Terror fantástico francês e policial japonês marcaram o terceiro dia da 43ª edição do Fantasporto
A tradição dos livros malditos, contendo segredos capazes de trazer de volta os mortos ou abrir passagens entre este mundo e o outro, está em quase todas as culturas. Basta pensar no Livro de São Cipriano presente nas mitologias luso-brasileiras ou no Necromicon imaginado por H.P. Lovecraft, um e outro recorrentemente referenciados no cinema fantástico. Em França, há algo de semelhante e é assim que começa “The Thing Behind the Door” (A Coisa atrás da Porta) quando, em pleno século XIV, no leste do país, um ritual envolvendo uma mulher grávida, um frade e um livro mágico acaba de forma trágica.
Trata-se do primeiro filme do realizador francês Fabrice Blin passado domingo neste terceiro dia da 43ª edição do Fantasporto. Se o filme belga de que vos tinha falado na véspera (“Megalomaniac” de Karim Ouelhaj) remetia, ainda que indirectamente, para o imaginário ligado à I Guerra Mundial (a lenda dos anjos de Mons), a fita francesa tem como cenário a Grande Guerra. É, no dizer do realizador, “uma história de amor negra” que se poderia resumir assim: era uma vez uma rapariga que perde o marido nas trincheiras e vai recorrer a um livro perdido desde o século XIV para o fazer regressar. Escusado será dizer que o ser que regressa parece o marido perdido mas não o é exactamente…
É também uma história sobre o poder da natureza e os mitos ancestrais ligados à fertilidade. Mas também uma narração que ancora profundamente no imaginário francês e na matança de uma geração inteira em batalhas inúteis como a de Verdun. Quase no final, dois soldados estropiados passam em casa da rapariga (entretanto a viver uma estranha gravidez) e contam-lhe as suas desgraças, quando um grupo de alemães os metralhou, apesar de lhes terem tentado explicar que o armistício tinha sido assinado e a guerra acabado. “Eu safei-me, só perdi um olho mas este que está comigo perdeu o juízo que também não era muito…” O toque do ilustrador Jean Marc Toussaint (autor do cartaz do Fantasporto em 1997) sente-se na estética quase de banda desenhado do filme.
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