Os processos em que os bancos negociam com os clientes situações de incumprimento aumentaram em 2022, tanto nos créditos à habitação, como nos empréstimos ao consumo. Porém, neste último caso a subida foi tão expressiva que superou os níveis pré-pandemia.
As conclusões podem retirar-se do relatório de supervisão comportamental do Banco de Portugal, divulgado esta terça-feira, 28 de março, e referem-se ao regime extraordinário para gerir situações em que os clientes não conseguem fazer face às suas dívidas: o PERSI, Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento.
“Aumentaram os processos PERSI em 2022 no crédito aos consumidores, superando os níveis do período de pré-pandemia”, adianta o documento, que revela que a expansão desses casos foi em crescendo ao longo do ano: “no primeiro semestre foram iniciados neste tipo de crédito, em média, 54 961 processos PERSI por mês e no segundo semestre foram iniciados, em média, 63 464 processos PERSI por mês, valores superiores aos de 2021”.
Quase metade das dívidas em incumprimento deveu-se à utilização dos cartões de crédito, sendo 48,7% dos processos iniciados. “O crédito pessoal e o crédito automóvel representaram, respetivamente, 18,6% e 6,2% dos contratos integrados em PERSI”, segundo o relatório.
Iniciaram-se, no ano passado, 710 mil processos de renegociação dos créditos ao consumo com os bancos, mas só foram concluídos 691 mil, e apenas 38% dos quais com regularização do pagamento. Nas situações em que estas negociações não são bem-sucedidos, a ida para tribunal é a solução mais frequente para o banco ser ressarcido.
Crédito à habitação
No caso do crédito à habitação, já se esperava um agravamento dos casos em PERSI porque até ao início do ano anterior (2021) estiveram ainda em vigor moratórias de crédito, criadas para responder à pandemia e que suspenderam o pagamento das prestações. Era normal que com o seu fim as falhas voltassem.
“Em 2022, as instituições reportaram o início de 56 378 processos PERSI envolvendo contratos de crédito à habitação e hipotecário”, diz o documento. Foram, porém, números mais baixos do que os registados no arranque de 2020 e em 2019.
Em 69,1% dos casos que foram encerrados (53 081 no total), houve regularização do incumprimento – pagamento de valores em falta sobretudo, mas também acordo entre as partes. Quando houve acordo, a obtenção de um período de carência para o pagamento de capital ou juros voltou a ser a solução mais adotada, seguida de uma alteração do prazo.
E como evitar incumprimento?
Além do PERSI, regime que é usado para as renegociações entre clientes e bancos quando há já um incumprimento, também há um regime para as situações em que se antecipam dificuldades nos cumprimentos dos créditos, mas ainda não houve falha em nenhuma prestação. É o regime PARI, o Plano de Ação para o Risco de Incumprimento, que foi reforçado pelo Governo no ano passado para que os bancos fossem obrigados a negociar em mais situações devido à subida abrupta das taxas de juro.
No crédito à habitação, “em 2022, em resultado da aplicação dos procedimentos deste regime, foram renegociados 513 contratos visando a implementação de soluções que permitem a mitigação do risco de crédito”. “As condições mais frequentemente renegociadas foram a introdução de um período de carência de capital e juros, a alteração do spread ou da taxa de juro e o alargamento do prazo do contrato”, indica o relatório.
Já nos empréstimos para o consumo (cartões de crédito, automóvel, pessoal, etc), foram renegociados 6485 contratos, sendo que aqui a opção que predomina é o alargamento do prazo do contrato, seguido de mexidas no spread e no juro.
Foi neste relatório de supervisão comportamental que foi revelado que os bancos cobraram indevidamente 3 milhões de euros aos seus clientes em comissões, montante que depois tiveram de devolver.