Economia

Bancos querem cobrar por depósitos de grandes clientes e multinacionais. Particulares escapam

Miguel Maya, presidente executivo do BCP
Miguel Maya, presidente executivo do BCP

O BCP lançou a ideia, a CGD e o Novo Banco alinham: é necessário cobrar pelos depósitos de grandes empresas e clientes institucionais estrangeiros. O assunto dos juros negativos tem sido alvo de reuniões entre a associação do sector e o Banco de Portugal

A ideia foi lançada para cima da mesa pelo Banco Comercial Português, mas Caixa Geral de Depósitos e Novo Banco concordam: é preciso cobrar aos grandes clientes pelos depósitos de grande dimensão. Não é um tema novo, tem conquistado relevância devido aos juros negativos e há reuniões entre o sector e o regulador.

O BCP defendeu esta terça-feira, 22 de outubro, que os bancos devem poder cobrar por depósitos de clientes institucionais, desde logo porque devido à proibição de taxas em Portugal há estrangeiros a mudarem o dinheiro para o país, numa ideia acompanhada por CGD e Novo Banco.

O tema foi hoje lançado pelo presidente do BCP, Miguel Maya, na conferência Banca do Futuro, organizada pelo Jornal de Negócios em Lisboa, que considerou que "não passa pela cabeça do Millennium BCP cobrar pelos depósitos de [clientes] particulares e pequenas empresas", mas que não faz sentido ter "centenas de milhões" de euros depositados no banco por grandes clientes institucionais estrangeiros, com quem o banco não tem qualquer outra relação comercial.

Diferença dentro da Europa

Isso acontece, disse, porque nos seus países de origem essas entidades têm de pagar para pôr o dinheiro nos bancos e então transferem o dinheiro para bancos portugueses, onde a legislação nacional não permite cobrarem por depósitos de clientes.

Para Maya, isto é mais um exemplo de como os bancos portugueses não competem com as mesmas regras dos seus pares europeus.

Também o presidente da Caixa Geral de Depósitos (CGD), Paulo Macedo, considerou que face à circulação do dinheiro na Europa "deveria haver legislação idêntica". Pelo Novo Banco, António Ramalho, defendeu um "sistema idêntico ao nível de toda a Europa".

Reuniões sobre juros negativos

À margem da conferência, em declarações aos jornalistas, o presidente do BCP disse que tem falado deste tema com reguladores, mas recusou dar informações sobre a receção dos seus interlocutores.

Em Portugal não são permitidas taxas de juro negativas nos depósitos (ou seja, os bancos não podem cobrar para guardarem o dinheiro dos depositantes), ao contrário de outros países europeus.

Em julho, em audição no parlamento, o secretário-geral da Associação Portuguesa de Bancos (APB), Norberto Rosa, já tinha dito que se tem assistido a um movimento de grandes empresas multinacionais ou investidores estrangeiros a "virem fazer depósitos nos bancos nacionais" devido a haver países em que os bancos praticam taxas de juro negativas, o que leva a um excesso de liquidez que os bancos têm de aplicar.

Como o Expresso já escreveu, têm existido reuniões entre a APB e o Banco de Portugal devido ao assunto nomeadamente porque há bancos a aplicar comissões pela existência de grandes quantidades de depósitos (uma forma de contornarem a impossibilidade de aplicação de juros negativos).

Juros nos depósitos em mínimos

Em setembro, o Banco Central Europeu (BCE) desceu a taxa dos depósitos bancários de -0,40% para -0,50%, reforçando o valor que os bancos pagam para aí aplicar o seu excesso de liquidez (dinheiro que não emprestam), mas introduziu um sistema de dois escalões que possibilita que uma parte do excesso de liquidez do setor não pague este custo, o que deverá poupar milhões de euros aos bancos portugueses.

A taxa de juro média dos novos depósitos constituídos em agosto fixou-se em 0,10%, um novo mínimo histórico, segundo dados hoje do Banco de Portugal. No mesmo mês, a taxa de juro média dos depósitos da zona euro ficou, pela primeira vez, em valores negativos.

Fundo de Resolução também tem de mudar

O presidente do BCP voltou também hoje a defender que o Fundo de Resolução nacional (entidade que suporta intervenções em bancos, caso de Novo Banco e Banif) tem de ser pago por todos os bancos que fazem transações financeiras com clientes portugueses, considerando esta mais uma grande desvantagem competitiva para os bancos portugueses.

Já em maio Miguel Maya tinha falado neste tema à margem de uma conferência sobre banca no polo da Universidade Nova, em Cascais, considerando que devem pagar esses custos "todas as entidades que de alguma forma trabalham com clientes sediados em Portugal suportem a contribuição para este Fundo de Resolução e não apenas as que têm sede em Portugal".

"Porque é que uma sucursal não há de suportar? O BCP devia mudar a sede para deixar de pagar o Fundo de Resolução", questionou.

O BCP tem sido muito crítico para com os custos do Fundo de Resolução português, que são elevados sobretudo com BES/Novo Banco, e tem defendido por várias vezes uma solução mais equilibrada. Em 2017, o BCP pôs mesmo uma ação na justiça para clarificar a questão legal das garantias prestadas pelo Fundo de Resolução à Lone Star, que atualmente é dona de 75% do Novo Banco.

Também neste tema, o banco partilha preocupações com o resto do sector – a banca quer o novo Governo a revisitar o dossiê.

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