Blitz

Rock in Rio Lisboa: não vai ficar tudo bem, mas com os Xutos & Pontapés já está bastante melhor

Totalistas do Rock in Rio Lisboa, tendo atuado em todas as edições do festival, os Xutos & Pontapés abriram o Palco Mundo no regresso pós-pandemia do evento da Bela Vista, onde mereciam tocar mais tarde

Rock in Rio Lisboa: não vai ficar tudo bem, mas com os Xutos & Pontapés já está bastante melhor

Lia Pereira

Jornalista

Rock in Rio Lisboa: não vai ficar tudo bem, mas com os Xutos & Pontapés já está bastante melhor

Rita Carmo

Fotojornalista

À entrada da Cidade do Rock que, por estes dias, assenta arraiais na Bela Vista, em Lisboa, uma senhora afadigava-se a vender "lenços dos Xutos: dois, cinco euros!", insistia. Mas, pouco antes de a banda portuguesa abrir a programação do Palco Mundo da primeira edição do festival pós-pandemia, a maior parte dos espectadores que subiam a estrada até à entrada do recinto já vinha munido das suas próprias t-shrits e demais acessórios. Os Xutos, precisamente, e os Muse, cabeças de cartaz deste dia inaugural, dominavam as escolhas de vestimenta. Mas também avistámos 'camisetas' de Pink Floyd, Pixies, Guns N' Roses (que estrearam a temporada dos grandes concertos deste verão, em Portugal), Gorillaz (estrelas do NOS Primavera Sound, que decorreu no Porto no passado fim de semana) e Foo Fighters, o nome maior do cartaz deste sábado, cujo concerto teve de ser cancelado após a morte repentina de Taylor Hawkins, baterista da banda e braço direito de Dave Grohl.

Enquanto os primeiros aventureiros deslizam pelo slide que atravessa o Palco Mundo, o 'quarteto fantástico' de Tim, João Cabeleira, Kalú e Gui atira-se à missão com 'Fim de Semana', tema de 2004 escolhido, porventura, pela letra que reflete estes tempos de sofreguidão pelos pequenos grandes prazeres. "Fome de sair/fome de te ver/fome de saltar/fome de te ter/fome de voar/Fome de cair/Fome de te amar/Para depois viver." Com Zé Pedro sempre presente, em espírito e também na primeira das t-shirts envergada por Tim, os Xutos & Pontapés deram hoje o seu nono concerto num festival que vai na sua nona edição; melhor do que o palmarés dos portugueses só mesmo o de Ivete Sangalo, que em 2016 subbstituiu a jovem Ariana Grande, atuando por duas vezes na mesma edição do Rock in Rio Lisboa.

Ainda que andem nisto desde 1979, e mesmo que tenham no bolso a maior coleção de êxitos do rock português, os Xutos & Pontapés continuam a enfrentar cada concerto com uma mistura muito personalizada de empenho e humildade. "Ei pessoal, tudo bem? Braços no ar!", começa por apelar Tim. E que bom é ver este mar de gente, que paulatinamente, e para satisfação da banda, se tornará cada vez mais volumoso.

Apostando num alinhamento eminentemente rock, os primeiros 'convidados' do Palco Mundo viajaram até 1985, para tocarem 'Voo das Águias', do álbum "Cerco", e a "Dados Viciados", de 1997, para recuperarem "Não Sou Jesus". Sensivelmente a meio do concerto chega "uma canção que ficou conhecida aqui há uns dois anos", brinca Tim, referindo-se a 'Negras Como a Noite'. Da colheita, também, de "Dados Viciados", o belíssimo tema voltou, de facto, à baila no pico da pandemia, graças ao otimismo do refrão "vai ficar tudo bem, isso eu sei". Nesta altura, sabemos todos - e Tim, que aproveita para lembrar que "sempre houve guerra", também - que não ficou, nem ficará, tudo bem. Mas pode ficar "mais direitinho", acredita o vocalista-baixista, e com este reencontro já nos sentimos um pouco melhor.

Depois dos dois 'tomos' de 'Inferno', 'Perfeito Vazio', a bonita balada do álbum homónimo de 2009, com Tim na guitarra acústica, abre alas à fase de maiores êxitos do concerto, que começa com 'Homem do Leme' (tocada nas versões acústica e elétrica!); o hino 'Circo de Feras', cuja receção deixa a banda de sorriso rasgado; a alegria de 'Ai Se Ele Cai' e a falsa despedida de 'Para Ti Maria'. "Temos mais concertos para dar, vamos apanhar uma carrinha para o norte", é a introdução brincalhona de Tim para a canção que se estende "de Bragança a Lisboa". Já depois de Kalú vir à 'passadeira' que irrompe pelo meio da plateia entregar baquetas aos fãs, um coro tímido de "só mais uma" transforma-se num repto exigente. "Obrigado, pessoal, esta é de borla", agradece o bem-disposto anfitrião, antes de o riff de 'Casinha' eletrizar a multidão, responsável por um coro que se há de ter escutado na margem sul.

Com um evidente prazer em (ainda) tocarem juntos, e um catálogo de sonho, já era tempo de a mais popular das bandas rock portuguesas 'subir' no alinhamento e tocar com menos luz natural e mais tempo de palco. Longa vida aos Xutos.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: LIPereira@blitz.impresa.pt

Comentários
Já é Subscritor?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate