Cláudio Garrudo: “Fernando Lemos era um resistente. Tinha uma energia incrível, contaminava toda a gente à sua volta”

"O Fernando Lemos era um homem à frente do seu tempo. Era um artista multidisciplinar, uma daquelas pessoas que tem visão. Recordo o livro que fiz com ele da série Ph. [a monografia "Ph.04 Fernando Lemos", editada este ano], em que começámos a fazer o livro com o oceano no meio de nós, a trocar cartas, telefonemas, sem nos connhecermos pessoalmente. Depois, quando estivemos juntos em São Paulo, na casa dele, fui recebido como se fosse da família, fiquei com um amigo para a vida.

O Fernando era um resistente. Uma pessoa que tinha uma energia incrível, contaminava toda a gente à sua volta. Deixa-nos um trabalho, não só a nível da fotografia, mas também enquanto designer. Recordo a sua humildade quando chegou na véspera à exposição da Cordoaria Nacional [este verão] organizada pelo MUDE. A Bárbara Coutinho perguntou-lhe se gostava de ver a exposição antes da inauguração e ele disse que não, porque não queria que os autores da exposição pensassem que ele desejava alterar alguma coisa. Tinha esse lado humilde. Era uma pessoa boa.

Recordo também com muita alegria o encontro que lhe proporcionei com o Professor Eduardo Lourenço em Lisboa, este verão. Estávamos na Avenida da Liberdade, na véspera da Noite de Santo António, e perguntei-lhe se ele já tinha visitado o Eduardo Lourenço. Ele disse-me que não, que já não o via há muitos anos, e liguei à minha mulher, a Ana Matos, pedindo-lhe que ligasse ao professor. Lá combinámos tudo e fomos no dia seguinte. O Lemos entra, pergunta-lhe como é que ele está e o professor, com a sua maneira especial de ser, vira-se e responde: "Estou em trânsito". Ficaram à conversa durante umas duas horas e foi um momento muito, muito especial."