Economia

Christine Lagarde: "Mudança tectónica na história europeia" aumenta a inflação e reduz o crescimento

Christine Lagarde, presidente do BCE, na sua mais recente visita a Lisboa
Christine Lagarde, presidente do BCE, na sua mais recente visita a Lisboa
NUNO FOX

"A guerra de agressão é uma mudança tectónica na história europeia", disse esta quinta-feira a presidente do Banco Central Europeu na conferência anual que reúne a nata de 'observadores' da política monetária europeia. Lagarde admitiu que as consequências a curto prazo da invasão são mais inflação e menos crescimento

A guerra na Ucrânia "é uma mudança tectónica na história europeia" e está a provocar um "choque que aumenta a inflação e reduz o crescimento", disse esta quinta-feira Christine Lagarde, a presidente do Banco Central Europeu (BCE), na conferência que o banco organiza anualmente reunindo a nata académica e de analistas financeiros 'observadores' da política monetária europeia.

Por isso, recordou que o BCE, na última reunião a 10 de março, avançou com três cenários para a zona euro, onde a evolução da inflação para 2022 varia num intervalo entre 5,1% (no cenário principal que fundamentou as decisões de política monetária tomadas) e 7,1% (no cenário mais pessimista) e as previsões de abrandamento do crescimento este ano deslizam de 3,7% (no cenário principal) para 2,3% (no cenário mais pessimista), um ritmo abaixo de metade do crescimento de 2021 (5,3%).

Classificando a invasão russa como "um horroroso ato de agressão", Lagarde sublinhou que o BCE, na sua reunião de 10 de março, introduziu um maior grau de liberdade na calibração do aperto da política monetária face às consequências, ainda imprevisíveis, do desenrolar do conflito na Ucrânia e das suas implicações económicas (em primeira linha, mais inflação e abrandamento no crescimento) e geopolíticas (em relação à segurança da União Europeia e da NATO em solo europeu).

Cinco palavras mágicas

A presidente do BCE elencou esta quinta-feira uma série de palavras mágicas que guiam a política monetária do banco que dirige: opcionalidade (um palavrão para dizer que se mantêm em aberto todas as opções e não só uma, de aperto linear da política), condicionalidade (determinada pelos dados da conjuntura), flexibilidade (em virtude das assimetrias entre os membros do euro, nomeadamente o impacto das medidas nos periféricos mais vulneráveis ao mercado da dívida), gradualismo (nada será feito de um modo acelerado, como parece ser o timbre da Reserva Federal que este ano aponta para sete subidas da taxa diretora), e sequenciação das medidas de aperto.

Neste último aspeto, a reunião deste mês do BCE introduziu uma novidade que amplia a margem de manobra: o início do ciclo de subida das taxas diretoras não será quase imediato (pouco depois) à descontinuação de todo o tipo de compras de novos ativos. Acontecerá "algum tempo depois". A extensão do "algum" introduz a flexibilidade necessária, acentuou Lagarde.

Guerra gerou mais inflação

O surto inflacionário que já se vinha a verificar desde o verão passado "deverá ser amplificado provavelmente pelos fatores de curto prazo que estão a pressionar a inflação", disse a francesa. "A guerra colocou em movimento novas tendências inflacionárias", visíveis, exemplificou, no disparo de preços na energia, nas matérias-primas agrícolas, e em alguns metais e componentes mais relacionados com as exportações da Rússia e da Ucrânia e com o efeito de pânico nos mercados das commodities.

Recorde-se que o BCE já decidiu descontinuar até ao final de março o programa especial PEPP (lançado em resposta à pandemia em 2020) no que diz respeito à aquisição de novos títulos e avançou na reunião deste mês com a perspetiva de descontinuar durante o terceiro trimestre novas compras através do programa mais antigo de aquisições lançado por Mario Draghi (e designado por APP). Mas, esta última descontinuação é "condicional". Ou seja, depende da evolução da conjuntura da inflação e dos impactos negativos da guerra- "Tomaremos as medidas necessárias se as consequências económicas da guerra escalarem ou paralisarem a recuperação", avisou Lagarde.

Batizada de "The ECB and Its Watchers", esta conferência realiza-se desder 1999 e este ano debate no luxuoso hotel Steingenberger em Frankfurt três temas quentes: "Da pandemia aos novos desafios" (painel onde intervém Ricardo Reis, professor da London School of Economics e colunista do Expresso); "A política monetária e a mudança climática"; e "As interações entre a política orçamental e a monetária".

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