
Após um fabuloso ano de 2021 em que meio mundo lhe reconheceu o talento, Hamaguchi colhe os frutos e intromete-se — quem diria? — na candidatura aos Óscares com “Drive My Car”
Após um fabuloso ano de 2021 em que meio mundo lhe reconheceu o talento, Hamaguchi colhe os frutos e intromete-se — quem diria? — na candidatura aos Óscares com “Drive My Car”
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Os dois contos de Murakami em que vagamente se inspira “Drive My Car”, dois dos sete (um deles homónimo, o outro é ‘Scheherazade’) que integram o livro “Homens sem Mulheres” (Casa das Letras), não são mais do que um rastilho que o novo filme de Hamaguchi amplia e propaga a três horas de cinema que, desde logo, aprofundam uma relação rara entre o cinema e a literatura. Costuma ser ao contrário, e em 99% dos casos é isso que se passa: o cinema a cercar o texto, a editá-lo e a condensá-lo em proveito da sua própria narrativa. Acontece que o cineasta nipónico de 44 anos, ex-aluno de Kiyoshi Kurosawa e na berlinda dos festivais de cinema desde a sua estreia, em 2008, é também ele detentor — já aqui o frisámos por mais do que uma vez — de uma pluma de qualidade invejável. Houvesse dúvidas disso para quem só há pouco tomou contacto com a obra de Hamaguchi bastaria “Roda da Fortuna e da Fantasia” (Grande Prémio do Júri em Berlim 2021), há pouco estreado entre nós, para dissipá-las. “Drive My Car”, esse filme com título de canção dos Beatles, saiu, aliás, do Festival de Cannes do ano passado com o argumento premiado (por isso foi 2021 um ano fabuloso para o cineasta — duas longas-metragens estreadas e premiadas em dois grandes festivais de cinema, coisa rara) e parte de um texto que Hamaguchi foi estendendo a seu bel-prazer a partir do que leu de Murakami, acrescentando um, dois, muitos pontos — muitos ecos, dir-se-ia — aos contos originais. As personagens de Hamaguchi dependem, e muito acentuadamente, do que está no papel, das histórias que o autor inventa, não são figuras dadas a qualquer improviso ou outro tipo de estratagema não calculado minuciosamente. É este o método de trabalho do nipónico.
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