Economia

O “paraíso à nossa porta” quer mais pessoas

A ponta de Sagres é um dos limites geográficos de um território à procura de maior coesão e diversidade económica
A ponta de Sagres é um dos limites geográficos de um território à procura de maior coesão e diversidade económica
Rui Ochôa

Projetos Expresso. A sazonalidade do trabalho, a falta de ligações aéreas e entraves à diversificação económica da região foram o prato forte do VII Encontro Fora da Caixa

O “paraíso à nossa porta” quer mais pessoas

Tiago Oliveira

Jornalista

Vá para fora cá dentro.” O slogan foi utilizado pelo Turismo de Portugal pela primeira vez em 1995 e é desde então sinónimo de descobrir o país e viajar dentro de fronteiras. Não que o Algarve precisasse de grande ajuda neste campo, ou não fosse desde há muitos anos o mais conhecido destino turístico nacional, famoso pelas praias e paisagens naturais. E os visitantes continuam a aparecer, com os dados mais recentes a revelarem que mais de 4 milhões de pessoas já passaram pela região até setembro deste ano, o que representa uma subida de 8% face ao mesmo período do ano passado. Mas os números só contam uma parte da história, e se este “paraíso à nossa porta”, como lhe chama o presidente da Enolagest/Garvetur, Reinaldo Teixeira, parece mais popular do que nunca, os empresários algarvios acreditam que o território continua a ser prejudicado pela sua falta de acessibilidades. Com impacto na fixação e atração de mais profissionais qualificados, que permitam dar o salto.

À primeira vista a questão pode parecer um contrassenso, numa região que há dois anos consecutivos é a que cresce mais, de acordo com o INE, com uma economia que representa 4,7% do PIB nacional. Numa área onde vivem mais de 400 mil pessoas existe a perceção de que o número podia “passar para os 600 mil” através de medidas que tornem o território mais atrativo, economicamente diverso e que seja mais do que a imagem estereotipada do destino turístico entupido no verão. O que não significa que vá deixar de ser a atividade mais importante. “Temos de ter isso bem presente. As outras atividades serão sempre complementares”, aponta Reinaldo Teixeira, com a certeza de que serão uma componente fulcral para dar outro dinamismo e variedade à vida financeira do Algarve.

Para os empresários que marcaram presença no VII Encontro Fora da Caixa — a segunda edição do ciclo de conferências organizado pela CGD que tem percorrido o país nos últimos dois anos com o apoio do Expresso — um bom ponto de partida (ou mau, segundo as perspetivas) encontra-se no aeroporto de Faro. “As ligações aéreas são deficitárias, é mais fácil ir a outros lados na Europa do que dentro do país”, garante o presidente do conselho médico do Grupo Hospitalar Particular do Algarve, Paulo Sousa que confessa ter a sensação de, “por vezes, estar numa ilha”. É um grande desafio “conjugar resultados, atração de profissionais e inovação” numa “região periférica onde é complicado atrair pessoas”, recorda, enquanto pede “medidas de proteção do emprego” como uma das formas de contornar a situação.

Habitabilidade
As acessibilidades, lembra António Raiado, não contribuem para o panorama, e o empresário é lesto a defender que faz falta mais investimento como forma de tornar o território mais coeso. Viajar ao longo do Algarve por estrada ainda é, em certos trechos, um desafio e são precisas também mais infraestruturas, atira o sócio-gerente da António Raiado, para quem a “cobertura de telecomunicações” merece reparos por só parecer funcionar bem nas alturas de maior movimento turístico, enquanto o acesso à água também deve ser alvo de atenção. A escassez “já se começa a sentir.”

A sazonalidade é uma questão que também merece um lugar entre os grandes desafios que o Algarve enfrenta, e os responsáveis não escondem a influência deste fator nos seus negócios. “Temos 230% de crescimento entre o mês de menos vendas e o de mais vendas”, revela António Raiado, referindo-se ao ramo do armazenamento de tabaco onde se insere. E esta disparidade estende-se a muitas outras áreas com Francisco Cary, administrador executivo da CGD, a conceder que “viver no Algarve é muito caro”, mau grado a “vantagem natural competitiva” que a região oferece.

Na área onda a taxa de sazonalidade ascendeu aos 43,1% em 2018, a maior do país, são necessárias medidas que promovam a fixação de pessoas e que, com a colaboração entre entidades públicas e privadas, permitam acompanhar o nível de vida da região. Para isso é necessário que “as empresas tenham mais liberdade para criar riqueza”, defende o sócio-gerente da Sopromar Centro Náutico, Hugo Henriques. O “Estado tem de simplificar” para que se façam os investimentos necessários e se criem mais condições para o desenvolvimento multissectorial. “No fundo é para o que aqui estamos”, acrescenta.

Seja no desenvolvimento da produção agrícola além das culturas habituais do Algarve (como a recente aposta na pera-abacate mostra) ou na exploração da “componente entretenimento”. Trata-se, segundo o economista José Félix Ribeiro, da possibilidade — mais forte com o advento do ‘Brexit’ — de “atrair competências na área das artes e tecnologias que hoje se cruzam com a criação artística” e que podem passar pelos videojogos, por exemplo. São várias as opções que podem garantir ao Algarve mais alternativas de futuro no aproveitamento das suas condições naturais, se a região souber jogar bem as suas cartas. Sobretudo quando estamos perante “uma região extraordinária no contexto do país. Onde é bom estar e viver”.

“Se a economia continuar a crescer 1,7%, ninguém vai derrubar o Governo”

Marques Mendes aproveitou o VII Encontro Fora da Caixa para retratar a atualidade política e económica
Filipe Farinha

Em três palavras se descreve a narrativa dos próximos quatro anos, de acordo com a visão do ex-ministro Marques Mendes. “Estabilidade, continuidade e dificuldade” são as apostas do comentador político da SIC, que considera que a atual maioria relativa do executivo liderado por António Costa irá aguentar sem os acordos da anterior legislatura. É o resultado de fatores como a composição do Parlamento e as mais recentes previsões económicas, que apontam para um crescimento acima da média europeia nos próximos anos. “Se a economia continuar a crescer 1,7%, ninguém vai derrubar o Governo”, garante com “convicção.” Sem esquecer que “no plano social a vida vai ser muito mais difícil”, porque as “pessoas querem ter uma parte maior do crescimento”. O que poderá não acontecer quando “a carga fiscal continuar a ser muito elevada” e houver uma “continuidade de políticas” das contas certas. Estamos, ainda assim, mais preparados para o futuro, acredita o economista José Félix Ribeiro, que não tem pejo em falar de um “novo Portugal”, marcado pelas sinergias internacionais entre engenheiros e que trouxeram ganhos nos campos da mecânica e aeronáutica, por exemplo. “Não somos um país atrasado. Somos um país muito moderno, não temos é noção disso.”

As melhores frases

“Durante anos tivemos os partidos da cigarra e da formiga. Esta lógica mudou muito. As contas certas vão continuar”
Marques Mendes
Comentador político

“Temos que fixar mais pessoas e desenvolver condições de habitabilidade”
Reinaldo Teixeira
Presidente da Enolagest/Garvetur

“As economias têm que se reinventar periodicamente, porque o mundo muda muito e isso está a acontecer em Portugal”
José Félix Ribeiro
Economista

“A liderança é vital em todos os níveis da organização. É importante desenvolver uma cultura de inovação”
Paulo Macedo
Presidente da Comissão Executiva da CGD

Textos originalmente publicados no Expresso de 30 de novembro de 2019

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