As consequências da pandemia exigiram muito de todos os portugueses, principalmente dos profissionais de saúde, dos governantes, dos autarcas, dos milhares de responsáveis e profissionais das escolas, dos lares da 3.ª idade e dos empresários que viram as suas atividades suspensas. Muitos dirigentes e oportunistas políticos de esquerda viram nesta crise a oportunidade para defender a sua visão do Estado versus aqueles que, como eu, defendem o papel de um Estado forte, e não apenas grande, mas também de uma sociedade civil e de um sector privado preponderante e presente. É para situações como a que vivemos que defendo um Estado eficiente, preparado e competente, um Estado forte. Não significa isto mais Estado na vida dos portugueses, significa sim melhor Estado, um Estado que cumpra o seu papel com meios suficientes e com qualidade. Outros, igualmente oportunistas, viram também aqui o momento para menorizar o papel fundamental da sociedade civil, das empresas e do sector social e privado.
Um Portugal mais preparado só é possível com um Estado mais forte, um estado social competente só é possível com uma rede de instituições sociais fortes e com empresas saudáveis e competitivas. Tudo isto sem dogmas, sem preconceitos e posições mais ideológicas do que racionais. Mas só resulta se todos funcionarem em rede e se cada um cumprir de facto a sua função, sem desculpas, com transparência e sobretudo com humildade.
Mas a verdade é que Portugal enfrentou mais uma crise com as suas instituições públicas enfraquecidas, muitas de rastos e sem condições. Quatro anos de bonança económica que deviam ter permitido mais trabalho, mais reformas estruturais e menos propaganda, menos clientelismo e mais transparência. Os hospitais foram as principais vítimas da austeridade escondida da Geringonça e só conseguiram dar uma resposta às vítimas da covid-19 graças ao adiamento do tratamento de quase todas as outras patologias dos seus pacientes, com consequências ainda hoje por apurar, e graças ao esforço de milhares de profissionais de saúde que não foram cobardes, mas sim verdadeiros heróis. Também as Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS´s) foram maltratadas nos últimos cinco anos, viram as suas responsabilidades acrescidas (como o aumento do salário mínimo) sem que o Estado atualizasse o seu financiamento na devida proporção. Também elas enfrentaram esta crise em situação fragilizada pelas dívidas do Governo.
Vem isto a propósito das mais recentes polémicas sobre a situação dos lares e a forma como o Governo tem procurado ocultar os principais falhanços ocorridos. Importa dizer que os lares, IPSS´s e Misericórdias deste país cumprem hoje uma missão que em última instância competiria ao Estado desempenhar. Fazem-no com um apoio do Estado que fica aquém do suficiente para cumprir as mesmas obrigações que o Estado lhes impõe. Cumprem essas obrigações com o Estado a dever-lhes meses, por vezes anos, de prestações e apoios sociais que lhes eram garantidos. Muitas vezes endividam-se a juros bem altos para poderem cumprir a sua função porque este Governo lhes deve dinheiro dos acordos sociais, dos Contratos Locais de Desenvolvimento Social e dos mais diversos programas que estas instituições desempenham a pedido do Governo e do Estado. Os lares não são todos perfeitos nem todos serão um exemplo, mas imaginem o que seria dos nossos idosos sem o apoio que estas instituições privadas, muitas vezes dirigidas por pessoas sem qualquer remuneração e que dedicam todo o seu tempo a cuidar dos outros, nos prestam. Acham que o Estado faria melhor com o mesmo dinheiro? Se sim, só na cabeça de alguns iluminados da esquerda que nunca saíram do seu pedestal para ajudar quem mais precisa (a não ser com uma câmara de televisão atrás).
Segundo um estudo recente da Universidade Católica, o custo real das despesas com um idoso num lar ronda os 1350 euros. Isto sem despesas suplementares com a covid-19 e os tratamentos médicos que a maioria destes idosos necessita, em média com duas doenças crónicas cada um ou com estados de saúde já muito degradados, como demências ou outras patologias. Os contratos de apoio que o Estado tem com estas instituições, que nunca financia a totalidade dos idosos, paga 400 euros. Tudo o resto fica a cargo das respetivas famílias, das suas pensões (que rondam os 350 euros em média) ou dos próprios lares.
As IPSS´s, tal como os bombeiros, são uma excelente solução para o Estado, prestam um serviço essencial, que poderia caber ao Estado, a baixo preço para os contribuintes.
Mais do que o ON ou OFF o que nos devia interessar é a realidade dos lares.
Mais do que discutir o OFF ou ON do primeiro-ministro, importa saber se o Estado e as suas instituições fizeram tudo o que estava ao seu alcance para salvar os idosos de todos os “Reguengos” deste país. Mais do que saber se a Ordem dos Médicos devia ou não ter feito o famoso relatório, o que se exige é saber se aquilo que ali foi relatado corresponde à verdade. Se é importante saber o que realmente pensa o primeiro-ministro dos médicos, e essa declaração não deixa de ser uma vergonha, o que importa é saber se António Costa está mesmo preocupado com o que se passou em Reguengos e se o Governo cumpriu bem o seu papel. Se os médicos cumpriram o seu papel. Se as entidades públicas com essa responsabilidade fiscalizaram bem ou se foram coniventes com o Governo e com a gestão destas instituições.
Chegam-nos diariamente relatos do caos que está instalado em muitos hospitais onde a covid-19 é desculpa para tudo. Isto é gravíssimo e isso sim deve merecer o empenho do primeiro-ministro.
Governo partidarizou e politizou a resposta à COVID-19
O Governo e o Partido Socialista estão indignados com o facto de os partidos e os políticos estarem a cumprir o seu papel. Dizem que estamos a “politizar” uma crise, como se não fosse a nossa obrigação escrutinar a atividade do Governo. Mas importa também questionar aqui quem politizou esta questão? Quem geriu politicamente toda esta situação? Quem anunciou e se deslumbrou com o sucesso da estratégia portuguesa? Quem foi para o aeroporto de Lisboa, várias vezes, fazer fotos com os ventiladores chineses e outras mercadorias que chegavam a Portugal? Quem deu dezenas de entrevistas a defender o acerto das medidas anunciadas? Quem fez centenas de visitas a instituições que ora faziam ventiladores, que eram inovadores a produzir as máscaras ou os melhores do mundo nas medidas de contenção? Quem fez de tudo isto um circo não estava a politizar esta questão?
A verdade é que fica cada vez mais claro que Governo mais do que tentar combater esta pandemia procurou demonstrar o aparente acerto da ação do Governo, escondendo as fragilidades, ocultando os problemas e disfarçando os erros. Faltou transparência, escasseou a humildade e demasiadas vezes o sentido de Estado. Agora que se começa a descobrir a careca ao Governo a mesmíssima máquina de propaganda que ocultou os problemas procura atribuir responsabilidades a outros. Agora são os médicos, amanhã serão os dirigentes das IPSS´s e se tudo correr mal será Passos Coelho, o capitalismo e a União Europeia.
Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt