Aumentos na Função Pública: após 23 anos sem consenso, há acordo entre Governo e sindicatos para atualizar salários e rever carreiras
A Ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva
RODRIGO ANTUNES
Executivo fechou este sábado, com os sindicatos da Administração Pública afetos à UGT, o acordo plurianual para a valorização salarial das carreiras do Estado. A última vez que um acordo desta natureza foi assinado entre o Governo e os sindicatos foi em 1999, também com o STE e a FESAP
Tal como no acordo de rendimentos que o Governo de António Costa conseguiu fechar com patrões e sindicatos para o sector privado, só a Frente Comum (afeta à CGTP) ficou de fora. Depois de várias reuniões bilaterais com as estruturas sindicais da Administração Pública (AP), Mariana Vieira da Silva, ministra da Presidência, fechou este sábado o acordo plurianual para a valorização das carreiras dos funcionários do Estado com as duas estruturas sindicais afetas à UGT, a Fesap e o STE. Acordo será ratificado na próxima segunda-feira, 24 de outubro. Há 23 anos que não acontecia.
A última vez que o Governo conseguiu o aval de duas estruturas sindicais ao seu plano de atualizações salariais foi em 1999, também com o STE e a Fesap. Na altura, Governo e sindicatos acordaram um aumento de 3% na remuneração dos funcionários do Estado, 4% no subsídio de refeição (que passou na altura para 625 escudos) e atualização também de outros subsídios, como o de transporte.
Os números fechados hoje são diferentes. Tal como o Expresso já tinha avançado, ao contrário do que vinha sendo seguido desde 2020, altura em que o Governo começou a alinhar os aumentos salariais da Função Pública com a inflação média dos 12 meses anteriores, para 2023 a proposta apresentada pelo Executivo aos sindicatos passa por aumentos diferenciados, privilegiando os escalões remuneratórios mais baixos.
Assim, o acordo hoje firmado atualiza a Base Remuneratória da Administração Pública para 761,58 euros, valor que fica acima do definido para o salário mínimo nacional, fixa um patamar base de 52 euros (equivalente a um nível remuneratório (ou um mínimo de 2% para a atualização salarial anual de todos os trabalhadores da AP, garantindo um aumento de, pelo menos, 208€ até 2026 e, um aumento também do valor do subsídio de refeição para 5,20 euros, em linha com o aplicado no sector privado, mas com efeitos retroativos a outubro deste ano.
Numa nota enviada às redações, o gabinete de Mariana Vieira da Silva, vinca que “as medidas acordadas integram um programa plurianual que visa garantir previsibilidade no decorrer da atual legislatura”. O acordo para valorização das carreiras públicas prevê ainda o “acompanhamento das medidas previstas no Acordo de Médio Prazo de Melhoria dos Rendimentos, dos Salários e da Competitividade, em sede de evolução da Retribuição Mínima Mensal Garantida (RMMG), e de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares”, avança o Governo. Significa isto que o diferencial entre o salário mínimo nacional e a base remuneratória da AP se manterá e será atualizado a cada ano, tendo como meta os 900 euros em 2026.
SIADAP, tabela remuneratória e valorização de carreiras
O documento, a que o Expresso teve acesso, avança ainda que será implementada a regra da acumulação de pontos sobrantes (acumulados pelo trabalhador durante o período de proibição de valorizações remuneratórias) do SIADAP - Sistema Integrado de Avaliação de Desempenho na Administração Pública, para efeitos de alteração do posicionamento remuneratório, em sede de avaliação de desempenho. O gabinete de Mariana Vieira da Silva realça que a aplicação deste mecanismo reportará ao ciclo avaliativo de 21/22.
Além desta alteração, foi também acordado entre Governo e sindicatos proceder à valorização da carreira de Técnico Superior, com produção de efeitos em janeiro de 2023, concretizando um salto adicional de um nível remuneratório em toda a escala da carreira, o que se traduz, numa valorização de 104 euros. “Esta medida corresponderá, em 2023, a um aumento médio de 5,6% para os trabalhadores da 3.ª à 14.ª posição remuneratória da carreira”, explica o documento.
A Ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva
Também a carreira de Assistente Técnico (AT) beneficiará, já em 2023, de uma subida adicional de um nível remuneratório. Esta medida, conjugada com a valorização remuneratória, “representa um aumento médio de 10,7% das remunerações dos AT em 2023”. Já no caso dos Assistentes Operacionais (AO), o Governo procederá também no próximo ano a uma valorização da carreira/categoria focada no reconhecimento da antiguidade. Está prevista a subida de um ou de dois níveis, respetivamente para os trabalhadores com mais de 15 ou de 30 anos de serviço na categoria. Segundo o Executivo, “esta medida, conjugada com a valorização remuneratória, representa um aumento médio de 7,5% em 2023”.
No seu conjunto, indica o gabinete de Vieira da Silva, as medidas de valorização das diferentes componentes remuneratórias representam uma subida global média de 5,1% dos rendimentos dos trabalhadores em funções públicas em 2023. Note-se, contudo, que apesar deste acordo prever incrementos mais expressivos para os salários mais baixos, esta atualização salarial é inferior à inflação prevista para 2022, com exceção do salário mínimo na AP, que sobe 8%.
Acresce ainda que, segundo declarações públicas do Primeiro-ministro, o Executivo está a trabalhar com um cenário de inflação média anual de 7,4% e a recente projeção do Conselho das Finanças Públicas sinaliza até um valor superior, nos 7,7%. Isto significa que, na prática, tendo em conta a atualização salarial de apenas 0,9% em 2022, os funcionários públicos vão perder poder de compra. A exceção é quem ganha o salário mínimo, como o Expresso vem sinalizando.
A assinatura deste acordo está marcada para a próxima segunda-feira. Depois disso, avança o Governo, “o esforço negocial das partes vai ter continuidade na negociação das várias medidas previstas para 2023 e na fixação de calendários negociais para o horizonte da legislatura”.
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