
Espalhem a notícia: há 170 imagens de Eduardo Gageiro para ver até maio, na Cordoaria Nacional
Espalhem a notícia: há 170 imagens de Eduardo Gageiro para ver até maio, na Cordoaria Nacional
Jornalista
Não se sabia quando, como ou quem. Esperava-se a notícia de um golpe de Estado. Aquela primavera de 1974 arrastava-se em tons de crise, para o ditador Marcello Caetano. E o jornal “Diário de Lisboa” publicou a 3 de abril a pequena crónica “Um campo de neve todos os dias”, do jornalista Pedro Alvim. Para os censores, aquela seria prosa inócua sobre jornalismo, desencantada para resolver a falta de assunto. Já para quem tivesse o treino de ler nas entrelinhas, lá estava aquela frase inicial inteira e limpa: “Estou aqui à espera da notícia.” Sim, corria muito mal a guerra nas várias frentes africanas. Aliás, pode uma guerra correr bem? Crescia o descontentamento entre os militares, acumulava-se o sofrimento nas famílias afetadas de forma direta. E além do esforço de guerra, a economia portuguesa precisava de inventar forças para enfrentar a conjuntura mundial, com os preços do petróleo a roubar margem de manobra às pessoas, às empresas e aos Estados. Enquanto o regime fascista se preparava para dar o berro, no mesmo jornal faziam-se reportagens sobre o preço do peixe. Como se fosse um fenómeno natural, desligado da política. O último álbum gravado por Zeca Afonso antes do 25 de abril chama-se “Venham mais Cinco”. E inclui a canção ‘Nefretite não Tinha Papeira’, onde se alude aos preços das arábias, terminando com estes versos: “Os sheikes israelitas/ Já que estou com a mão na massa/ Lembram-me os sheikes das fitas/ Que dão porrada a quem passa”.
Aproximam-se os 50 anos da revolução que trouxe a democracia a Portugal. E somos confrontados com muitas imagens daquele “dia inicial inteiro e limpo”, relatado por Sophia de Mello Breyner. Naquele dia “emergimos da noite e do silêncio”. E esta é uma imagem que dá a noção da originalidade da revolução portuguesa. A qualidade popular deste dia inicial nasceu da desobediência, quando o que poderia ser apenas um golpe militar se transformou numa revolução também do chamado povo. O autor desta imagem chama-se Eduardo Gageiro, tem 88 anos e é um enorme repórter fotográfico. A partir de hoje e até 5 de maio, podemos ver em Lisboa 170 imagens de Gageiro, na exposição “Factum”, no Torreão Nascente da Cordoaria Nacional. Espalhem a notícia.
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