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“Ele adorava fado tradicional. A nossa relação não era política, era fado”: entrevista a Camané, sobre disco em que canta José Mário Branco

Camané
Camané
Nuno Botelho

Em março, Camané cantou no CCB fados que José Mário Branco compôs para ele, mas também repertório do próprio. Agora, a homenagem fixa-se em disco. O encontro entre os dois artistas dá-se em meados dos anos 80 e, a meio da década de 90, logo ao primeiro álbum do fadista, José Mário Branco torna-se seu produtor e diretor musical, funções que manteria até morrer, em 2019. “Foi fantástico ele ter-me dito que sim quando lhe pedi para produzir um disco meu”, recorda Camané na altura em que se prepara para lançar “Camané ao Vivo no CCB — Homenagem a José Mário Branco”, a conhecer dia 29

Durante uma considerável parcela da sua história, e particularmente durante o Estado Novo, o fado não gozou de imaculada reputação junto de intelectuais e oposicionistas do regime salazarista/marcelista. Eça de Queirós, logo desde o início, não pesava as palavras: “Atenas produziu a escultura, Roma fez o Direito, Paris inventou a revolução, a Alemanha achou o misticismo. Lisboa que criou? O fado. Tem uma orquestra de guitarras e uma iluminação de cigarros. A cena final é no hospital e na enxovia. O pano de fundo é uma mortalha.” Pinto de Carvalho (Tinop), autor de uma “História do Fado” (1903), enterrava a lâmina ainda mais fundo: “O fadista — minado de taras, avariado pelas bebidas fortes e pelas moléstias secretas, com o estômago dispéptico, o sangue descraseado e os ossos esponjados pelo mercúrio — é um produto heteromorfo de todos os vícios, atinge a perfeição ideal do ignóbil.” E, mais à frente, Fernando Lopes-Graça — compositor e investigador das tradições musicais populares — apenas encarava o fado como “canção incaracterística e bastarda, o execrando fado, produto de corrupção da sensibilidade artística e moral quando não indústria organizada e altamente lucrativa” (“A Canção Popular Portuguesa”, 1953).

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