
“O Bebedor de Vinho de Palma”, romance de 1952 do nigeriano Amos Tutuola, é uma obra-prima absoluta da literatura africana
“O Bebedor de Vinho de Palma”, romance de 1952 do nigeriano Amos Tutuola, é uma obra-prima absoluta da literatura africana
Quando foi publicado pela primeira vez, em 1952, “O Bebedor de Vinho de Palma”, de Amos Tutuola, mereceu elogios de escritores e críticos ocidentais — de T.S. Eliot (editor entusiasmado da obra na Faber & Faber) a Dylan Thomas — que viam nele uma pura ficção africana, desligada de quaisquer modelos ou formas narrativas impostas, do exterior, pelas tradições literárias europeias. Na Nigéria, porém, Tutuola era olhado com bastante desconfiança, fosse por escrever num inglês tosco e com erros (não dominava a língua e só tivera seis anos de instrução formal), fosse por cerzir à sua maneira, de forma muito livre, histórias do folclore iorubá. Temia-se, no fundo, que o livro reforçasse os estereótipos sobre a cultura africana, entendida como primária, pouco refinada, ingénua, presa a superstições e atavismos. Entretanto, muitos autores vieram alargar a literatura nigeriana noutras direções (Chinua Achebe, Wole Soyinka, Ben Okri, Chimamanda Ngozi Adichie, Teju Cole) e o romance de estreia de Tutuola passou a ser visto como aquilo que essencialmente é: um delirante exercício de imaginação, que se alimenta da potência das narrativas iorubás, sim, mas para criar o seu próprio universo, a sua lógica interna, a sua linguagem, o seu ritmo e a sua ordem desordenada, de uma espantosa coesão.
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