Economia

Vasconcellos diz desconhecer atuais acionistas de offshore para a qual a sua família transmitiu património

Vasconcellos diz desconhecer atuais acionistas de offshore para a qual a sua família transmitiu património
António Pedro Ferreira

"Eu nunca fui acionista da Affera", assegurou Nuno Vasconcellos na CPI do Novo Banco. Trata-se de uma sociedade do Panamá que ficou com a empresa do Luxemburgo que cuidava dos negócios da sua família. E que subscreveu um aumento de capital numa empresa brasileira ligada ao ex-líder da Ongoing

Vasconcellos diz desconhecer atuais acionistas de offshore para a qual a sua família transmitiu património

Miguel Prado

Editor de Economia

Vasconcellos diz desconhecer atuais acionistas de offshore para a qual a sua família transmitiu património

Diogo Cavaleiro

Jornalista

Vasconcellos diz desconhecer atuais acionistas de offshore para a qual a sua família transmitiu património

Anabela Campos

Jornalista

"Eu nunca fui acionista da Affera. Eu, Nuno Vasconcellos, não pertenço ou pertenci nem fui administrador da Affera", declarou o empresário em audição na comissão parlamentar de inquérito sobre o Novo Banco, quando questionado pela deputada Mariana Mortágua sobre a sua relação com aquela empresa do Panamá.

Segundo a deputada, a Affera SA, empresa criada em dezembro de 2014 no Panamá, subscreveu um aumento de capital da empresa brasileira HIS Tecnologia e Sistemas, que acabou por diluir a participação do grupo Ongoing e assim escapar ao controlo dos credores da Ongoing, nomeadamente o Novo Banco, ao qual o grupo de Nuno Vasconcellos ficou a dever 520 milhões de euros.

Mariana Mortágua instou Vasconcellos a esclarecer quem eram os acionistas da Affera SA. O empresário não deu quaisquer nomes, indicando apenas que o envolvimento daquela sociedade do Panamá no aumento de capital da HIS serviu para viabilizar economicamente esta sociedade brasileira, tendo para tal contado alguns empresários brasileiros, incluindo o padrinho do seu filho.

Mortágua perguntou pelos acionistas da Affera. "Não sei dizer ao certo, mas houve um conjunto de empresários brasileiros muito ricos que em 2016 fizeram um aumento de capital. Houve um fundo que emprestou dinheiro, com juros altíssimos. Um deles é padrinho do meu filho", começou por responder Nuno Vasconcellos.

"Não sei quem são os acionistas, mas na altura eram os brasileiros que emprestaram dinheiro", acrescentou.

Mariana Mortágua perguntou-lhe então por um conjunto de nomes, entre os quais o seu, que aparecem como administradores da brasileira HIS. São os casos de Rafael Mora, Nuno Dias, Gilberto Martins e Guilherme Dray. Este último, advogado que tem trabalhado com o Governo português em vários dossiês, nomeadamente o que envolve o Ministério das Infraestruturas e a TAP.

"Fui administrador de mais de 100 empresas"

Nuno Vasconcellos insistiu que nunca foi acionista da Affera. "Nem administrador?", questionou Mariana Mortágua. "Também não... Tenho de ver, mas duvido. Fui administrador de mais de 100 empresas", respondeu, para depois afirmar que não. "Eu não tenho a lista completa dos acionistas da Affera. Como não sou bruxo, não posso dizer. Na altura um deles era, e é, o padrinho do meu filho mais novo. Mas eu, Nuno Vasconcellos, não pertenço nem pertenci nem fui administrador da Affera. De 2016 até hoje sei lá o que se passou na empresa"

Ora, como o Expresso escreveu em novembro de 2017, a Affera SA adquiriu em 2016, já com a Ongoing insolvente, o controlo de uma empresa que a família Rocha dos Santos (dona da Ongoing) tinha no Luxemburgo, a Opportunity Two.

A 9 de maio de 2016 a Rocha dos Santos Holding SGPS cedeu à sociedade panamiana Affera SA a participação que tinha na luxemburguesa Opportunity Two. Pouco depois, a mesma empresa do Panamá absorveu a Golden Edge Luxembourg, que até janeiro de 2016 pertencia à Opportunity Two e que daí até julho ficou nas mãos de três pessoas: James Risso-Gill (marido de Isabel Rocha dos Santos), Diana Risso-Gill (sua filha) e Diana Vasconcellos (neta de Isabel Rocha dos Santos e filha mais velha de Nuno Vasconcellos).

A Opportunity Two, criada em 2008, reportava em 2014 ativos superiores a 15 milhões de euros, incluindo uma receita futura de €10 milhões. Esse montante não estava explicado nas contas do Luxemburgo, mas estaria ligado a uma participação na empresa tecnológica Webspectator. Em 2014 a Opportunity Two, além da Golden Edge, detinha também a portuguesa Opportunity Solutions SGPS, criada em 2009 e extinta em novembro de 2016.

"Diz-me pouco, mas o nome não me é estranho"

Questionado por Mariana Mortágua sobre a Opportunity Two, Nuno Vasconcellos admitiu que "essa empresa pertenceu ao "family office" da família". "Hoje não sei", referiu. "Acho que durante um período curto de tempo fui gerente dessa empresa", acrescentou.

Sobre a Golden Edge, pouco disse. "Diz-me pouco, mas o nome não me é estranho", comentou. Mariana Mortágua lembrou que detinha um ativo em Delaware, nos Estados Unidos, a Webspectator. Cerca de 25% do capital desta empresa é detida pelo Banco Comercial Português, banco com que o empresário trabalhava.

Nuno Vasconcellos indicou então que esta empresa tecnológica, envolvida num litígio, nada tinha a ver com o Novo Banco. "Foi uma empresa que eu ajudei a criar nos EUA, fui eu que tive a ideia para o software. Tinha uma equipa nos EUA, que roubou a empresa e teve processo nos EUA e um processo-crime no Brasil", referiu.

Questionado sobre se tem ligação a outras empresas em jurisdições offshore, Nuno Vasconcellos respondeu negativamente. "Eu não conheço nenhuma e se conhecesse também estavam fora do âmbito desta comissão", referiu.

Mariana Mortágua foi a única deputada a inquirir Vasconcellos, porque no final da sua ronda de perguntas o presidente da comissão de inquérito, Fernando Negrão, deu por encerrada a audição, por entender que o antigo presidente da Ongoing não estava a cooperar com os trabalhos dos deputados nem a responder de forma clara às questões que lhe foram sendo colocadas.

Segundo o registo comercial do Luxemburgo, a Opportunity Two está em liquidação desde fevereiro deste ano. É uma empresa adormecida: as últimas contas que publicou foram relativas ao ano 2014. Na mesma situação está a Golden Edge.

A Ongoing tem créditos de 520 milhões por saldar perante o Novo Banco - Vasconcellos, que foi seu dirigente, diz que não é responsável por elas.

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