Sociedade

Izabella Teixeira: “A sustentabilidade é o único objetivo que hoje consegue juntar todos os países”

Amazónia: sem o reconhecimento jurídico do Sistema Terrestre, o trabalho intangível vital da floresta é invisível na economia e só através da sua destruição é possível criar riqueza nos países da região
Amazónia: sem o reconhecimento jurídico do Sistema Terrestre, o trabalho intangível vital da floresta é invisível na economia e só através da sua destruição é possível criar riqueza nos países da região
d.r.

Bem-vindo às Conversas da Casa Comum. Desde 23 de setembro, a Casa Comum da Humanidade (CCH), organização global com sede em Portugal, na Universidade do Porto, está a realizar uma campanha de divulgação internacional da sua iniciativa “Um Sistema Terrestre, um Património Comum, um Pacto Global”, em parceria coma a agência de notícias The Planetary Press

Izabella Teixeira: “A sustentabilidade é o único objetivo que hoje consegue juntar todos os países”

Virgílio Azevedo

Tradução e adaptação

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A campanha conta com uma série de entrevistas feitas por esta agência, gravadas em podcast e transcritas em inglês, português e espanhol – as “Conversas da Casa Comum ONU75” – a personalidades de projeção internacional. As primeiras 14 entrevistas são acompanhadas por vídeos com animações sobre as propostas da CCH. O Expresso publica todas as quartas-feiras uma entrevista e um vídeo associado enquanto durar a campanha (pode ver as duas primeiras entrevistas e vídeos AQUI e AQUI).

A CCH propõe o reconhecimento do Sistema Terrestre como Património Comum da Humanidade, para restaurar um clima estável, criar um novo modelo de governança para os recursos naturais comuns do planeta e promover um novo Pacto Global para o Ambiente junto da ONU, que acabe com o atual impasse nas negociações climáticas. Para concretizar este objetivo, a CCH está a organizar uma coligação global de conhecidos cientistas do Sistema Terrestre e da sustentabilidade, juristas, economistas, sociólogos, Estados soberanos, ONG, organizações internacionais, autoridades e comunidades locais, povos indígenas e universidades.

A Casa Comum da Humanidade tem como fundadores sete universidades portuguesas, a ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável, o Ministério do Ambiente e Ação Climática, as Câmaras Municipais do Porto e de Gaia e especialistas de todo o Mundo. E tem também uma série de parceiros além da The Planetary Press, como o Instituto Internacional de Derecho y Medio Ambiente (IIDMA, Madrid), a rede The Planetary Accounting Network, a Global Voice ou a Earth Trusteeship Initiative.

"Há um poderoso enquadramento legal no Brasil, bem como capacidade científica e institucional, para combater a desflorestação da Amazónia"
d.r.

Hoje falamos com Izabella Teixeira, copresidente do Painel Internacional de Recursos do Programa das Nações Unidas para o Ambiente, ex-ministra do Meio Ambiente do Brasil e embaixadora da Casa Comum da Humanidade (ouvir a entrevista completa em inglês AQUI).

Tem dedicado a sua vida a proteger a Natureza. Qual foi a força motriz para esta paixão?

É uma pergunta difícil porque tenho trabalhado nos últimos 35 anos sobre questões ambientais não só no Brasil, mas também a nível global. Sou bióloga e aprendi como a diversidade da vida é fascinante. Nasci no século passado, nos anos 60, e as décadas de 70, 80 e 90 foram um momento no mundo em que as questões ambientais estavam a emergir como questões globais estratégicas. Por isso, estava realmente fascinada nos primeiros anos da minha carreira por ter a oportunidade de me juntar a este movimento, por avançar considerando as questões do desenvolvimento no meu país – isto é, de como podia unir o desenvolvimento ao ambiente, à preservação e à conservação - mas também de como podia ter uma abordagem que considerasse a diversidade das sociedades (incluindo as do Brasil) e a desigualdade social, juntando todos estes problemas. Assim, as decisões internacionais sobre a agenda ambiental e a agenda de sustentabilidade surgiram durante a minha carreira, tal como os acordos globais multilaterais, as cimeiras globais, etc., mas sempre tentando gerir melhor as realidades nacionais no Brasil e promover o encontro das pessoas ligadas às questões do ambiente. Era um processo que para mim estava para além da ciência e da política, significava que podíamos estar juntos pela mesma causa, o que me fascinou. Eu amo a diversidade do planeta e não apenas os biólogos, a possibilidade de redescobrir o mundo e de estar mais perto de outras pessoas. E isto é algo que ainda hoje faz sentido para eu seguir em frente. Assim, trata-se de fazer parte do mundo de uma forma que eu possa contribuir para aumentar a qualidade de vida e melhorar a relação entre a Humanidade e a Natureza. É o que faz sentido para mim enquanto bióloga.

A Izabella Teixeira é de uma das regiões com maior biodiversidade do planeta. Isto teve uma influência nas suas decisões de carreira para proteger a Natureza?

Sim, porque comecei a trabalhar nesta área em 1984, depois da licenciatura, e estava totalmente dedicada à investigação científica. E fui desafiada a juntar-me a um ambientalista no Brasil incumbido de criar novos arranjos institucionais de governança no país para gerir as questões ambientais, de uma forma diferente da abordagem tradicional dos recursos naturais que era então usada. Foi um grande desafio e este homem mudou a minha vida. Chamava-se Paulo Nogueira Neto, um conservacionista famoso em todo o mundo. E eu estava também completamente envolvida na política ambiental e acreditava que a avaliação multilateral nos podia unir a todos. São grandes os desafios que enfrentámos e que ainda hoje enfrentamos, ao considerarmos as alterações climáticas como uma questão global, tal como a conservação da biodiversidade. E ao considerarmos também como o Brasil é um ativo mundial de elevada biodiversidade, não só na Amazónia, mas também em florestas tropicais como a Mata Atlântica e na diversidade de biomas (unidades biológicas ou espaços geográficos com caraterísticas específicas). E como podemos usar tudo isto da melhor maneira para promover o desenvolvimento.

Na sua carreira conseguiu que fosse atingida uma forte redução de 84% na desflorestação da Amazónia, a maior de sempre, tendo sido considerada a maior contribuição global para a redução de emissões. Pode falar mais sobre isto?

Olho para o passado e basta lembrar a minha trajetória profissional, quando estávamos no Brasil totalmente empenhados no combate à desflorestação na Amazónia. Estabelecemos o primeiro programa nacional contra o desmatamento e aprendi muito com esse processo. Fazia parte da equipa de fiscalização ambiental do IBAMA-Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis, que foi para a Amazónia enfrentar o desmatamento. E foi muito bom porque juntámos o ambiente com a ciência e a desflorestação com os incêndios. Havia uma necessidade de desenvolver o conhecimento científico e de ter uma aliança, e fui incumbida de negociar o primeiro memorando de entendimento entre o Brasil e os EUA para sabermos mais como gerir e combater os incêndios florestais. Ao longo da minha carreira tive a oportunidade de administrar em conjunto importantes programas internacionais, como o Programa Nacional do Ambiente, o primeiro com o Banco Mundial, e o famoso PPG7 – Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil, desenvolvido entre 1994 e 2009 em parceria com a comunidade internacional. E quando fui ministra do Meio Ambiente tive essa experiência no Brasil, em que aumentámos nos últimos 20 anos o nosso conhecimento para gerir melhor a fiscalização ambiental, e não só na Amazónia. Infelizmente, hoje a desflorestação na Amazónia aumentou 95% em 2019 e foi é baseada na ilegalidade, porque há um poderoso enquadramento legal no Brasil para lidar com este tipo de crimes ambientais.

"Durante a Covid-19 temos estado a aprender como precisamos de melhorar a relação entre a Humanidade e a Natureza"
d.r.

Mas há mesmo capacidade efetiva no Brasil para combater a desflorestação?

Sim, há capacidade plena, científica e institucional, para juntar instituições públicas no combate à desflorestação. Em 2009/2010 lançámos no Brasil a nossa primeira política nacional de alterações climáticas, para nos ajudar a conseguir melhores resultados. E tive a grande oportunidade de promover políticas públicas inovadoras como o programa de conservação da biodiversidade, que é o programa de áreas protegidas mais importante do mundo, envolvendo seis milhões de hectares (60.000 km2) na conservação da biodiversidade na região da Amazónia. Todas estas iniciativas fazem parte de um legado. E também promovemos a segunda e a terceira fase destas políticas para lidar melhor com a sociedade civil, através de novos modelos de governança que juntaram tudo. Portanto, não avançámos apenas contra as ilegalidades na floresta da Amazónia, mas usámos esses resultados para promover políticas públicas inovadoras sobre alterações climáticas e conservação da biodiversidade e também para abordar soluções relacionadas com a sustentabilidade global, quando o Brasil acolheu em 2012 no Rio de Janeiro a cimeira mundial “Rio +20”, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável. E também quando o Brasil desenvolveu políticas públicas inovadoras no acesso a recursos genéticos, adotou em 2010 o Protocolo de Nagoya sobre o mesmo assunto (negociado sob os auspícios da Convenção sobre a Diversidade Biológica), etc. Ou seja, faz sentido juntar as várias iniciativas, não podemos ter uma abordagem fragmentada para tratar de questões globais. Precisamos de perceber como se deve ligar tudo e desenvolver uma nova narrativa económica e social que faça sentido para a preservação do ambiente. Por isso estou muito honrada não só por trabalhar duramente nestes objetivos, mas também por receber o legado de outros parceiros que estiveram totalmente empenhados nos últimos 35 anos de história ambiental no Brasil, e por aprendermos como sociedade, como instituição pública, como governo empenhado nas questões ambientais e também na cooperação internacional, de estarmos juntos para enfrentar as ilegalidades, o crime ambiental, mas também para gerir uma agenda que faça sentido para o desenvolvimento de economias emergentes como a do Brasil.

Hoje falamos frequentemente sobre a importância de parar a desflorestação e conservar a Amazónia, mas raramente falamos sobre quem vive na região, cerca de 25 milhões de pessoas. Um estudo recente mostrou que os povos indígenas são essenciais para a conservação da biodiversidade, mas muitas vezes eles são deixados fora das principais discussões multilaterais sobre governança ambiental. Como é possível resolver esta questão socioambiental e incluir líderes indígenas na mesa das negociações para discutir a melhor forma de conservar essas áreas de elevada biodiversidade?

O Brasil tem uma grande diversidade de populações, e os povos indígenas fazem parte desta realidade e têm direitos, que são bem reconhecidos na nossa Constituição. Portanto, este é um problema conhecido. Então porque existe uma visão afunilada sobre ele? Precisamos de praticar o que a Constituição Federal estabeleceu e de reconhecer os seus direitos. Por isso não faz sentido quando há pessoas que estão contra isto, porque estão contra a lei. É o mesmo em todo o mundo, quando olhamos para outros países onde há povos indígenas não podemos negar os seus direitos. O que precisamos é de saber como trazer os líderes desses povos para as salas de negociação política, de modo a sentarem-se nas mesas redondas para discutirem os seus direitos e perspetivas. Mas eles não são os únicos que têm uma outra perspetiva que precisamos de juntar e conciliar. É um processo transformador saber ou aprender a ouvir outros líderes de organizações, usar o seu conhecimento para caminharmos juntos. E juntos tentarmos encontrar novas maneiras de promover o desenvolvimento em todo o mundo com uma abordagem inclusiva, começando a tentar abordar as informalidades e desigualdades para lidar melhor com os direitos políticos, e discutir com base no nosso conhecimento, na nossa ambição e nos nossos valores. Esta diversidade é o nosso poder, é o nosso ativo. Mas nós, infelizmente, não sabemos às vezes como gerir isto e como ouvir os povos indígenas. Não só para o fazermos através de audiências públicas, mas sabendo como poderemos construir novos processos a partir desta diversidade de stakeholders e de conhecimentos, de modo a tornarem-se ativos políticos. E em países como o Brasil, por exemplo, há atores deste processo que têm dificuldade em entender isto. Por isso, precisamos de uma forma pragmática e política de separar melhor quais são os problemas conhecidos e os novos problemas, quais são as questões concretas que devemos abordar e os caminhos concretos para avançarmos.

Falando de soluções, uma das propostas que tem emergido nos últimos anos é um novo Pacto Global para o Ambiente. Acha que as questões do ambiente e da sustentabilidade podem ser o terreno comum necessário para construir uma nova economia, uma sociedade mais justa e estabelecer um melhor enquadramento legal para o ambiente?

Claro, isso é algo muito fascinante, porque quando é suposto a Humanidade estar confiante de que é capaz de gerir tudo, surge este processo disruptivo provocado pela pandemia da Covid-19, que é uma crise sanitária e ambiental. E emergem novos problemas políticos globais gerados pela falta de água, por exemplo. Por isso, temos de saber como partilhar novos valores considerando que só temos um planeta, que não há um Planeta B. Precisamos de entender que a sustentabilidade é o único tema, o único objetivo, que hoje consegue juntar todos os países, toda a sociedade. Não é o comércio, as economias, a inovação, a paz ou as migrações.

E o que pode mudar com a emergência da pandemia da Covid-19?

Durante a Covid-19 estamos a aprender como precisamos de melhorar a relação entre a Humanidade e a Natureza. Se entendermos isto e o papel estratégico que a ciência tem desempenhado e vai estrategicamente desempenhar no futuro, se compreendermos como mobilizar o conhecimento científico juntamente com o nosso entendimento político e o nosso saber económico, e como gerir tudo, a Humanidade estará a aprender que precisa de saber mais sobre o modo como a Natureza liga todas as coisas e como todas as sociedades serão conectadas não apenas com base em ativos físicos, mas também considerando os desafios da economia da inovação nos próximos anos. É por isso que um Pacto Global para o Ambiente é a nova forma de mostrar não apenas o desafio que temos considerando a proteção ambiental global, mas também de partilhar a conexão entre diferentes sociedades e líderes. É assim que podemos partilhar responsabilidades-chave com protagonistas diferentes sem irmos contra conceitos antigos como a soberania nacional. A soberania nacional foi resolvida em 1972 na Declaração das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano, mais conhecida por Declaração de Estocolmo. Assim, quando temos alguns atores do processo que tentam voltar ao passado e destacar coisas que eram tão boas há cerca de 50 anos, não é isso que estamos a discutir, o que estamos a debater é como podemos promover a sociedade global. Ou seja, há uma diversidade de sociedades, realidades económicas e ambientais, mas temos apenas um planeta. E precisamos de compreender como tudo isto está ligado, como podemos partilhar responsabilidades, o que seria a nova expressão da cidadania global. E é por isso que debater um Pacto Global para o Ambiente faz sentido, um pacto que não coloque uns países contra os outros, porque não nos podemos esquecer que a sustentabilidade nos une, o que é muito importante para revigorar o sistema multilateral e entender melhor como a cooperação internacional avançará nos próximos anos. Por exemplo, como poderemos ter o sector privado como um ator central responsável e não um setor que vai esperar por decisões do Governo, porque a sociedade não pode mais funcionar assim. Aqui é também fundamental o papel dos media, da comunicação, da tecnologia, do conhecimento científico, das parcerias individuais, da nova geração, no desenvolvimento de uma nova forma de preservar a Natureza e o ambiente e usá-la para melhorar a qualidade de vida e o bem-estar das populações.

Não há um Planeta B e não vamos chegar a Marte tão cedo, por isso é imperativo que cuidemos melhor do nosso planeta. Neste momento há uma grande preocupação com a destruição da Amazónia, mas não há incentivos para conservar ou restaurar este recurso vital, ou outros. A Izabella Teixeira é uma das primeiras embaixadoras da Casa Comum de Humanidade. Como poderia o reconhecimento e a proteção legais do Sistema Terrestre ajudar a preservar a Amazónia e outros aspetos críticos do nosso clima?

Quando avançamos com o Pacto Global para o Ambiente e consideramos os ecossistemas que são tão importantes para o planeta, temos de entender as realidades nacionais. Por isso é muito importante, em primeiro lugar, ao apostarmos na agenda da conservação ou restauração dos ecossistemas, perceber o que aconteceu a nível nacional com as 25 milhões de pessoas que vivem na Amazónia. Mas infelizmente há uma guerra de narrativas. Por isso precisamos de entender os desafios da Amazónia considerando toda a Bacia do Rio Amazonas. A minha segunda recomendação é que, se consideramos o Sistema Terrestre, podemos usar melhor o conhecimento científico de forma a termos inputs robustos para o combinarmos com os requisitos legais sobre a proteção global, e precisamos de avançar na preservação deste sistema. Ou seja, quando trazemos uma estrutura legal ou um reconhecimento legal do Sistema Terrestre, precisamos de saber o que diz a ciência. E também quais são as lacunas e os trade-offs que temos hoje. Portanto, precisamos de compreender a diversidade da situação política e como podemos juntar líderes, organizações, para construir interesses comuns, convergências, cooperação, solidariedade e conhecimento internacional para apoiar soluções e preservar a Amazónia, o que significa considerar a situação diversa que temos lá, porque a Amazónia é necessária para manter o Sistema Terrestre.

"Se quisermos fazer negócios sustentáveis na Amazónia, precisamos de usar a proposta de proteção legal do Sistema Terrestre da Casa Comum da Humanidade"
d.r.

E a guerra de narrativas de que falou?

Quando entramos nesta realidade e tentamos entender a guerra de narrativas que referi antes devemos ir além disso, não podemos ficar pela política local mas perceber como podemos discutir qual é a nova agenda de cooperação internacional a desenvolver para apoiar situações como a da Amazónia no Brasil, o que será uma boa contribuição estratégica para mudar o quadro que temos hoje. Portanto, o reconhecimento e a proteção legal do Sistema Terrestre devem ser usados ​​para abordar a solução de que precisamos. E para tornar esta solução permanente, resiliente. Mas quando gerimos a justiça ambiental e social, precisamos de usar estes caminhos de uma forma inovadora, de modo a resolvermos os problemas de forma permanente. Temos de lutar contra a pobreza e a desigualdade social, mas para isso precisamos de reconhecer os direitos dos povos indígenas e de aceitar que eles gostam de viver de uma forma inovadora. Se quisermos ter negócios sustentáveis na Amazónia, precisamos de desenvolver novos modelos de negócio, porque não se baseiam nas formas tradicionais. E o mercado internacional deve acolhê-los e pagar por isso. Em suma, precisamos de usar a proposta de proteção legal do Sistema Terrestre defendida pela Casa Comum da Humanidade. É uma voz importante a nível internacional, mas também para reconhecer o desafio que temos, por exemplo, na Bacia do Rio Congo, na Indonésia e nas florestas da bacia do Rio Mekong, no Sudeste Asiático. E obviamente precisamos de saber como a restauração dos ecossistemas pode desempenhar um papel importante para criar valor na preservação do ambiente e da floresta. Não é apenas um dos lados da moeda, temos dois lados e precisamos de compreender como esta iniciativa da Casa Comum da Humanidade nos ajudará não só a preservar o aspeto crítico do nosso clima, etc., mas também a entender como podemos atuar numa nova direção, de uma forma inclusiva, aproximando as pessoas e compreendendo a realidade natural, porque elas não pensam da mesma maneira em todo o Mundo, mesmo entre os países em desenvolvimento. Quando discutimos, por exemplo, o chamado Sul Global, a realidade é totalmente diferente nos desafios que temos no Brasil ou na África do Sul. Mas estamos juntos num grupo básico de luta contra as alterações climáticas. Por isso é fascinante termos também o grupo de economias emergentes dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) e o G20 (grupo das 19 maiores economias do Mundo mais a UE). Há na verdade uma realidade diferente, mas como podemos unir as pessoas? Se formos capazes de perceber os interesses comuns, se conseguirmos encontrar uma maneira de juntar as pessoas e os seus líderes com base em regiões comuns, se tivermos novos caminhos para a convergência, e tudo isto baseado em soluções para os nossos problemas. O desafio para enfrentar os problemas na Amazónia, por exemplo, passa por compreender que o crime ambiental precisa de ser enfrentado e combatido através da fiscalização ambiental, da aplicação da lei.

Mas essa visão não envolve todo o problema.

Pois não, o que eu defendo é mais do que isso, é debater como podemos usar a lei para promover uma nova forma de reunir as pessoas e as organizações e partilhar responsabilidades para proteger o Sistema Terrestre. Portanto, temos problemas conhecidos de um lado e novos problemas de outros lados. E a Casa Comum da Humanidade está a tentar, considerando o guarda-chuva de um novo Pacto Global para o Ambiente, trazer decisões e agendas de discussão de forma inovadora, de tal maneira que se tivermos uma compreensão comum sobre tudo isto, provavelmente conseguimos juntar líderes e organizações. E faz sentido no futuro ter a proteção do Sistema Terrestre com responsabilidade partilhada, com uma nova compreensão política da sociedade global e não apenas dos governos ou do setor público, isto é, considerando o desafio de podermos mobilizar diferentes nações juntas. E isto para mim é fascinante, porque será provavelmente uma nova forma de promover a política em todo o Mundo e de compreender que a solução não virá de uma só instituição mas de diferentes pessoas, líderes, sociedades ou instituições que têm a consciência do desafio de preservar o Sistema Terrestre, de estarmos juntos na promoção do desenvolvimento sustentável da Humanidade.

Como encara o facto de ser uma embaixadora da Casa Comum da Humanidade?

É uma tarefa desafiadora, não apenas para mim, mas para os cidadãos de todo o mundo. Precisamos de desafiar as pessoas a saírem de sua zona de conforto. Precisamos de estar “fora da caixa” e espero que a nova caixa possa ser verde.

Entrevista feita por Kimberly White, jornalista e editora da agência norte-americana de notícias de ambiente e de desenvolvimento sustentável The Planetary Press

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