Inflação revista em baixa dá margem para que discussão de corte de juros seja mais cedo do que tarde, defendeu o governador do Banco de Portugal, que acredita que contratos de crédito com Euribor a 3 meses já refletem prestações mais baixas
O Banco Central Europeu (BCE) decidiu manter intactas as taxas de juro, a sua presidente, Christine Lagarde, não quis sequer falar em cortes, mas o governador do Banco de Portugal admite que a questão não é se essa discussão vai acontecer; é quando. E será mais cedo do que o antecipado.
“O ciclo de descidas de taxas de juro vai chegar mais cedo”, declarou Mário Centeno na conferência de imprensa desta sexta-feira, 15 de dezembro, no Museu do Dinheiro, em Lisboa, por ocasião da apresentação do Boletim Económico.
Repetiu o governador: “Com tudo o resto constante, a redução de taxas de juro vai ter início de forma mais precoce face à redução mais acelerada da inflação”.
“Com os dados que temos hoje, o processo inflacionista que experimentámos foi de natureza temporária”, declarou o governador. “Foi um choque na oferta, justificado por crise energética e por uma guerra”, avançou Centeno aos jornalistas.
Segundo o Boletim Económico do Banco de Portugal, atualizado em dezembro, “a inflação deverá prosseguir a trajetória descendente, reduzindo-se de 5,3% em 2023 para 2,9% em 2024 e para 2% até ao final do horizonte de projeção”.
Estes números refletem uma revisão em baixa face às projeções apresentadas em outubro, no último Boletim Económico. Também as projeções mais recentes do BCE apontavam para uma descida da inflação mais intensa do que o esperado. Frankfurt vê a inflação em 2,7% em 2024, um número revisto em baixo face aos 3,2% que esperava em setembro.
Assim, a ideia é que há tréguas para que o BCE seja menos restritivo, com corte nos juros, agora que a inflação se aproxima da meta de 2%.
Christine Lagarde com menos margem de manobra para adiar corte de juros
“Não é uma questão de se vai acontecer, porque vai acontecer num contexto em que não há choques adicionais – mas sim quando vai acontecer”, continuou, dizendo que será sempre preciso analisar os dados que vão ficando disponíveis a cada reunião do Conselho do BCE:
Palavras de Centeno um dia depois de Christine Lagarde ter dito que esse corte não esteve em cima da mesa do Conselho do BCE, que junta os governadores do euro: “Não discutimos de todo o corte nos juros”. Como o Expresso deu conta, os mercados de derivados estão a antecipar cinco descidas nas taxas.
Contratos a 3 meses já refletem juros mais baixos
Na conferência de imprensa, Centeno falou das Euribor e de como elas próprias já estão a descer e, assim, vão começar a influenciar os contratos de crédito à habitação com taxas variáveis.
“Nos mercados, atingimos o topo das taxas Euribor no quarto trimestre de 2023. Os contratos com a Euribor a três meses, a partir de dezembro, janeiro, já vão refletir uma ligeira redução das taxas. Em fevereiro, março, abril, vai passar para os contratos com indexantes a 6 meses, depois a 12 anos. Se não houver nenhum choque adicional, esta vai ser a trajetória que vamos observar”, continuou Mário Centeno.
Aliás, o líder da autoridade bancária considera também que “não há nenhum indicador de aumento do incumprimento”. “Não há razões objetivas para que incumprimento aumente”, continuou.
O que há são casos excecionais, não gerais - e aqui, Centeno está alinhado com aquela que é a narrativa dos gestores bancários: “É um fenómeno que ocorre ao nível de cada família, e há situações mais difíceis, e para as quais existem mecanismos, quer legais, quer no que é o acompanhamento que os bancos fazem das famílias e da situação financeira, que deverão dar resposta a essas circunstancias”, explicou Mário Centeno.