Há um banco a operar em Portugal que desrespeitou uma determinação transmitida especificamente pelo Banco de Portugal; desrespeitou porque quis. Esse mesmo banco não cumpriu as exigências mínimas que asseguram o controlo interno do que se passa lá dentro; não cumpriu sabendo que não cumpria. Além disso, e ainda que sem querer, esse mesmo banco passou informação falsa ao supervisor.
Estas são infrações cometidas, entre 2015 e 2020, por um banco que está a operar no país. Um banco que foi condenado a uma coima única de 200 mil euros. Um banco que não contestou a decisão da autoridade liderada por Mário Centeno e, a 12 de setembro, pagou essa coima. Um banco cuja identidade fica – como outros casos – no segredo do supervisor.
O Banco de Portugal é obrigado a divulgar os casos em que estejam infrações especialmente graves, como as cometidas neste caso, mas a legislação abre a porta a que haja “anonimato” quando a divulgação é “desproporcional” face à gravidade, quando põe os mercados em causa, ou quando pode causar “danos” desproporcionais. A divulgação deste caso foi feita esta sexta-feira, 3 de novembro, mas sem a identidade.
A autoridade bancária tem-se socorrido bastante desta legislação, aliás, a par do que acontece na legislação aplicável à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários: os supervisores preferem chegar a acordo, aplicar uma coima e evitar a ida para os tribunais, sabendo que a divulgação pública dos visados é prejudicada. Nem quando a coima foi de 1 milhão de euros o supervisor disse quem era – o Expresso divulgou-o depois quando apurou que o visado era o Banco Atlântico Europa.
Quase tudo anónimo
Há um outro processo de 200 mil euros, igualmente divulgado esta sexta-feira, em que há iguais incumprimentos das ordens do Banco de Portugal, e incumprimento dos requisitos mínimos do sistema de controlo interno entre 2019 e 2023. O banco visado já pagou a coima em agosto deste ano. Mas, mais uma vez, trata-se de uma “decisão divulgada em anonimato”.
Ao todo, dos 18 processos de contraordenação divulgados esta sext-feira, 11 conduziram à aplicação de coimas, no valor global de 745 mil euros. Seis processos ficaram-se por uma admoestação, um registo que configura a sanção mais leve.
Uma só exceção
Só um outro processo levou a uma coima global de 50 mil euros, não incluída na soma de 745 mil euros porque, neste caso, é identificada a empresa e o arguido individual: Suleimane Darame e Suleimane Darame – Comércio Geral, por praticar atividade financeira não autorizada. Em 2021, o supervisor já tinha anunciado que este estabelecimento comercial, que se situava em Lisboa, não estava habilitado a receber e enviar dinheiro de clientes para o estrangeiro, porque não estava autorizado pelo Banco de Portugal. Depois, abriu o processo e agora veio a sanção, 10 mil euros para a empresa, 40 euros para o arguido individual. Ambas são suspensas em metade do valor por dois anos.
Na prática, o supervisor divulga as infrações especialmente graves cometidas, aplica as coimas, mas não revela quem cometeu tais falhas. Os processos podem vir de anos anteriores, tendo agora sido concluídos – em nenhum caso houve apresentação de recursos judiciais, pelo que os casos “morrem” aqui.
Mais novos processos, menos fechos
Estes foram casos agora revelados, quando a autoridade bancária também divulgou as estatísticas do período entre julho e setembro deste ano. “No decurso do terceiro trimestre de 2023, o Banco de Portugal instaurou 306 e concluiu 213 processos de contraordenação”, segundo o comunicado.
Nos processos que foram concluídos – que agregam não só os visados com infrações especialmente graves, mas com outras que não têm de ser divulgadas –, foram aplicadas coimas de 1,55 milhões de euros.
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