A expectativa era muita e o sigilo do Governo absoluto. A proposta do Governo para um Acordo de médio prazo para a Competitividade e Rendimentos chegou aos parceiros sociais esta quarta-feira, à hora da reunião da Comissão Permanente de Concertação Social (CPCS) agendada pelo Executivo. Ao fim de mais de três horas de reunião, confederações patronais e sindicatos falam numa proposta “insuficiente”, “desfasada da realidade” económica atual e “pouco concreta na quantificação das medidas”. Governo inicia esta quinta-feira reuniões bilaterais com os parceiros sociais para debater a proposta. Ana Mendes Godinho, ministra do Trabalho, assume “fase negocial muito intensa” até à apresentação da proposta de Orçamento do Estado 2023 (OE2023), a 10 de outubro.
A questão foi colocada pelos jornalistas mais do que uma vez. Mas à saída da reunião de concertação social desta quarta-feira, onde o Governo apresentou os detalhes da sua proposta de acordo de rendimentos, Ana Mendes Godinho não conseguiu responder à questão sobre se o acordo será fechado antes do OE2023. E basta ouvir os parceiros sociais para perceber porquê.
À saída da reunião, tanto patrões como sindicatos, foram apontando lacunas à proposta. Embora admitam que um acordo a tempo do OE ainda é possível, sinalizam que o documento é apenas uma base de trabalho sobre a qual ainda há muito a ser feito. João Vieira Lopes, presidente da Confederação de Comércio e Serviços de Portugal (CCP), fala num documento “desfasado da realidade” que “não é uma base aceitável para um acordo”.
Entre as principais falhas, o líder da CCP aponta a ausência de um “ajustamento à evolução da economia, em particular ao PIB”, mas também a incapacidade das medidas anunciadas serem relevantes para aliviar a pressão sobre as empresas. Além disso, sinaliza a falta de concretização da proposta no que respeita à quantificação destas medidas.
Redução do IRC: ok, mas como?
António Saraiva, presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), levanta a mesma questão, nomeadamente no que respeita à redução do IRC prevista para as empresas que aumentem os salários e que, diz, “é preciso clarificar como será feira”. O líder dos patrões da indústria admite que a margem de tempo é curta para firmar um acordo, mas não fecha portas ao diálogo.
Já a Confederação de Agricultores de Portugal (CAP) considera que as propostas dos parceiros foram ignoradas. Luís Mira, secretário-geral da confederação, vai mais longe, e refere que não encontra na proposta apresentada pelo Executivo “nenhuma medida que leve a que a competitividade das empresas agrícolas vá melhorar”. Mais, acusa o Estado de lucrar, em receita fiscal, com as medidas propostas: “há aumento do salário mínimo nacional, mas não vejo nenhum esforço objetivo do Estado em compensar na parte das receitas. Aumenta-se o salário mínimo, o salário médio, mas quem ganha com isto tudo, acaba por ser o Estado com uma maior receita de impostos”.
A questão da quantificação das medidas propostas foi também sinalizada por Francisco Calheiros, presidente da Confederação do Turismo de Portugal (CTP), à saída da reunião. O documento, apontou, resume-se a uma série de “linhas gerais e há muito trabalho a fazer”. E deu como exemplo as medidas direcionadas aos jovens, no sector do turismo, que precisam de melhor concretização.
Do lado dos sindicatos, a CGTP lamenta que o acordo não mexa em questões que são essenciais e em “matérias que precisam de ser alteradas”. A líder da central sindical, Isabel Camarinha, saiu da reunião a lamentar que a proposta seja omissa e “muito insuficiente” em matérias críticas para os trabalhadores. “Precisamos de responder agora à situação urgente que os trabalhadores vivem", defendeu, relembrando que há trabalhadores no país que "não conseguem chegar ao fim do mês com salários que todos admitem que são baixos”.
A UGT coloca a tónica nas negociações bilaterais que a partir de agora se iniciam. À saída da reunião, o secretário-geral, Mário Mourão, não fechou a porta a consensos e disse esperar que seja possível consolidar um documento que acautele as preocupações de todos os parceiros e daqueles que representam.
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