Entre a ternura e a crueza, portugueses abrem alas no segundo dia do Super Bock Super Rock
Super Bock Super Rock 2022
Rita Carmo
Samuel Úria deu uma espécie de "concerto de carreira" frente a fãs entusiastas, enquanto os Classe Crua, ou seja, Sam the Kid e Beware Jack, partilharam as rimas duras do seu disco de estreia. No palco principal, Nathy Peluso ameaça tornar-se uma das estrelas do festival
Sob temperaturas talvez ainda mais impiedosas do que no primeiro dia, o festival Super Bock Super Rock continua esta sexta-feira no Parque das Nações, em Lisboa. Hoje, o espanhol C. Tangana e o rapper norte-americano Da Baby são dois dos nomes mais aguardados, mas as honras de abertura ficaram a cargo da brigada portuguesa também presente à beira-Tejo. Ao final da tarde, o movimento de público parece ser menor do que ontem, dia em que A$AP Rocky trouxe muita gente ao festival.
Samuel Úria, 43 anos de vida e quase duas décadas dedicadas ao ofício da música, é um homem atento à história - à história do rock, por exemplo, e à sua própria história, ancorada em datas importantes como a do concerto que deu neste mesmo festival, em 2013. Por se lembrar do mesmo, decidiu "não se furtar" a revisitar algumas canções tocadas nessa ocasião. "Se não correr bem, a culpa é vossa", brincou o artista que inicialmente duvidou que alguém acorresse ao seu espetáculo, marcado para o final da tarde, no fresco da Sala Tejo. O tondelense começou assim por saudar os festivaleiros que se "congregaram" no palco EDP "para fugir ao calor". A verdade é que a reação da plateia, generosa em número para o horário de matiné, provou que não eram apenas os 'refugiados' do calor que ali se encontravam. E Samuel Úria, entertainer para todas as horas, correspondeu ao carinho dos fãs, oferecendo-lhes uma espécie de concerto de carreira, com paragem em vários pontos do seu percurso. "Esta canção escrevi-a em 1997. 90% das pessoas que estão aqui nem deviam ser nascidas, por isso se não gostarem é uma falta de respeito pelos mais velhos."
Invariavelmente, as canções de Samuel Úria têm algo de apoteótico, o que por vezes parece algo deslocado para esta hora recatada, em que o sol ainda brilha lá fora. Mas o empenho do cantor-compositor, acompanhado pela banda habitual, e o entusiasmo dos fãs, que tanto reagem com alegria a 'Carga de Ombro' e 'Aos Pós' como às recordações remotas como 'Rua da Fonte Nova', tornam o momento especial. "Vocês são boas pessoas", agradeceu Samuel Úria, antes de apresentar uma versão de 'Molly's Lips', dos Vaselines, adaptada para português com o título 'Os Lábios da Amália', e de estrear uma guitarra elétrica personalizada com pinturas de um "psicadelismo fofinho". Não faltou ainda o elogio a todos os que, "com música no coração, e nas pernas, e nos músculos", montaram este festival em tempo recorde, naquilo a que este homem de fé chamou um verdadeiro milagre.
Lá fora, afinal, não estava tanto calor como Samuel Úria imaginava. Frente ao palco LG, corria mesmo uma brisa ligeira que acariciava as faces daqueles que, sentados no 'quintal' da Altice Arena, assistiam ao concerto de Classe Crua, ou seja, do projeto de Sam the Kid e Beware Jack. À semelhança do que fez Fred, ontem neste palco, também a dupla nascida entre Chelas e Odivelas quis mandar o seu amor para a equipa que montou o festival em dois dias, antes de terminar o concerto pelo início, ou seja, com a primeira canção que escreveram juntos. "Nunca a tocámos ao vivo", alertou Beware Jack, antes de, juntamente com o amigo, se atirar à feroz crítica socio-política de versos como "Queres ser feliz, vai para juíz/reforma-te aos 40".
Logo a seguir, no palco Super Bock, montado no interior da arena, a argentina Nathy Peluso impressionou meio mundo com um espetáculo frenético. Reportagem desta atuação muito em breve.