“Pressionar países não europeus ricos”, abandonar os fósseis, incluir refugiados nos debates: as primeiras declarações na COP27
A fotografia de família da COP27 tirada no primeiro dia da cimeira. Ao centro, pode ver-se António Guterres
Sean Gallup
Várias ONGs descreveram o início da cimeira como “pobre”, por não ter estabelecido qualquer mecanismo para financiar as “perdas e danos” dos países vulneráveis às alterações climáticas. Este e outros pontos-chave foram abordados esta segunda-feira por alguns líderes na COP27, desde António Costa a Emmanuel Macron
Depois do discurso de abertura de António Guterres na 27.ª Conferência das Partes das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, no Egito, as declarações dos líderes políticos e das organizações não governamentais focaram-se na necessidade de apostar nas energias renováveis e de priorizar a compensação dos países mais afetados pela crise climática.
O Presidente francês, Emmanuel Macron, considerou que os “países não europeus ricos” devem ser “pressionados” a pagarem a sua “parte” para ajudarem as nações mais vulneráveis. “Os EUA e a China têm de estar realmente envolvidos, porque os europeus são os únicos a pagar”, disse Macron durante um intercâmbio com jovens.
Na mesma linha, o presidente do Senegal e da União Africana defende que aqueles que mais poluem — e que têm mais “responsabilidade histórica” no aquecimento global — devem pagar mais. Macky Sall sublinhou a especial vulnerabilidade do continente africano, que “contribui com apenas 4% das emissões de gases com efeito de estufa, mas está a lutar para fazer face às alterações climáticas”.
Já o antigo vice-presidente dos Estados Unidos, Al Gore, também presente na cimeira na estância turística de Sharm el-Sheikh, apelou à importância de “utilizarmos energias renováveis” e “deixarmos de subsidiar a cultura de morte”, referindo-se ao uso contínuo de combustíveis fósseis. Nenhum novo projeto de combustíveis fósseis é aceitável, vincou.
“Continuamos a usar a fina atmosfera azul como um esgoto aberto. Está a ficar cada vez pior. Temos um problema de credibilidade — todos nós não estamos a fazer o suficiente”. Al Gore, Nobel da Paz em 2007, disse também que a humanidade está perante “um tempo de clareza moral, não de indiferença imprudente” e é otimista: “Há um caminho para um futuro com esperança”.
Portugal pode antecipar neutralidade carbónica e vai aumentar cooperação energética
Em declarações aos jornalistas na COP27, António Costa disse que Portugal está a reunir condições que lhe permitem antecipar de 2050 para 2045 a meta da neutralidade carbónica, defendendo progressos nos transportes públicos, no hidrogénio e o fim das centrais a carvão.
“O objetivo não é somente alcançarmos a neutralidade carbónica em 2050 — e fomos o primeiro país do mundo a assumir essa meta na COP de Marraquexe [em 2016] —, mas também, como está previsto na lei, estudar e fazermos tudo para antecipar para 2045 esse resultado”, declarou.
Costa informou ainda que Portugal vai aumentar de quatro para cinco milhões de euros a verba para apoiar a cooperação na transição energética dos países mais pobres, defendendo que está a fazer a sua parte, depois de confrontado com a tese das compensações dos países pobres pelos mais ricos, por “perdas e danos” ambientais.
O líder do executivo referiu que na COP26, em Glasgow, “Portugal assumiu o compromisso de afetar uma parcela significativa da sua cooperação para o desenvolvimento centrado na transição energética, cerca de quatro milhões de euros por ano”. E “na estratégia de cooperação até 2023, está previsto aumentar em mais um milhão de euros por ano”, realçou.
ONG lamentam “mau começo” da COP por não compensar países pobres
Várias organizações não governamentais descreveram o início da cimeira como “pobre”, dado que a agenda não incluiu a compensação dos países mais afetados pela crise climática, especialmente em África. A Climate Action Network, Greenpeace e Power Shift Africa denunciaram, numa conferência de imprensa, que não foi estabelecido qualquer mecanismo para o seu financiamento.
“Infelizmente, a única forma de resumir como vai a COP27 é com duas palavras: mau começo”, disse o diretor da ONG Power Shift Africa, Mohamed Adow. O queniano denunciou que esta cimeira não proporcionou a oportunidade de “mobilizar o financiamento de que os países vulneráveis necessitam para poderem fazer face aos danos e perdas”.
Já a diretora executiva da Climate Action Network International, Tasneem Essop, exortou os países ricos a reduzir as emissões “mais rapidamente” do que os países em desenvolvimento, acrescentando que a redução do aumento da temperatura para 1,5ºC está a ser afetada pela “falta de compromisso, implementação e financiamento”.
Na mesma linha, o diretor de campanhas da Greenpeace MENA, Ahmad El Droubi, recordou que o compromisso de financiamento de 100,185 mil milhões de euros para ajudar os países pobres a mitigar os problemas causados pelas alterações climáticas “não foi cumprido”, apesar de ter sido aprovado em 2009.
ACNUR pede aos líderes mundiais que incluam refugiados nos debates
O alto comissário das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), Filippo Grandi, pediu aos líderes mundiais para não esquecerem as pessoas deslocadas, nas discussões sobre a crise climática que ocorrerão durante a COP27.
O líder do ACNUR lembrou que 70% dos refugiados vêm de países mais vulneráveis às mudanças climáticas, como o Afeganistão, República Democrática do Congo, Síria ou Iémen. O alto comissário sublinhou a necessidade de financiamento adicional para alguns países lidarem com as chamadas “perdas e danos”.
Grandi alertou, por último, que os refugiados e as pessoas deslocadas são “com muita frequência” excluídas destas negociações, no entanto, a COP “deve habilitar os países e comunidades que estão na linha da frente da crise climática para fenómenos climáticos específicos”.
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