Sociedade

Velhice fortalece duas capacidades mentais

Velhice fortalece duas capacidades mentais
Fayaz Aziz

Estudo internacional liderado por investigador português, publicado esta quinta-feira na revista “Nature Human Behaviour” , revela que os mais velhos são mais aptos a prestar atenção ao que é novo e a focarem-se no importante

O avanço da idade envelhece o corpo e a mente mas ser velho dá, afinal, vantagem em algumas capacidade do cérebro. Dar atenção a novas informações e manter o foco no que é relevante perante múltiplos estímulos são capacidades mentais que melhoram com a velhice. A conclusão consta de um estudo da Faculdade de Letras de Lisboa e da Universidade de Georgetown, nos EUA, publicado esta quinta-feira na revista “Nature Human Behaviour”.

Segundo os autores, liderados pelo investigador português João Veríssimo, as capacidades de atenção melhoradas com a idade são básicas, isto é, estão presentes na memória, tomada de decisão, autocontrolo, aptidões matemáticas, de linguagem ou de leitura e até no comportamento, podendo atuar como um escudo contra o declínio cerebral. Por outras palavras, o envelhecimento do cérebro é inevitável com os anos mas não é generalizado e pode ser minimizado com o treino de aspetos básicos da cognição.

O estudo incluiu 702 participantes, dos 58 aos 98 anos, e as vantagens cerebrais foram identificadas, sobretudo, até aos 76 a 78 anos. “Verificámos que os mais velhos obtiveram melhores resultados em dirigirem a atenção e na capacidade de foco na informação relevante, inibindo o que distrai, e perderam para os menos velhos na função de alerta, de vigilância”, explica João Veríssimo, professor da Faculdade de Letras de Lisboa. “Estes resultados não encaixam na ‘visão predominante’ de que o envelhecimento necessariamente significa declínios. O estudo - conduzido com uma amostra relativamente grande para este tipo de trabalhos e bastante maior do que amostras de estudos anteriores - não revela só a ausência de declínios, revela também a existência de melhorias.” A explicação reside num duelo.

“Pensamos que há uma combinação de duas forças: o declínio e uma espécie de reserva cognitiva acumulada pela experiência, que, ainda assim, a partir dos 78 anos já não chega para garantir um benefício e a vantagem atenua-se e surge já algum declínio mental.” O investigador português, até há pouco tempo sedeado na Universidade de Potsdam, na Alemanha, sublinha que os ganhos na atenção e nas funções executivas agora descritos vêm na mesma linha de outras vantagens associadas à idade, por exemplo no vocabulário.

“Ainda não sabemos bem no que se traduzem estes resultados na vida real, mas sabemos que são capacidades utilizadas em quase tudo. Falta um link: saber como as diferentes funções do cérebro se interligam e como a atenção e as funções executivas, básicas, entram nas demais competências cerebrais e comportamentais.”

Sobre um coisa os autores têm uma forte suspeita: “Há qualquer coisa nessas funções básicas que é suscetível de treino. Será possível fazê-lo quando há perturbações do envelhecimento, para colmatar a perda?” Falta resposta. Ainda assim, “há sugestão de que uma maior escolaridade dá resistência contra a doença de Alzheimer ou de que pessoas que falam mais do que um idioma ou tocam um instrumento têm melhores resultados nas funções executivas”.

João Veríssimo sublinha: “O cérebro está muito diferenciado, separado, e tem diferentes trajetórias de envelhecimento para as diferentes funções, portanto não se degradam todas ao mesmo tempo.” Treinar capacidades mentais, mesmo que básicas, parece fazer a diferença.

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