Marcelo Rebelo de Sousa, criticou esta quarta-feira o Presidente norte-americano, Donald Trump, pelas regras da Casa Branca para a comunicação social e alertou para "o deslizar da democracia para a ditadura". O Presidente da República falava na Casa da Imprensa, em Lisboa, na sessão de abertura de um debate sobre a Lei de Imprensa de 1975, publicada há 50 anos, que consagrou a proibição de qualquer forma de censura. Uma ocasião em que também defendeu que o escrutínio da comunicação social é um preço a pagar por quem exerce cargos políticos, referindo que, "juntamente com coisas que são agradáveis, há coisas desagradáveis".
"Não se sabendo o que é a ditadura, não se compreende o risco da ditadura e não se compreende o risco das rampas deslizantes das democracias para as ditaduras. E, no entanto, hoje basta abrir as televisões -- já não falo nas redes sociais -- para assistirmos em países democráticos dos mais fortes ao que é o deslizar da democracia pela ditadura", afirmou o Presidente da República. Referindo-se a Donald Trump, Marcelo Rebelo de Sousa acrescentou: "Quando o Presidente da mais antiga e mais reputada como forte democracia acaba de hoje fazer saber quais são os jornalistas autorizados a colocarem-lhe perguntas nas conferências de imprensa, nos encontros, no centro do poder, está tudo dito". "Está tudo dito", repetiu.
Marcelo criticou as novas regras da Casa Branca para a comunicação social, comentando que "só falta, verdadeiramente, que o chefe do executivo desse país faça as perguntas" ele mesmo, para então "dar as respostas que quer dar". Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, "a partir deste momento, ninguém, verdadeiramente, respeitando os códigos éticos, se sente bem participando numa conferência de imprensa, num encontro com responsáveis do poder de uma democracia, sabendo que só ele, e não os outros que estão na sala, têm autorização para colocar perguntas".
"Os jornalistas passam a ser invisíveis. Podem estar lá, mas é figura de corpo presente. Não estão", considerou. A Casa Branca anunciou que vai passar a decidir que jornalistas podem fazer perguntas ao Presidente norte-americano, Donald Trump, tarefa que até agora cabia exclusivamente à associação de correspondentes destacados na residência presidencial.
No fim da sessão de abertura deste debate sobre a Lei de Imprensa de 1975, promovido pela Comissão Comemorativa dos 50 Anos do 25 de Abril, Marcelo Rebelo de Sousa foi questionado pela comunicação social sobre as críticas que tem feito a Donald Trump. Na terça-feira, em resposta aos jornalistas, no Palácio de Belém, o chefe de Estado questionou se os Estados Unidos da América são "aliados ou antigos aliados", considerando que "nunca se percebe bem, com esta nova administração", e que é preciso também "perceber se a NATO é para levar a sério ou não".
Marcelo Rebelo de Sousa respondeu que irá desenvolver esse tema intervenção que fará na quinta-feira durante o jantar que irá oferecer ao Presidente francês, Emmanuel Macron, no Palácio Nacional da Ajuda, durante a sua visita de Estado a Portugal. "Eu amanhã explico desenvolvidamente, e estando ali o Presidente Macron, que tem acompanhado isso e tem tido um papel importante, como é que eu vejo as relações entre os Estados Unidos e a Europa, na linha do que hoje voltei a aflorar", disse.
“Comunicação social tem papel a desempenhar”
Também em respostas no fim do debate, o Presidente da República defendeu que o escrutínio da comunicação social é um preço a pagar por quem exerce cargos políticos, referindo que, "juntamente com coisas que são agradáveis, há coisas desagradáveis". Interrogado se considera que os jornalistas estão a pressionar o Governo, a propósito da empresa da família do primeiro-ministro, Luís Montenegro, e de governantes com empresas imobiliárias, o chefe de Estado respondeu que não iria comentar "casos concretos" relativos "a questões políticas e a notícias e especulações e tal".
Em seguida, o Presidente da República defendeu que "a comunicação social tem um papel a desempenhar", que pode ser "desagradável para os titulares de poderes políticos, mas é um preço". Marcelo Rebelo de Sousa invocou a sua experiência: "Esse papel que desempenha muitas vezes é desagradável, e todos sabemos, isso já me aconteceu uma vez, duas vezes, cem vezes, mil vezes".
"Quem escolhe um certo tipo de responsabilidades sabe que, juntamente com coisas que são agradáveis, há coisas desagradáveis, coisas que considera justas e coisas que considera injustas. Isso é o pluralismo próprio da vida democrática", reforçou.
Interrogado se o primeiro-ministro deve vir prestar explicações sobre esta matéria, o chefe de Estado recusou responder, "uma vez que há quem tenha suscitado isso no parlamento e possa suscitar mais vezes, no parlamento ou fora do parlamento". "Portanto, deixo aos protagonistas o formularem os seus juízos e dizerem aquilo que entendem que devem dizer, e pedirem mais, se entenderem que devem pedir mais", acrescentou.
Nesta ocasião, Marcelo Rebelo de Sousa foi também interrogado sobre a chamada lei dos solos, tendo em conta as declarações que fez na terça-feira questionando a eficácia da sua aplicação em ano de eleições autárquicas, que se irão realizar entre setembro e outubro. Sem nada adiantar quanto à sua posição, o Presidente da República referiu que o parlamento "está a reapreciar se muda ou não alguma coisa nessa matéria" e poderá aprovar "um novo diploma", que lhe será submetido. "Vamos esperar", aconselhou.
Antes, repetiu que vários autarcas lhe falaram no assunto dizendo que "era um mau ano" para aplicarem a lei, que lhes atribui a decisão de "avançar ou não com determinadas escolhas em matéria de ordenamento do território ou urbanísticas", por ser um ano eleitoral. "Devo dizer, confesso, que não tinha passado isto pela cabeça, mas tem lógica aquilo que disseram. É verdade que eles são livres de atuar ou não atuar. Ali ninguém impõe que devam atuar ou não", acrescentou Marcelo Rebelo de Sousa.
O decreto-lei que alterou o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, a chamada lei dos solos, foi aprovado pelo Governo e promulgado pelo Presidente da República no fim do ano passado. Mas os partidos da oposição pediram a sua apreciação parlamentar e esta quarta-feira aprovaram na especialidade alterações acordadas entre o PS e o PSD.
O chefe de Estado voltou também a referir que estão em causa fundos europeus, não do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), mas "sobretudo fundos do Portugal 2030, que, embora tendo um horizonte um bocadinho maior, é também muito urgente".