São já 7,8% os que dizem não querer tomar a vacina, e 10% os ainda hesitantes, mostram os resultados do inquérito apresentado esta manhã na reunião do Infarmed, numa alteração de comportamentos face à pandemia após o caso com a AstraZeneca. Perfil de inquiridos que recusa ser vacinado está identificado. Diretora do Instituto de Saúde Pública diz que “não parece haver evidência de problemas” para cumprir o plano
Aumentou em Portugal a percentagem de pessoas que mostra intenção de não tomar a vacina contra a covid-19. Os investigadores da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP) da Universidade Nova de Lisboa chamam a atenção para essa diferença quando se compara a última quinzena analisada (entre 19 de março e 2 de abril) com a anterior. De 1,7% de pessoas a responder que tem intenção de não tomar a vacina, o estudo mostra agora 7,8% de respostas nesse sentido.
Uma das investigadoras, Carla Nunes, apresentou os dados esta manhã na reunião entre peritos e governantes no Infarmed, frisando uma nota importante: as perguntas feitas pela equipa de investigação foram alteradas. Em caso de ainda não ter tomado nenhuma dose de qualquer vacina — e 10% dos inquiridos já tinha tomado —, o inquérito questionava os cidadãos com três hipóteses: pretende “tomar”, “não tomar”, ou “ainda não decidiu”. No inquérito anterior, havia hipóteses como “esperar algum tempo antes de tomar”, o que pode ter diluído algumas destas respostas agora negativas.
“Apesar de ter havido algumas alterações nas intenção, não parece haver evidência de problemas na execução do plano de vacinação por parte da população.”
Ainda assim, a equipa da ENSP constata que estes 7,8% de recusas na toma não só representam um aumento significativo como se aproximam “de valores apenas encontrados em outubro de 2020”. A questão é que nessa altura a informação sobre as vacinas “era muito menor” e, portanto, o ceticismo mais facilmente entendível.
Os investigadores notam ainda um perfil nestas recusas. Tratam-se sobretudo de pessoas “mais jovens, que perderam parte ou a totalidade do seu rendimento, não tomavam vacina da gripe, mostram baixa confiança nos Serviços Saúde e nas medidas e consideram a informação das autoridades de saúde pouco clara e inconsistente”. A equipa deixa o alerta de que é preciso “desenhar intervenções de comunicação que vão ao encontro deste perfil”.
Além disso, Carla Nunes assinalou que há 10% de inquiridos ainda hesitantes quanto á toma da vacina. Ainda assim, deixou uma nota de confiança. “Apesar de ter havido algumas alterações nas intenção, não parece haver evidência de problemas na execução do plano de vacinação por parte da população.”
A este aumento de desconfiança não será alheio o processo em torno da vacina da AstraZeneca, que nas últimas semanas, precisamente o período analisado, tem conhecido avanços, recuos, dúvidas e discórdias.
Na semana passada, a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) tinha reconhecido uma “possível ligação entre a administração da vacina e a ocorrência de coágulos sanguíneos invulgares combinado com nível baixo de plaquetas”, sublinhando sempre que os benefícios são bastante superiores aos riscos. Ainda assim, a garantia não demoveu alguns países de aplicar restrições à administração desta vacina.
Em Portugal, na passada quinta-feira foi decidido administrar esta vacina apenas a maiores de 60 anos, o que provocou um “pequeno” atraso na vacinação, segundo o coordenador da task force, o vice-almirante Henrique Gouveia e Melo.
Carla Nunes, especialista da ENSP, referiu-se às perceções sociais dos portugueses em relação à pandemia e assinalou uma outra diferença relevante. Nas últimas duas semanas, houve mais pessoas a admitir ter-se reunido em grupos de 10 ou mais pessoas — de 4,9% para 7,5% nas últimas duas semanas.
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