NOS Primavera Sound: silêncio, que vão tocar os Cigarettes After Sex

A 'receita' parece simples, mas é rara: os texanos Cigarettes After Sex podem parecer uma banda demasiado literal - sim, falamos do nome - e os seus recursos óbvios na intenção de nos enlevar - fundo de palco com uma projeção de um mar tranquilo sob uma lua vigilante, trecho musical quase fílmico antes do concerto -, mas quando chega aquela parte (fulcral) que consiste em mostrar música capaz de fazer jus à imagética e ao manifesto, o grupo de Greg Gonzalez cumpre integralmente o prometido. Os Cigarettes After Sex, à falta de melhor expressão, fazem completamente sentido.

Artífices de um pop/rock sonhador, tecido parcimoniosamente entre os instrumentos da praxe e uma voz que se encosta ao todo como manteiga em pão quente, os Cigarettes After Sex têm dentro de si sementes do início dos anos 90 em que o shoegaze menos sónico ambicionava tocar as estrelas e a dream pop de uns Mazzy Star colocava um manto acetinado no rock, transformando o que era propenso à adiposidade num corpo sensual e insinuante. Sobretudo, e aqui seremos nós literais, os Cigarettes After Sex fazem parte da casta de bandas que pegaram no fumo de cigarro dos filmes e deixaram-no, magicamente, dedilhar guitarras.

Ao longo de uma hora, o palco de 'betão' do NOS Primavera Sound (aquele que se posiciona mais longe dos cenários relvados) presenciou um misto de filme de mistério com um sonho delirante onde 'Wicked Game', de Chris Isaak, é repetido em loop. Claro que não bem assim, pelo menos não se entenda esta alusão à circularidade como apontamento negativo. É, na verdade, um elogio: ao não sair do sítio (apenas dois álbuns como base), a música dos Cigarettes After Sex leva-nos a toda a parte. De 'Crush' a 'You're All I Want', o romantismo não quebrou. O amor, só o melhor, é sempre o mesmo.