Nos idos de 80 e 90 do século passado, o vinho português (tranquilo) tinha um rei: o tinto. Portugal era, dizia-se à boca cheia, um país de tintos. O reinado começava nos Verdes, onde o tinto tinha grande apreço pelas gentes locais e prolongava-se alegremente de norte para sul. A bem-dizer, apenas duas regiões se batiam pelos brancos: Bucelas, por obrigação, uma vez que não havia (tal como hoje não há) tintos na região com direito à Denominação Bucelas, e o Ribatejo, por tradição, onde a casta Fernão Pires era rainha. Excluindo então estas duas zonas (e Bucelas é uma pequeníssima região), o país era de tintos. É verdade que a zona saloia era famosa desde o tempo de Eça de Queirós, que lhe celebrava as virtudes; no fundo, era mergulhar no país rural a pouca distância de Lisboa e o passeio às hortas era momento certo de prazer dominical para os lisboetas. Esse passeio transformou-se mais tarde no conhecido “passeio dos tristes”: levava-se o carro cheio de família até Cascais e depois, pela bordadura da serra, até Colares, com regresso a casa com nova alma e ar puro nos pulmões. Nesses tempos ninguém se lembrava de brancos, ou melhor, só ocasionalmente: o Douro era terra de uvas para Porto, sobejando alguns vinhos da Real Vinícola que faziam figura de extraterrestres num país que valorizava muito mais os tintos.
Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt