Os livros que estão para chegar: lugar às mulheres e muitas outras versões da História
O Grupo Bertrand Círculo deu a conhecer os livros que pretende lançar nos próximos meses. A aposta parece passar pelas mulheres, não só como autoras, mas também pelos temas que trata e as visões que os livros procuram
Margaret Atwood, Nelida Piñon, Simone de Beauvoir, Jung Chang são algumas das autoras em que as editoras que pertencem ao Grupo Bertrand Círculo publicará nos próximos meses. Nomes de peso no feminino que aparecem ao lado de outros homens que também fazem parte da história da literatura, como Horácio, Ovídeo, Roberto Bolaño, Mário Vargas Llosa, Julian Barnes, Aquilino Ribeiro ou Stephen King, e dos quais se esperam a publicação de novas traduções e títulos. Até aqui, nada de diferente, não fosse de facto haver outros lançamentos previstos que procuram reescrever a história de um modo mais equilibrado.
É o caso de Julia Navarro e do seu livro “Uma História Partilhada”. A proposta da escritora espanhola é a de contar a história de figuras que, apesar da importância que foram tendo, ficaram esquecidas nos “anais da História”, rainhas, cortesãs, escritoras, atrizes, sem deixar de lado dos homens com quem partilharam a vida, numa narrativa que partilha inspirações e histórias pessoais da autora. Mas também é o de Manuela Gonzaga, em Aqualtune - A Princsa do Kongo. Um romance histórico inspirado em “Nzinga, mítica rainha do Ndongo e da Martamba, que enfrenta de armas na mão os Conquistadores”.
De Margaret Atwood há a registar “Olho de Gato”, romance sobre a memória, que reflecte sobre o envelhecimento, a partir da história de uma mulher artista, alvo de uma retrospetiva.
Também no campo da memória, ainda que menos ficcionada, poder-se-á ler “Os Rostos que Tenho”, texto fragmentado de Nelida Piñon, dividido em 147 capítulos curtos, com prefácio de Lídia Franco, e de Simone de Beauvoir o famoso e desaparecido “Memórias de uma Menina Bem-Comportada”.
De Jung Chang, escritora chinesa, autora do famoso e clássico “Cisnes Selvagens”, será publicado a grande biografia de Mao Tsé-Tung - livro banido da China, ancorado numa longa investigação desenvolvida ao longo de mais de uma década, na qual é exposta a personalidade e comportamento do líder chinês também no domínio íntimo e familiar. Nesta área geográfica, e igualmente escrito por uma mulher, está a correspondente do jornal inglês Guardian.Tania Branigan é autora de “Memória Vermelha - Viver, Lembrar, e Esquecer a Revolução Cultural Chinesa”.
“O Sexo das Mulheres” de Anne Akrich pode revelar uma nova voz. A história que se afirma “belicosa” logo no subtítulo é a de uma escritora, ensaísta, e jornalista, nascida em 1986, e da sua “arqueologia do ódio”, título do primeiro capítulo. Acho que basta citar a primeira frase que aparece nesta edição para perceber do que trata: “NoTaiti, ainda não eram nossos conhecidos os tesouros da tecnologia moderna; torturar animais ou sermos violadas pelos nossos tios eram as nossas únicas diversões. Brincávamos com a prata da casa.” A dominação e violência masculina de que trata, num tom sarcasmo, irá aparecer, umas páginas depois, também atravessada pelo humor.
De Isabel Vallejo, “O Infinito Num Junco”, livro que conquistou os tops de vendas em Espanha, durante a pandemia, será editado uma adaptação gráfica, com desenhos e aguarelas de Tyto Alba. O livro conta a história dos livros de uma forma próxima, implicada, apaixonada.
Outra mulher, esta próxima e amiga de Anne Frank. Morreu no ano passado. Hanna Pick-Goslar, ela própria prisioneira do campo de concentração Bergen-Belsen, escreve com a ajuda de uma jornalista sobre a sua amizade com Anne Frank, que conheceu em Amesterdão, depois da família ter fugido da Alemanha nazi, em 1933.
Na secção de livros de bolso, é Virginia Woolf que se destaca com o clássico “Mrs Dalloway”.
Sérgio Godinho
Arlindo Camacho
O burlesco de Sérgio Godinho e um clássico de Peixoto
Entre os portugueses a grande novidade está no lançamento de um novo romance de Sérgio Godinho: “Vida e Morte Nas cidades Geminadas”, numa narrativa que cruza Guimarães com Compiègne, e a vida de Amália (“portuguesa, que cantava fados em ré”) e Cédric (“francês, é claro, que trabalhava na morgue). Promete, ainda mais porque a apresentação diz que o confronto entre os dois mundos é burlesco.
Cruzando a música com a literatura, há ainda a assinalar o regresso de “Antídoto”, o livro de José Luís Peixoto sobre os Moonspell. O grupo editorial republica a “A Via Sinuosa”, de Aquilino Ribeiro, o primeiro romance, já habitado por Libório Barradas, alter ego do autor, desaparecido há 60 anos.
E no amor, há Julian Barnes, e um livro antigo “Amor & Etc”, continuação de “Amor & Companhia”, ou ainda outro muito mais antigo, “A Arte de Amar”, de Ovídio, numa tradução de Carlos Ascenso André.
Na poesia, há a notar a tradução da poesia completa de Horácio, por Frederico Lourenço, e a edição da Poesia Completa de Roberto Bolaño.
Histórias da história
No campo da história dois livros destacam-se “O Memorial dos Livros Naufragados”, sobre um filho de Cristóvão Colombo, que terá tentado construir uma biblioteca gigante, contada por Edward Wilson-Lee, e “No Fio Navalha”, do investigador Valentim Alexandre, livro focado na última fase do colonialismo português, nomeadamente nas grandes convulsões que começam a abanar o império.