Economia

Associação de arte de Berardo tem imóveis avaliados em mais de um milhão de euros

Associação de arte de Berardo tem imóveis avaliados em mais de um milhão de euros
ANTÓNIO COTRIM/Lusa

Berardo está a braços com uma ação de execução por parte da CGD, BCP e Novo Banco por dívidas de quase mil milhões de euros, mas declara ter apenas uma garagem no Funchal como património. Quer agora abrir mais dois museus, um de azulejos, outro de arte africana

A Associação de Coleções, criada em 2005 no universo do empresário Jo Berardo para se dedicar à arte, tem imóveis que valem mais de um milhão de euros, mostram as contas da revista Sábado no artigo "Jo Berardo escondeu vários imóveis que valem milhões numa associação de arte até hoje desconhecida".

Quinta dos Loridos (Bombarral/ 200 mil euros), Palácio da Tocha (Estremoz / 300 mil euros), três prédios rústicos (Porto Santo / 71.500 euros), apartamento nas Amoreiras (Lisboa/350 mil euros) e Fábrica Antiga (Estremoz/ 400 mil euros), são os imóveis elencados pela revista relativamente à Associação de Coleções. Com base no valor de permuta deste património imobiliário estão em causa 1,3 milhões de euros, mas a verdade é que cada um destes edifícios valerá bem mais do que isso, uma vez que só os Loridos, uma quinta do século XV comprada pela Bacalhoa Vinhos de Portugal em 1980, mas transferida depois para uma imobiliária madeirense e repassada para a Associação de Coleções em 2008, representa na verdade "vários milhões dada a sua dimensão e qualidade", diz a Sábado.

Os estatutos da Associação, definem que o seu objetivo é a "promoção, divulgação e fomento de coleções constituídas por acervos de arte ou outros objetos de relevo, trazidos ao património da associação por ato ou atos dos seus associados, bem como o fomento e promoção da educação". Mas uma alteração estatutária introduzida em 2018 passou a permitir também, a esta entidade, "acessoriamente explorar os seus imoveis que não estejam totalmente afetos à prossecução do seu fim, nomeadamente arrendado-os, de forma a otimizar a gestão dos seus recursos", refere a revista.

Aliás, a par de Berardo e do filho Renato, só a imobiliária Magnólia Madeira, presidida por Berardo, tem direito de voto na Assembleia Geral da Associação de Coleções. E esta imobiliária, "nos últimos quatro anos (segundo o Informa D&B) não teve qualquer venda, registando sempre resultados negativos na ordem dos 250 mil euros", refere a Sábado, adiantando que a entrada da empresa na Associação remonta a 2008, ano em que a Magnólia deu à Associação de Coleções seis imóveis numa operação de permuta. Foi precisamente em troca destes imóveis, a que se veio a junta a Fábrica Antiga de Estremoz, comprada já em 2018, por 400 mil euros. que "a imobiliária Magnólia da Madeira ficou com 3.686 títulos de participação da Associação de Coleções, num valor de 921.500 euros (o mesmo valor atribuído aos imóveis)", acrescenta.

A revista Sábado adianta, também, que o tribunal já decretou, a 7 de junho, um procedimento cautelar de arresto do T5 na Av. Infante Santo onde Berardo fica quando está em Lisboa. “Segundo o registo predial, é a CGD a proponente numa ação de 50.168.987,37 euros” e o imóvel “ envolvido numa polémica” com os vizinhos desde 2007, uma vez que Berardo terá fechado as varandas e o terraço sem autorização do condomínio, mudou de mão em 2008, quando foi vendido à Atram, “uma imobiliária sem empregados, sem vendas, e com resultados negativos anuais (na ordem dos 50 mil euros) desde pelo menos 2014, segundo o Informa D&B)” que tem Berardo como presidente do Conselho de Administração. A Sábado refere, no entanto, que o representante oficial do empresário e da sua fundação diz desconhecer o arresto deste apartamento.

Dois museus e muita arte

A braços com uma ação de execução por parte da CGD, BCP e Novo Banco por dívidas de quase mil milhões de euros, mas declarando oficialmente que tem apenas uma garagem no Funchal como património, o empresário continua a ter projetos em carteira, como a criação de dois novos museus em Estremoz, dedicados aos azulejos e à arte africana.

O processo relativo à declaração de “Monumento de Interesse Municipal” do edifício das Antigas Fábricas de Moagem e Eletricidade de Estremoz e Veiro “ainda não chegou à Assembleia Municipal, por isso ainda não foi tomada qualquer decisão”, diz ao Expresso o presidente deste órgão autárquico, Nuno Rato.

Sem avançar qualquer previsão sobre a data de discussão do dossier, Nuno Rato admite que a classificação do edifício ainda não tenha chegado à Assembleia Municipal “por razões processuais”. Em causa está a classificação do imóvel como Monumento de Interesse Municipal, discutida na reunião de Câmara de 6 de fevereiro de 2019.

Na edição de hoje, a revista Sábado informa que a mensagem passada nessa reunião foi a de que “o comendador Berardo vai comprar o edifício com a intenção de criar um Museu de Arte Africana”. Citando um dos presentes, a revista explica que Berardo “manifestou vontade da Câmara declarar de interesse municipal este edifício” para efeitos de candidatura a fundos comunitários no valor de 3,8 milhões de euros e adianta que este processo devia ter ficado concluído na reunião de Assembleia Municipal de 26 de junho.

O protocolo celebrado entre Berardo e a autarquia para a criação do museu, a 17 de abril, ficará sem efeito se não for aprovado o projeto de candidatura aos fundos comunitários em que o empresário diz ter 13.600 obras e objetos de arte para Estremoz, de acordo com o processo que a revista consultou na Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Alentejo. Os termos do acordo prevêm que a autarquia pague aos funcionários e assuma os custos de manutenção, recebendo, em troca, a emissão e venda de bilhetes.

Logo um dia depois da assinatura deste protocolo, Berardo escriturou em Lisboa a compra do imóvel à Amplimóveis, presidida pelo antigo ministro da Saúde Arlindo de Carvalho, que foi condenado a 6 anos de prisão por burla qualificada, abuso de confiança e fraude fiscal no âmbito de um dos processos do caso BPN.

Jo Berardo, diz a Sábado, “pagou 400 mil euros através de dois cheques sacados sobre o BIC (que sucedeu ao BPN)”, atuando através da Associação de Coleções.

E, em Estremoz, o empresário prepara, também, a abertura de um museu para a sua coleção de azulejaria, no Palácio Henriques, em outubro, mais uma vez através da Associação Coleções.

O presidente da autarquia, o independente Francisco Ameixa Ramos, não esteve esta manhã disponível para falar ao Expresso por “estar numa reunião”, disse fonte do seu gabinete, mas ao Jornal Público, em 17 de junho, o autarca admitiu que os riscos resultantes da instalação dos dois museus “não são evitáveis”, garantindo, no entanto, que os direitos e obrigações das partes estão “claramente definidos” e “salvaguardam os interesses da autarquia”.

Batalha judicial para durar

Quanto à ação de execução da CGD, BCP e Novo Banco contra Berardo, estão em causa financiamentos que remontam a 2007 para a compra de ações do BCP e que o empresários madeirense não pagou. Como o Expresso noticiou na sua última edição, o empresário já foi notificado, mas a “a batalha jurídica ainda agora vai começar”. Aliás, dois meses depois da ação ter dado entrada em tribunal, .0 nem todos os devedores foram citados, numa lista que inclui Jo Berardo, a Metalgest, a Fundação Berardo e a Moagens Associadas. Mas neste processo espera-se também a contestação dos visados, a que se deverá seguir a apresentação de novos argumentos dos bancos, já depois do verão.

Em causa está uma dívida de 926.162.180,21 euros (um montante muito próximo do valor atribuído na permuta dos imóveis da Associação de Coleções) que o ainda comendador deixou depois de ter reforçado garantias em 2009, atráves de um acordo que permitia o penhor de 75% dos títulos de participação da Associação Coleção Berardo em 2009. A CGD e o BCP têm 80% da dívida em causa e o Novo Banco 20%.

Neste processo, a banca quer provar que o empresário montou um esquema para fugir às garantias e que é o último beneficiário das empresas que estão na sua esfera. Já Berardo aposta em garantir que não tem dívidas pessoais.

A verdade é que “os contribuintes já tiveram de gastar dinheiro para cobrir as perdas provocadas pelo incumprimento de José Berardo nas suas dívidas ao Novo Banco”, sendo certo que as perdas com empréstimos aos empresários pesaram nos 1.149 milhões pedidos ao Fundo de Resolução e tiveram impacto no défice.

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