Cultura

Jorge Molder: Os retratos de 1949/1952 de Fernando Lemos são uma grande obra universal

Fernando Lemos era “um homem que tinha uma capacidade muito grande, de lutar contra a gravidade”, disse Molder, que foi também diretor do Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian

Os "Retratos 49/51/52" são "a grande obra" de Fernando Lemos, "uma obra universal", que o artista executou antes de ir para o Brasil, disse o fotógrafo Jorge Molder à agência Lusa. Amigo de Fernando Lemos, Jorge Molder afirmou-se "consternado" pela sua morte, ocorrida esta terça-feira, aos 93 anos, em São Paulo, Brasil, e afirmou-se "implicado" na divulgação da sua obra tanto em Portugal como no estrangeiro.

"O 'corpus' de Retratos é algo único", e a sua sistematização por Molder levou-o a tornarem-se amigos, e a apresentá-lo em França e na Casa de Fotografia, em Moscovo, numa exposição à qual Fernando Lemos não pôde estar presente.

Fernando Lemos era "um homem que tinha uma capacidade muito grande, de lutar contra a gravidade", disse Molder, que foi também diretor do Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian (atual Coleção Moderna).

"Sejamos claros: o facto de ser coxo fazia com que tivesse de arranjar um suplemento de força para que levasse uma vida mais do que normal", disse Molder à Lusa, numa referência às sequelas da paralisia infantil, de que padeceu, e que superou e enfrentou, ao longo da vida.

"O Fernando era uma força da natureza", enfatizou Molder, que também se referiu ao artista como "um grande poeta", autor de livros como "Teclado Universal", "Lá e Cá" e "Pegadas na Paisagem", expressão literária que este ano a Porto Editora coligiu em "Poesia", na coleção Elogio da Sombra.

"O 'corpus' de retratos que inclui pessoas muito ligadas ao teatro, como Augusto Figueiredo e José Viana, ou da literatura, como Sophia [de Mello Breyner Andresen] e Jorge de Senna, são absolutamente extraordinários e faz parte de um património universal", argumentou Jorge Molder, referindo que "são cerca de 100 fotografias que são um mundo".

Referência da cultura portuguesa e brasileira, Fernando Lemos era sobretudo reconhecido em Portugal pela fotografia de inspiração surrealista, realizada entre 1949 e 1952, e, no Brasil, pelas suas pinturas e desenhos abstratos.

O 'corpus' a que Jorge Molder se refere diz respeito ao início da carreira de Fernando Lemos, na década de 1950, quando foi "à procura dos malditos", os autores impedidos de se exprimirem na época da ditadura em Portugal, e fotografou-os, como contou em junho, durante uma visita de imprensa à mostra "Fernando Lemos. Designer", que esteve patente na Cordoaria, em Lisboa.

Depois de ter comprado uma "máquina primitiva, uma Flexaret checoslovaca", começou "uma fúria a fotografar tudo", e vários nomes destacados das artes e letras portuguesas, da época, passaram pela sua objetiva: Sophia de Mello Breyner Andresen, Jorge de Sena, Adolfo Casais Monteiro, Arpad Szenes, Maria Helena Vieira da Silva e Mário Cesariny, entre outros.

"A minha primeira exposição foi criar uma galeria de gente oprimida e proibida de se exprimir", recordou em junho Fernando Lemos, sobre um tempo que o levou a deixar Portugal.

Figura marcante da arte moderna em Portugal e no Brasil, Fernando Lemos, que morreu hoje, aos 93 anos, destacou-se pela incursão no universo experimental da fotografia surrealista, desenvolvendo depois o seu percurso artístico na pintura e no desenho.

Fotógrafo, pintor, poeta e artista gráfico, radicado no Brasil desde 1953, continuou no entanto a mostrar o seu trabalho, durante décadas, nos dois lados do Atlântico -- "Cá & Lá", como afirmava --, nas diferentes áreas de expressão artística, mas assumindo sempre a dimensão estruturante da fotografia.

O fotógrafo, artista plástico e designer gráfico Fernando Lemos, nascido em Portugal e de nacionalidade brasileira, morreu hoje numa unidade hospitalar da cidade de São Paulo.

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