Na semana passada, em pleno Parlamento, o ministro do Ambiente João Matos Fernandes desvalorizava os problemas de caudal do rio Tejo, dizendo mesmo, com a sua voz forte e o seu ar arrogante e gozão que “não há falta de água no rio Tejo. Ponto”, mas sim nos seus afluentes como o rio Ponsul. Provavelmente Matos Fernandes assomou-se à janela do seu gabinete na Rua do Século, em Lisboa, e, com um pouco de sorte, vislumbrou os cacilheiros a circular no Tejo que, apesar de atrasados, navegavam com água suficiente. Só assim encontro justificação para ter proferido tamanho disparate.
Admito que esta posição do Governo português me chocou embora não me tenha de todo surpreendido, pois conhecendo o histórico do ministro e as suas declarações sobre o comportamento dos espanhóis, o que de facto me surpreendeu foi a nova posição do Governo português, transmitida através do jornal "Público", onde acusa Espanha de fazer uma “gestão inaceitável” dos caudais. Surreal este descaramento, inacreditável a mudança de posição e inqualificável o desprezo pela inteligência dos portugueses.
Continuo a acreditar, tal como já o escrevi por diversas vezes, que resolver os problemas do rio Tejo não é uma tarefa exclusiva de um governo, responsabilidade apenas de um ministro ou sequer de uma só geração. É urgente e fundamental que se construa de uma vez por todas uma estratégia séria e sustentável que garanta continuidade nas políticas, que seja competente nas soluções e que todos, sem excepção, assumam o compromisso da sua implementação.
Ora, o que Matos Fernandes tem feito é precisamente o contrário. Em relação à falta de caudal do rio Tejo fez muito pouco, não deu continuidade ao que herdou e ignorou as recomendações do Parlamento.
É por isso que pergunto: que seguimento foi dado ao acordo feito entre Portugal e Espanha na “conferência de partes” de 2015, no Porto, que previa a criação de um Mecanismo de monitorização conjunta e de partilha de dados que seria submetida a financiamento da União Europeia? Das duas uma, ou não saiu do papel ou o mecanismo foi mesmo ativado e afinal o Governo português tem mais informação do que por vezes nos tenta fazer crer.
O que fez o Governo com a da Resolução da AR n.º 63/2019, de 15/05, aprovada por unanimidade, que “recomenda ao Governo a revisão da Convenção de Albufeira”?
Por iniciativa do PSD, no início da passada Legislatura, foi proposta a criação de uma Comissão interparlamentar Luso-espanhola para valorização, proteção e defesa do Rio Tejo. Até agora também não saiu do papel.
Tal como nos problemas de poluição do rio Tejo, onde governo e o ministro do Ambiente andaram pelo menos dois anos a recusar a existência do problema ou a tentar ignorar que o epicentro da poluição estava em Vila Velha de Rodão, para depois atuar, na questão dos caudais, Matos Fernandes também andou até domingo passado a recusar que houvesse falta de água no rio Tejo.
A verdade é que, desde que tomou posse, e não esqueçamos o assunto da Central Nuclear de Almaraz, João Matos Fernandes se limitou a defender Espanha e a empurrar o problema com a barriga.
Ao contrário do que diz o Governo, não me parece que o problema resida apenas na “gestão inaceitável” de Espanha ou na falta de troca de informações. Temos na verdade um problema grave de seca que provoca obviamente uma enorme escassez. A associar a tudo isto há um grande consumo na bacia hidrográfica. Como têm alertado alguns especialistas do sector é preciso renegociar a Convenção mas também repensar todo o processo de gestão da água, sem preconceitos.
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