
Com uma tremenda perícia narrativa, o espanhol Luis Landero transforma o microcosmos da família num território labiríntico e caleidoscópico, onde é impossível fixar uma só visão da realidade
Com uma tremenda perícia narrativa, o espanhol Luis Landero transforma o microcosmos da família num território labiríntico e caleidoscópico, onde é impossível fixar uma só visão da realidade
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Na celebérrima primeira frase de “Anna Karénina”, Tolstoi sugere que, se todas as famílias felizes se assemelham (e por isso tendem a não ter grande história), as famílias infelizes, muito pelo contrário, são infelizes cada uma à sua maneira. E costumam ter — fica implícito — autênticos mananciais de narrativas, tanto públicas como secretas, que são a verdadeira matéria-prima da ficção literária.
A família retratada por Luis Landero em “Chuva Miúda” é um exemplo perfeito das implicações da frase tolstoiana. Vista de fora, não se lhe pode apontar nada de invulgar. Há uma mãe dominadora, amarga, fatalista. Há a memória de um pai que morreu cedo, levando com ele toda a alegria da casa. E há três filhos, duas raparigas quase da mesma idade, mais um rapaz caçula, irmãos que nunca conseguiram ultrapassar as frustrações e rancores trazidos da infância. Sonia, a mais velha, divorciou-se do marido que a mãe lhe impôs e trabalha, sem ânimo nem vontade, numa agência de viagens. Andrea sentiu-se sempre a preterida, a excluída, a sacrificada, falhou em tudo e a todos culpa dos seus infortúnios (sobretudo a mãe). Gabriel, o benjamim, a quem a progenitora deixava as côdeas do pão e a atenção que as irmãs cobiçavam, era o que tinha o futuro mais promissor, mas também fracassou. Queria ser filósofo, projetou escrever “Uma História da Felicidade”, mas arrasta-se como professor do ensino secundário, marido inconstante e pai sofredor, incapaz de lidar com o autismo da filha.
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