Fundo de Resolução esgota todo o ativo do BES: nada fica para os restantes 5 mil credores para já
Luís Máximo dos Santos, presidente do Fundo de Resolução e vice-governador do Banco de Portugal
Alberto Frias
Supremo Tribunal de Justiça confirma que Fundo de Resolução tem créditos privilegiados sobre o BES, pelo que é ele que consegue ficar com todo o património do BES. Restantes acionistas ficam sem rede. Esperança é só para os comuns recuperarem 31,7% do investimento no futuro
O Fundo de Resolução vai ficar com todo o dinheiro da liquidação do Banco Espírito Santo. A confirmação foi dada depois da sentença proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça no mês passado.
“Por Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido em 11 de julho de 2023, já transitado em julgado, os créditos reclamados pelo Fundo de Resolução, no montante de € 791.694.980,00, € 448.873.911,25 e € 2.000.000,00, foram reconhecidos e qualificados como privilegiados”, indica um comunicado do BES, colocado o site da instituição.
Ao todo, são cerca de 1,2 mil milhões de euros do BES “mau” a que o Fundo de Resolução, veículo que funciona junto do Banco de Portugal e que recebe contribuições dos bancos portugueses, tem direito, segundo determinou o tribunal. Foi dinheiro colocado pelo Fundo no Novo Banco e que depois o veículo presidido pelo vice-governador, Luís Máximo dos Santos, considerou que a ele tinha direito junto do BES. Os tribunais foram decidindo a favor do Fundo, mas a comissão liquidatária do BES foi reclamando, perdendo agora no Supremo, decisão noticiada esta sexta-feira pelo Eco.
O ativo do BES – o que ficou da resolução aplicada ao banco de Ricardo Salgado em 2014 – era de 172 milhões de euros no fim do ano passado: “Considerando que esse ativo é insuficiente para o pagamento integral do crédito privilegiado do Fundo de Resolução, o BES não terá saldo para pagar às classes seguintes de créditos (créditos comuns e créditos subordinados)”.
Ou seja, a comissão liquidatária presidida por César Brito escreve que não havendo sequer dinheiro para pagar todo o crédito do Fundo, não terá massa para distribuir pelos restantes cerca de 5 mil credores que reclamaram ressarcimento pelos investimentos que ficaram por pagar no BES.
Rasto de destruição do banco liderado Ricardo Salgado ainda não foi apagado. Autor: Patrícia de Melo Moreira/AFP via Getty Images
Recuperação no futuro?
Apesar de dizer que não tem como pagar a credores comuns e a credores subordinados, a comissão liquidatária do BES lembra que “um dos princípios orientadores para a prossecução das finalidades da resolução e na aplicação de medidas de resolução é o de que nenhum acionista ou credor da instituição de crédito objeto de resolução pode suportar um prejuízo superior ao que suportaria caso essa instituição tivesse entrado em liquidação – o também chamado no creditor worse off principle”.
Foi contratada a Deloitte para fazer a auditoria que calculou o que receberiam os credores do BES se, a 3 de agosto de 2014, o Banco de Portugal tivesse determinado a sua liquidação imediata e não a resolução, como aconteceu. E concluiu que acionistas e os credores subordinados nada receberiam nessa situação (pelo que não têm de ser compensados), mas os credores comuns, sim, teriam nas suas mãos 31,7% do investimento. De recordar que, na resolução, a ideia era que os credores comuns passassem para o Novo Banco, mas o supervisor acabou por transferir novamente alguns dos obrigacionistas para o BES “mau” para o libertar dessas responsabilidades; e esses, diz a lei, têm de ser compensados.
Ora, os credores comuns têm de ser compensados e o legislador determina que é, precisamente, o Fundo de Resolução que tem de fazer essa compensação.
Agência do antigo BES. Autor: PATRICIA DE MELO MOREIRA/AFP via Getty Images)
Dúvidas na concretização
Quando saiu a lista de credores, o Expresso calculou em cerca de 700 milhões de euros o valor que poderia ter de ser pago, tendo em conta que é essa a percentagem de 31,7% do valor de credores seniores reconhecidos. Entre os credores comuns encontravam-se, à data, grandes gestoras de ativos como a Pimco e a BlackRock, ou entidades internacionais como o BBVA e Credit Suisse, e ainda sociedades nacionais como o BIC e o Fundo de Pensões da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa.
Porém, há dúvidas ainda sobre quando será feito (a liquidação termina já em breve, ou ainda demora), que acionistas efetivamente têm mesmo direito (só os que já eram credores a 3 de agosto de 2014 ou também quem comprou a seguir), e qual o montante exato.
“Relativamente aos credores comuns cujos créditos não foram transferidos para o Novo Banco, S. A., o direito à compensação pelo Fundo de Resolução será determinado no encerramento do processo de liquidação do BES. Até lá, haverá ainda que esclarecer um conjunto de complexas questões jurídicas e operacionais, nomeadamente quanto à titularidade do direito à compensação pelo Fundo de Resolução, pelo que, tudo considerado, não é possível, por ora, estimar o montante da compensação a pagar no encerramento da liquidação do BES”, é o que indica o Fundo de Resolução no relatório e contas relativo a 2022.
Esta é uma via que fica para os credores comuns, sendo que a justiça é a esperança para outros: há credores que se sentem lesados pela queda do BES e que esperam poder ser ressarcidos através do dinheiro que está arrestado à luz do processo-crime do BES.