisar e adicionar à interpretação das imagens a possibilidade de que exista um incêndio e saber como o fogo se vai propagar, para que os bombeiros ou as autoridades possam ter dados fiáveis. Quanto mais dados, mais fácil é analisar, mais fácil é interpretar e mais fácil é atacar o fogo”, descreve Anselmo Bueno.
O alerta de incêndio é, posteriormente, transmitido às Câmaras Municipais, bombeiros ou equipa responsável pelo local para que possa ser validado por um humano e se possa agir em conformidade. A empresa garante que a taxa de falsos avisos é “bastante baixa”. “Pode acontecer que o sistema confunda uma nuvem com uma nuvem de fumo em ocasiões muito raras, mas isso também ajuda a saber que o sistema está a funcionar e que a inteligência artificial está a aprender a identificar um falso positivo”, explica.
Desde florestas a reservas naturais até instalações industriais, o sistema Bee2Fire pode ser aplicado em vários locais. Esta solução “versátil” está atualmente implementada em vários países. Enquanto no Equador protege a área florestal da área metropolitana de Quito, na Grécia o dispositivo está instalado em zonas arqueológicas, no Brasil implementaram na Amazónia, em Espanha protegem zonas industriais e em Portugal atuam na Navigator, REN, Celbi e algumas Câmaras Municipais.
Ao longo dos anos, os responsáveis da Bee2Fire têm notado que cada vez mais há empresas e municípios interessados em instalar o sistema porque “já não é apenas o incêndio em si que é o mais importante, são os danos que o incêndio causa à economia”. Ainda assim, Anselmo Bueno alerta que “um incêndio não tem apenas custos económicos, mas também custos para a biodiversidade, para a flora, para a fauna, para os níveis de CO2, para os níveis de poluição. O que nós protegemos vale infinitamente mais do que o custo de implementação da Bee2Fire”.
A ajuda imprescindível dos fundos comunitários
Desde a sua existência a empresa Bee2Fire contou com vários apoios de fundos comunitários, entre os quais cerca de 734 mil euros através do programa COMPETE 2020, dos quais 420 mil são provenientes do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER), para desenvolver o projeto FireAI, cujo objetivo era desenvolver um sistema de deteção de incêndios florestais inteligente.
“Os fundos europeus são muito importantes porque nos ajudam a investir na inovação e no desenvolvimento e na tecnologia”, salienta Anselmo Bueno. Descreve ainda que um dos principais desafios é a sensibilização para a importância de investir na prevenção de incêndios, por isso, o apoio financeiro é crucial para “continuar a consolidar a solução e a crescer com o projeto, incorporando novas tecnologias, incorporando novos sensores, incorporando novas câmaras e evoluindo com a tecnologia, porque o que é moderno hoje já não é válido amanhã”.
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