PS chumba todas as propostas da oposição sobre Saúde
Nuno Fox
Num debate sem nenhum membro do Governo, o PSD acusou os socialistas de “má gestão” e apresentou cinco projetos de resolução para uma maior “eficácia” e “rapidez” do SNS. O “mais de um milhão” de pessoas sem médico de família foi uma das críticas mais repetidas pelos partidos. O PS respondeu com números do SNS, mas acabou a chumbar todas as propostas do PSD, PCP, Chega, Livre e PAN
Menos de uma semana depois do debate requerido pela Iniciativa Liberal sobre o SNS, o tema da saúde voltou ao Parlamento. No segundo dia de greves dos médicos, foi o PSD que defendeu cinco projetos de resolução que incluíam o acesso a médico de família “para todos”, menos “tempo de espera” para cirurgias, consultas e exames, mais “acesso” a “cuidados continuados” e “medicamentos” e um “reforço do SNS”. Durante a apresentação destas medidas, Joaquim Miranda Sarmento criticou a “forte degradação”, “falta de reformas”, “má gestão” e “desinvestimento” no SNS durante a governação socialista. Também o PCP e o Bloco pediram mais investimento no SNS e lembraram o “encerramento” das maternidades. Já os liberais criticaram o Governo pela “ausência” no debate que transparece a “pouca importância” dada ao tema. Mesmo depois de Miranda Sarmento ter apelado à discussão na especialidade para não “defraudar as espectativas dos portugueses”, o PS chumbou todas as propostas do PSD, assim como do PCP, Chega, Livre e PAN. O líder parlamentar social-democrata lamentou o “rolo compressor” da maioria absoluta em declarações aos jornalistas após o debate.
Com a bancada do Governo vazia, coube aos deputados socialistas saírem em defesa das políticas do Governo. Maria Antónia Almeida Santos, do PS, começou por defender que “muitas das medidas” apresentas pelos sociais-democratas já “estão a ser executadas” pelo executivo de António Costa. Entre elas, a socialista nomeou a “reforma” no SNS através dos fundos do PRR que contribuiu para “388 balcões do SNS 24 em todos o país”, a “desburocratização” que permitiu o “alargamento” do prazo de “receitas, exames e baixas” e a “valorização dos recursos humanos” que contou com mais “três mil e 691 trabalhadores” em maio de 2023 comparativamente com 2015. “Chegam [número de profissionais] para dar uma resposta atempada? Não, mas é para isso que vamos continuar a lutar”. Contudo, também há “divergências gritantes” entre as propostas do PSD e do PS, chamou à atenção a deputada socialista, como a medida de um “médico de família digital para três milhões de famílias”. “Uma espécie de chat-GPT", ironizou.
Mesmo perante a apresentação destes números, a oposição não diminuiu a intensidade das críticas às opções socialistas na saúde. A falta de médicos de família, o encerramento das maternidades - que vão continuar a funcionar em regime de rotatividade durante o verão - e a morte de um utente às portas de um hospital em Serpa foram alguns dos casos utilizados pelos partidos para exigir esclarecimentos ao Governo.
O fantasma da promessa de Costa e a discordância nos profissionais cubanos
Poucos foram os partidos da oposição que não lembraram a promessa feita por António Costa em 2016 que continua por cumprir. Miranda Sarmento foi um deles: “lembramos a promessa de António Costa de que em 2017 todos os portugueses teriam médico de família”. O líder parlamentar do PSD respondeu ainda às críticas de semelhanças entre as propostas do seu partido e as do PS com uma “capacidade de execução diferente” por parte do PSD.
Também o PCP, pela voz de João Dias, lembrou que existem “mais de um milhão de pessoas” sem médico de família só na zona de Lisboa e Vale do Tejo onde “o privado cresce a cada dia”. “O que o senhor defende não resulta e não é a melhor resposta para Portugal”, atirou o comunista em direção à bancada do PS. A poucos lugares de distância, Rui Tavares defendeu um “investimento adequado” no SNS com “residências para médicos” ou a “facilitação do trabalho das juntas médicas”. “Os portugueses preferem melhorar o que já têm do que dar um salto no escuro para um sistema misto de saúde [que inclua serviço público e privado]. Em nenhum momento do dia troco o SNS com taxas de vacinação de 100% por sistemas mistos que tem taxas de 28%”, defendeu o deputado único do Livre.
A vontade do Governo contratar cerca de 300 médicos de Cuba para trabalharem no SNS durante três anos, conhecida no início do mês, também animou os ânimos das bancadas. O PSD mostrou-se contra a ideia, já a Iniciativa Liberal e o Chega pediram justificações sobre as relações com um regime cubano “autocrático”. “Propomos dar medico de família num curto prazo recorrendo a toda a capacidade do SNS, sem ter de recorrer à mão de obra de Cuba”, garantiu Rui Cristina do PSD. Pelo contrário, o líder parlamentar liberal mostrou-se a favor do reforço dos médicos “independentemente da sua nacionalidade”. Contudo, Rodrigo Saraiva levantou dúvidas sobre as relações entre o estado português e o cubano neste negócio. “Esta contratação é entre Estados ou com uma empresa cubana privada? Os médicos vão receber o que o estado português vai pagar ou o regime cubano fica com 20%? O Governo português tem garantia que o Governo cubano não vai fazer chantagem com médicos pelas famílias que lá ficam? Isto é uma questão de direitos humanos”, lançou Rodrigo Saraiva para uma bancada do Governo que permaneceu vazia até ao fim do debate. Pedro Frazão, deputado do Chega, foi mais longe nas críticas: "O PS tem de encher a cara de vergonha por se alinhar com regimes autoritários”.
Numa interpelação à mesa, Eurico Brilhante Dias lembrou o ex-autarca e atual deputado do PSD que levava “munícipes a Cuba” para operações de oftalmologia. No momento de maior animação do plenário, Luís Gomes defendeu que se “orgulha” de ter lavado mais de “300 pessoas” a Cuba que estavam há “seis anos” à espera de uma consulta de oftalmologia. O ex-autarca social-democrata, que vai em breve deixar o Parlamento, foi aplaudido de pé por vários colegas de partido.
Do encerramento das maternidades à morte no hospital de Serpa
Embora a questão do encerramento de maternidades não fizesse parte das recomendações do PSD ao Governo, o problema foi adereçado no plenário. Pedro Filipe Soares elogiou o tempo em que as “maternidades não fechavam de três em três meses” e acusou o ministro da Saúde, Manuel Pizarro, de ser “porta-voz” do PSD depois dos elogios dados por Luís Montenegro. “O SNS está pior, mas não era de esperar outra coisa quando executam ideias próximas do PSD”, atirou o líder parlamentar do Bloco. Também o Chega, criticou o “calendário de bolso” com que as grávidas são obrigadas a andar por não saberem “onde se dirigir”. “Santarém ou é longe para o aeroporto, como diz João Galamba, ou é perto para as grávidas irem ter os bebés, como diz Pizarro?”, questionou Pedro Frazão. Para o PSD, a situação das grávidas que “não sabem onde vão ter o bebé” mostra também um SNS que os “portugueses não precisam e não merecem”.
André Ventura foi o primeiro a trazer ao debate a morte de um utente à porta do hospital de Serpa, que tinha as urgências encerradas entre a meia-noite e as oito da manhã. “Há cinco dias um homem morreu em Serpa. Este é o SNS que o PS e a esquerda gostam”, disse o líder do Chega. Para Pedro Filipe Soares essa situação ocorreu num “hospital entregue pelo PSD/CDS a privados” que “incumpriam contratos” e que “não deram resposta” ao cidadão. “É este o resultado de entregar a privados: pessoas desprotegidas”, criticou o líder parlamentar bloquista. Ainda sobre este tema, Pedro Filipe Soares acusou o Governo de fugir às responsabilidades por não “fiscalizar” estas situações.