O advogado da mulher de Matosinhos que foi agredida pelo marido quando estava grávida e chegou a ficar surda por causa da pancada de que foi vítima, diz que as ameaças do agressor continuaram já depois do processo judicial chegar ao fim: “Vou participar os factos e depois é o Ministério Público que decide o que fazer. Vou levar ao processo o conhecimento dos factos. Em teoria, poderá ser uma violação da pena suspensa que foi aplicada”, explica Álvaro Moreira.
A vítima, uma mulher de 49 anos, teve de sair da casa onde vivia e pedir outra à Câmara Municipal. “Está impedida de ver os netos devido às ameaças que o ex-marido continua a fazer, agora por interposta pessoa”, frisa o advogado. “Está privada da sua liberdade em 90%”, frisa o advogado.
O agressor tem tentado saber a nova morada da vítima e conseguiu descobrir o novo local de emprego, obrigando a vítima a abandoná-lo.
Apesar de o tribunal de primeira instância — que condenou o agressor a três anos de prisão, com pena suspensa, e a uma pena acessória de vigilância através de pulseira eletrónica, para garantir que não se aproximava da ex-mulher — “não ter nenhuma dúvida” sobre a veracidade dos factos relatados pela vítima, Neto Moura, juiz desembargador do Tribunal da Relação do Porto, retirou a vigilância eletrónica.
Neto Moura considerou que o uso da pulseira eletrónica não ficou justificado na sentença de primeira instância e nesses casos a lei determina que o arguido tem de concordar com o uso da pulseira, o que não se verificou neste caso. E fez considerações sobre a violência doméstica.
“Se durante muito tempo e até há uns anos, a vítima de violência doméstica sentia que o mais provável é que a sua denúncia acabasse em nada por não ter quem atestasse as agressões e às suas declarações não era dado o devido relevo probatório, a verdade é que, nos últimos tempos, têm-se acentuado os sinais de uma tendência de sentido contrário, em que a mais banal discussão ou desavença entre marido/companheiro/namorado/mulher/companheira/namorada é logo considerada violência doméstica e o suposto agressor (geralmente, o marido ou companheiro) é diabolizado e nenhum crédito pode ser-lhe reconhecido”, lê-se no acórdão de 31 de outubro de 2018.
Para Álvaro Moreira, o desembargador deu mais importância à forma do que à substância. E considera que Neto Moura não avaliou o verdadeiro perigo da situação.
O Conselho Superior da Magistratura considera que a Constituição impede novo procedimento disciplinar ao juiz Neto Moura. O desembargador já tinha sido condenado a uma pena de advertência registada por ter citado a Bíblia e feito considerações sobre o adultério das mulheres num acórdão no qual manteve a condenação a uma pena suspensa a dois homens que tinham agredido uma mulher. Foi a primeira vez que um juiz foi punido pelo que escreveu num acórdão.
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