Ainda longe da reforma? "Os jovens que não se preocuparem com a reforma hoje serão os pobres de amanhã". Três dicas para ajudar
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No futuro seremos menos e muito mais velhos. O que levanta a dúvida sobre quanto e como vão os jovens de hoje receber a reforma. Bárbara Barroso, especialista em finanças pessoais, deixa o aviso e os conselhos: poupar e investir, consistentemente, sem ligar a ‘mitos’
O assunto já não é novo. Há anos que se debate o envelhecimento da população e se será possível pagar pensões a todos no futuro (os especialistas chama-lhe a ‘sustentabilidade da Segurança Social’). Mas terão os jovens de hoje em dia acesso à reforma? Provavelmente sim, uma vez que há peritos a estudarem modelos de financiamento, para que nada falte. Pelo sim, pelo não, os especialistas em finanças pessoais aconselham a que se comece a pensar o mais cedo possível nesse período da vida.
Mas, afinal, qual é o problema?
Portugal - e a Europa em geral - está a ver a sua população a encolher, não em altura, mas em número. Nos próximos 50 anos, estima-se que a população portuguesa caia 18%, como o Expresso já escreveu. Ou seja, seremos menos e muito mais velhos e a população com mais de 65 anos mais que duplicará. Em 2070, 33,1% da população terá mais de 65 anos e 14,7% mais de 80.
Já em 2045, Portugal será o país da UE com o maior rácio de dependência: as pessoas com mais de 65 anos na reforma representarão 66% do total da população em idade ativa.
Tudo isto significa que sai mais dinheiro dos cofres da Segurança Social (para estas pensões, mas não só) e entra menos (por haver menos pessoas a trabalhar, face ao atual). Por esse motivo, já há peritos a estudar um possível novo modelo de financiamento, por forma a tentar garantir que os mais novos não fiquem sem a sua pensão.
Nesta situação, é fundamental cada um pensar na sua situação pessoal. Bárbara Barroso, especialista em finanças pessoais, acredita que nunca é cedo demais para começar a pensar na reforma. “Do ponto de vista financeiro [um jovem] tem uma grande oportunidade de começar a poupar para garantir pelo menos um complemento de reforma”, disse, em conversa com o Expresso.
E não poupou no alerta: “Não tenham dúvida, os jovens que não se preocuparem com a reforma hoje vão ser os pobres de amanhã”. Assim sendo, como fazer? Vamos a dicas.
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O famoso PPR
O Plano Poupança Reforma (PPR) é dos produtos de poupança mais conhecidos pelos portugueses - e muitos dos principais bancos têm várias ofertas neste sentido. Mas estes produtos têm “duas características particulares e únicas que fazem com que seja o preferido dos portugueses”, notou Bárbara Barroso.
Antes é importante referir que existem, de modo geral, dois tipos de PPR: fundos PPR (sem capital garantido, ou seja, para pessoas com um perfil de investidor menos conservador) e seguros PPR (com capital garantido, para os mais conservadores). Existem ainda os unit linked PPR, que são seguros ligados a fundos de investimento e podem ter capital garantido, só uma parte do capital garantido, ou nada.
Mas afinal, quais as características particulares? Os “benefícios fiscais à entrada e à saída”.
No que diz respeito à entrada, no caso dos jovens até 34 anos, pode-se deduzir no IRS, no máximo, 400 euros, desde que se aplique 2000 euros num PPR. Entre 35 e 50 anos, pode-se deduzir até 350 euros, desde que se aplique 1750 euros e a partir dos 50 anos, pode-se deduzir até 300 euros, desde que se aplique 1500 euros.
O benefício à saída é também interessante - ainda que possa parecer um pouco confuso. “A maioria dos instrumentos de poupança são tributados a 28%”, começou por explicar a especialista e autora do livro “Ponha o seu dinheiro a trabalhar para si”. Porém, os PPR têm uma tributação menor e, “se estiver dentro das condições da lei não há nenhuma penalização e pode retirar o dinheiro ao fim de cinco anos tributado (apenas) a 8%”, explicou.
“Os jovens que não se preocuparem com a reforma hoje vão ser os pobres de amanhã”
E quais são as condições? Além de poder resgatar na idade da reforma, sem penalização, pode fazê-lo também se sofrer de uma doença grave, mediante certas condições, se estiver em desemprego de longa duração e também se precisar do dinheiro para pagar prestações do crédito à habitação (apenas prestações e não abater o crédito como um todo). Até ao final de 2023 também é permitido retirar até ao limite mensal do Indexante de Apoios Sociais.
Depois, “se tirar o dinheiro ao final dos mesmos cinco anos sem estar nas condições a tributação é de 21,5%, se tiver entre cinco e oito anos desce para 17,2%, se estiver mais de 8 anos será de 8,6%”. No entanto, estando fora das condições e se o PPR foi usado “para benefício fiscal de entrada, depois tem de devolver” ao Fisco este benefício.
Haverá maneira de contornar? Segundo Bárbara Barroso, o que muita gente faz é ter dois PPR. “Têm um PPR para aproveitar o benefício fiscal de entrada e depois tem outro que não apresenta no IRS, que fica um PPR ‘livre’ que pode mobilizar fora das condições”, explicou. Tal acontece apenas se excluirmos o PPR da declaração de IRS, uma vez que estes vêm automaticamente preenchidos.
Mas, como atentou a especialista: “Cada pessoa faz a sua própria análise”.
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Ser jovem é uma oportunidade para investir a longo prazo
Há PPR com vários níveis de risco e ser jovem é uma oportunidade para acarretar mais risco.
“O que a história nos mostra é que quanto mais tempo se esteja no mercado acionista com exposição a boas empresas, no longo prazo as ações são historicamente a classe de ativos que melhor remunera o capital, sobretudo ações de mercados desenvolvidos”, diz-nos Bárbara Barroso. E dentro dos PPR há uns mais expostos a ações outros menos.
Atualmente, ao analisarmos as rendibilidades dos fundos, estes parecem estar a compensar mais a longo prazo, mas também há um fator extraordinário, como notou a especialista: “2022 foi um ano completamente anormal para os mercados, com todas as classes de ativos a perder dinheiro”.
Assim, quando mais cedo se entra no mercado, em teoria melhor será - visto que “mais tempo permite que se consiga acomodar anos maus no longo prazo e permite que, mesmo num cenário de um ano de perda, ao olhar para 10 ou 20 anos as rendibilidades ainda sejam positivas”. Claro que cabe a cada um analisar se quer correr este risco.
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O que é mais importante (e uma dica extra)
“Esses mitos continuam a levar jovens e adultos a ter o dinheiro parado e todos os dias a empobrecer”
Um dos ‘lemas’ dos especialistas em finanças pessoais - e uma espécie até de ‘guia das boas práticas’ - é ter uma carteira diversificada, isto é, investir em várias classes de ativos (ações, obrigações, etc). Tendo isto em mente, é importante que um jovem “se preocupe em poupar e investir de forma consistente”. Definir uma periodicidade e investir o mesmo valor sempre. Desta forma não está a “tentar adivinhar se está mais barato ou mais caro”, estratégia que, na opinião de Bárbara Barroso, nunca funciona.
E ao contrário do esperado, pode, e deve-se, investir mesmo com pouco dinheiro. Pelo menos, é isso que a especialista sublinha: “Esses mitos continuam a levar jovens e adultos a ter o dinheiro parado e todos os dias a empobrecer”, afirmou, alertando também que, ainda assim, se deve ter atenção às comissões.
Mas há uma ideia base que deve vir primeiro, antes de se pensar na reforma ou em investir, que é o “fundo de emergência”, um dinheiro que esteja guardado para eventualidades e que, segundo Bárbara, deve corresponder a seis ou 12 meses de despesas mensais. E depois sim: “Começar a poupar e investir com consistência, é como ir ao ginásio”.
Este texto faz parte de um conjunto de conteúdos que o Expresso publica para falar diretamente com os leitores mais jovens e sobre aquilo que os afeta mais de perto. Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail.