Foi quando descobriu que precisava de um transplante de fígado que o ciclismo entrou na vida de António Rodrigues. Primeiro, por conselho médico. Era preciso começar a preparar o corpo para a perda abrupta de massa muscular provocada pela doença genética que acabara de descobrir, aos 26 anos. Era polineuropatia amiloidótica familiar, um palavrão para a chamada “doença dos pezinhos”, uma condição genética que começaria por lhe comprometer o movimento dos pés e das mãos. E pouco a pouco, mas de forma vertiginosa, de todos os músculos do corpo, até que, num espaço de uma década, apenas o cérebro se manteria funcional. “No topo da vida”, como se sentia, não houve forma de receber uma notícia destas senão com “choque”, recorda agora, 20 anos depois. Uma “queda desamparada para um abismo”, com vista para o único tratamento que se sabia funcional mas cujo vislumbre era, em si mesmo, assustador. “De repente, a nossa vida depende de uma grande infelicidade de outra vida. Para vivermos, alguém tem de morrer.”
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