Há na minha aldeia um monte, encimado por um marco militar, a que chamam “talefe”. Durante anos vivi intrigado pela sua etimologia, que adivinhava ser árabe, ou talvez hebraica, ou pré-romana, e enterrada num passado remoto. Afinal, a explicação era bem mais recente — e fascinante — e estava mesmo à frente dos meus olhos. “Talefe” tinha na sua origem “telégrafo”, transformado em “talégrafo” pela boca dos meus conterrâneos e depois, de corruptela em corruptela, até se contrair em “talefe”. E o marco militar era a chave do enigma; mais do que um sinal geográfico, ele fazia parte de uma rede de marcos que permitia a transmissão de mensagens através de um sistema de ponteiros, bandeiras ou semáforos. Os franceses tinham um desses sistemas no tempo das guerras peninsulares, tal como os suecos e os britânicos tinham também os seus sistemas próprios — e os portugueses também, usando primeiro um telégrafo de ponteiro, e depois de postigos, inventado por um português de origem italiana, Francisco Antonio Ciera. Observando as posições das bandeiras, ponteiros, postigos ou as luzes dos semáforos por meio de um binóculo ou telescópio, e repetindo os sinais visuais através de uma cadeia de marcos estendida ao longo de centenas ou milhares de quilómetros, foi possível pela primeira vez emitir uma mensagem sem deslocação física do mensageiro há mais de duzentos anos.
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