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O 's' do ESG e a importância de uma liderança inspiradora

A liderança das organizações é absolutamente chave e, por essa razão, tem de se continuar a fazer um esforço grande de consciencialização e qualificação das lideranças, nesta transição para um paradigma de Liderança pelo Serviço. Serviço a um bem maior e que extravasa o desempenho dos negócios, mas que contribui para o mesmo

Falar de sustentabilidade, nos dias que correm, implica necessariamente reconhecer que o acrónimo ESG (Environment, Social e Governance – Ambiente, Social e Governança ou Governação) entrou no léxico corrente de empresas, governos e investidores, bem como de qualquer pessoa que lida com estes temas, no seu dia a dia.

Independentemente da opinião que se possa ter sobre a maior ou menor relevância e adequação dos ESG como pedra basilar da sustentabilidade – e esta divergência existe e é notória (exemplo disso é a reconhecida opinião de empresários de peso, como Elon Musk, que afirma publicamente que os standards de ESG são demasiado estreitos na sua abordagem e que, por isso, falham na análise mais ampla do potencial de longo prazo de empresas que estão a trabalhar para gerar transformações disruptivas do status quo versus a crescente produção de regulamentos e normativos que a União Europeia tem produzido nestas matérias – um fenómeno a que alguns chamam “uma avalanche regulatória”) – a verdade é que existe uma utilização generalizada deste acrónimo para tudo o que se refere ao caminho que as organizações empresariais estão a trilhar, no sentido de se tornarem mais sustentáveis.

A reflexão que gostaria de trazer para cima da mesa hoje, agarrando neste conceito de ESG é a importância do “S” no ESG – ou seja, a dimensão social da sustentabilidade. Não sei se por acaso das circunstâncias ou por pensamento estratégico, o S está no centro desta sigla. E, de facto, tudo o que atualmente está em curso a nível global, quando se fala de sustentabilidade, tem, no coração das ações que se implementam, o objetivo de proporcionar uma maior qualidade de vida, de forma inclusiva e equitativa, a todas as pessoas, independentemente das suas circunstâncias, estatutos ou condições socioeconómicas. Ou seja, no final, é tudo acerca das pessoas – o maior e mais valioso recurso da humanidade e, diria, o factor chave para uma vida sustentável neste Planeta. Quer a montante – no que os seus comportamentos podem comprometer -, quer a jusante - no valor que podem gerar de transformação positiva. Falar de Sustentabilidade é falar de criar as condições no Planeta para que este seja uma casa segura e próspera para a vida das pessoas (E), é falar da necessidade de colocarmos a dignidade, o bem-estar e o desenvolvimento das pessoas no centro das estratégias das organizações (S) e criar os modelos organizacionais, regras, processos e estruturas que que possam garantir que as organizações atuam de forma ética, transparente e responsável (G).

- A razão pela qual nos preocupamos com o ambiente (o “E” do ESG) é, sobretudo, resultado da necessidade de garantir que temos um Planeta saudável e capaz de gerar os recursos necessários para que a geração atual e gerações futuras, vivam, ambas, com qualidade,

- Tal como as orientações e boas práticas económicas e financeiras que se albergam debaixo da letra “G”, procuram garantir igualdade, inclusividade e transparência na forma como as pessoas se organizam enquanto coletivos, mantendo o foco na possibilidade de oportunidades equitativas para todos.

Rui Nabeiro sabia disso. Da importância das pessoas. O exemplo de criação de valor acrescentado para a comunidade envolvente de Campo Maior, bem como toda a cultura da organização que implementou, são exemplos claros da uma visão “à frente do seu tempo” e continuarão a inspirar muitas organizações e pessoas, dentro e fora de Portugal.

A liderança das organizações é absolutamente chave e, por essa razão, na minha opinião, tem de se continuar a fazer um esforço grande de consciencialização e qualificação das lideranças, nesta transição para um paradigma de Liderança pelo Serviço. Serviço a um bem maior e que extravasa o desempenho dos negócios, mas que contribui para o mesmo.

E, no que a este ponto em concreto se refere, não podia deixar de falar nas Jornadas Mundiais de Juventude, que tiveram lugar, como todos sabem, durante o mês de Agosto passado. E, em particular, em algumas mensagens do líder deste grande evento – o Papa Francisco – que, no meu entender, são fulcrais no tema da sustentabilidade, independentemente de crenças, convicções políticas ou ideologias.

Muita tinta correu sobre o tema. De um lado, as preocupações com a utilização de dinheiros públicos num evento desta dimensão, de cariz religioso, num Estado laico (na minha opinião, este evento foi muito mais do que apenas um evento sectário de uma religião) e os impactos ambientais do próprio evento (como, por exemplo, as emissões de carbono dos transportes necessários à deslocação e mobilidade de mais de um milhão de pessoas a Lisboa) e, do outro, os impactos positivos tangíveis e intangíveis, mas muito visíveis, do evento, quer em termos económicos (relativamente aos quais realçaria, no curto prazo, um retorno financeiro que os estudos apontam andar entre os 400 milhões de euros e os 600 milhões de euros e, no longo prazo, o reforço da imagem de Portugal e na sua projeção internacional, sobretudo no que se refere às novas gerações e cujos impactos diretos e indiretos são difíceis de avaliar), quer em termos da onda de positividade, solidariedade, civismo e alegria que se gerou durante o tempo em que as Jornadas decorreram e que o País bem precisa, para compensarmos algum do nosso pessimismo crónico e tendência para o criticismo exacerbado que, na minha opinião, é tantas vezes causa de não sermos capazes de sonhar com voos mais altos, nas várias dimensões da nossa sociedade.

Mas o aspeto que gostava de realçar é a importância fundamental que uma boa liderança que, quer sejamos ou não católicos, julgo sermos capazes de reconhecer em Jorge Bergoglio (Papa Francisco) – a sua forma direta de se dirigir a todos, a atenção no que diz e na forma como ouve, e a coragem de passar mensagens, muitas vezes bastante polémicas na própria organização que representa ao mais alto nível, e que lhe granjeiam, no mínimo, o respeito de setores diversificados da sociedade – tem na mobilização e orientação para a ação de pessoas e comunidades, dentro e fora das organizações. Deixo 4 frases que me marcaram e que, do meu ponto de vista, nos podem dar pistas inspiradoras para a ação, quando falamos na sustentabilidade do planeta e das pessoas:

  • “Substituí os medos pelos sonhos, não sejais administradores de medos, mas empreendedores de sonhos!” – um claro incentivo à capacidade de risco e de inovação que, no contexto atual, são absolutamente chave para resolvermos os grandes problemas com os quais nos defrontamos;
  • "Na Igreja há espaço para todos. E, quando não houver, por favor façamos com que haja, mesmo para quem erra, para quem cai, para quem sente dificuldade. Todos, todos, todos" – uma mensagem de diversidade e inclusão, que serve a todos, independentemente do seu credo ou religião, mas que é especialmente relevante para muitas vozes dissidentes que existem dentro da própria organização que é a Igreja e que determina, de modo firme, os valores e visão de um líder;
  • "Quem ama não fica de braços cruzados, quem ama serve, quem ama corre para servir, corre empenhado no serviço aos outros." – um forte apelo à ação positiva, ao voluntariado, ao serviço como paradigma de uma vida mais sustentável, quer a nível espiritual, quer a nível social;
  • “Não esqueçais que temos necessidade de uma ecologia integral, de escutar o sofrimento do planeta juntamente com o dos pobres; necessidade de colocar o drama da desertificação em paralelo com o dos refugiados; o tema das migrações juntamente com a queda da natalidade” – uma verdadeira ode à urgência de entender que o bem estar do Planeta está também no centro da sustentabilidade do Homem e que, como tal, deve ter a mesma importância e o mesmo cuidado que dedicamos aos segmentos mais desfavorecidos da sociedade., deixando bem claro a interligação endémica entre Planeta e Pessoas.

Frases poderosas e mensagens claras que indicam caminhos de ação e que ficarão gravadas em muitos de nós, por muito tempo. É também isso que um bom líder sabe fazer – gravar no tempo mensagens que ecoam e que nos alimentam a esperança e a motivação para fazer melhor. E este é um enorme exemplo disso e de uma liderança que tem claramente uma visão de serviço às Pessoas. Ao “S” do ESG. Ao Homem no centro da ação necessária para uma maior sustentabilidade.


Mário Henriques

Oiça aqui o episódio de estreia do podcast ‘Ser ou não ser’ com Rui Miguel Nabeiro:

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