Política

Colisão de leis leva emigrantes a resistir ao envio de cópia do Cartão de Cidadão com boletim de voto 

Presidente do Conselho Regional das Comunidades Portuguesas na Europa justifica ausência de cópia de documentos de identificação dos eleitores nos votos por via postal devido a diretiva europeia de proteção de dados e à confusão gerada pela lei que criou o Cartão de Cidadão. Pedro Rupio apela a campanha de informação antes da repetição das Legislativas no círculo da Europa

O líder do Conselho Regional das Comunidades Portuguesas na Europa (CRCPE) pede à Secretaria de Estado da Administração Interna e à Comissão Nacional de Eleições que promovam “largas e esclarecedoras” campanhas de informação junto dos eleitores emigrantes, antes da repetição do ato eleitoral de 23 e 13 de março para evitar risco de altas taxas de abstenção ou anulação de votos por falta de cópia de Cartão de Cidadão, obrigatória pela Lei Eleitoral.

O apelo preventivo de Pedro Rupio deve-se ao “apertado contrarrelógio” para assegurar o voto postal dos emigrantes, ato que espera sem incidentes que possam ditar nova anulação “de milhares de votos” no círculo da Europa. O presidente da CRCPE, com sede em Bruxelas, justifica a resistência de muitos eleitores no envio de cópia de Cartão de Cidadão com a confusão gerada pela Lei nº 7 de 2007, que criou o cartão de cidadão e rege a sua utilização. Em causa está o artigo 5º que “interdita a reprodução do cartão de cidadão em fotocópia ou qualquer outro meio sem consentimento do titular, salvo nos casos expressamente previstos na lei ou mediante decisão de autoridade judiciária”. 
“Ou seja, os eleitores receiam estar a cometer alguma ilegalidade se envierem fotocópia do Cartão de Cidadão no envelope com o boletim de voto ou que a reprodução do documento de identificação seja passível de ser partilhada”, refere ao Expresso Pedro Rupio, que ainda aponta ao Regulamento Geral sobre Proteção de Dados da União Europeia como outro factor de conflitos.

O representante da diáspora europeia lembra que a diretiva europeia define um conjunto de regras de proteção de dados, aplicáveis não só a empresas, mas também no sentido de as pessoas “terem um maior controlo sobre os seus dados individuais”. “Há aqui uma colisão de leis, isto é, por um lado exige-se que o envio cópia de identificação do eleitor no voto por correspondência, por outro proíbe-se a reprodução do cartão de cidadão, salvo determinadas circunstâncias, a que soma os crescentes alertas de proteção de dados pessoais”, salienta Rupio.
Após a anulação de mais de 80% dos votos do círculo da Europa, o Conselho Regional das Comunidades enviou, este sábado, em nome dos eleitores da diáspora, uma moção a Berta Nunes, secretária de Estado das Comunidades Portuguesesas, com cópia à ministra da Administração Interna, Francisca Van Dunem, titulada ‘Quem quer votar tem que contar’, onde se apela a que os boletins de voto cheguem aos eleitores da Europa “nos primeiríssimos dias de março” e se promova uma “larga campanha” nos Media e junto de associações de emigrantes.  
Na missiva é referido que “os portugueses residentes no estrangeiro acolheram com agradável surpresa a deliberação do Tribunal Constitucional” de determinar a repetição das eleições legislativas, sinal de que não foram “esquecidos” pelas autoridades competentes, sentimento “muitas vezes” recorrente.
“Uma decisão com alta carga simbólica acompanhada por uma vaga de solidariedade por parte da sociedade civil portuguesa que se focou no voto dos emigrantes, vistos como portugueses com direito à sua voz”, sustenta a moção. No documento, recorda-se que a CRCPE tem feito “múltiplas propostas” para melhorar a participação cívica e política dos emigrantes residentes no estrangeiro, recomendando, entre outras medidas, “a ampliação e a uniformização das modalidades de voto” para todos os atos eleitorais”.
Na moção, alerta-se para o facto de os eleitores residentes no estrangeiro apenas poderem votar para as Presidenciais presencialmente, ao contrário do que sucede nas Legislativas em que os eleitores da diáspora o podem fazer em urna ou via postal. É ainda sublinhado que a problemática dos votos anulados está longe de ser novidade, já identificada em 1995 – ou seja, “há 27 anos” -, em 2009 ou 2019.

“A resolução destas anomalias foi constantemente adiada pela Assembleia da República até ganhar as proporções desmesuradas destas últimas legislativas”, adverte a moção, onde se pede que a Lei Eleitoral seja clarificada, dado que “pouco evoluiu desde 1976”, ano em que se determinou que a diáspora portuguesa somente poderia eleger um máximo de quatro deputados em 230.

Além de preconizar voto eletrónico, Pedro Rupio, tal como a comunidade emigrante, defende que deveria existir uma maior proporcionalidade na eleição de deputados nos círculos não nacionais, de forma a assegurar uma “maior representatividade política” dos eleitores a residir no estrangeiro. “Sem uma maior proporcionalidade, os emigrantes sentem que a sua vez se perde no Parlamento”, adianta.

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