Eram duas peças centrais do gabinete de Pedro Nuno Santos no Ministério das Infraestruturas: Hugo Mendes, o ex-secretário de Estado cuja demissão em dezembro arrastou o próprio ministro, e Frederico Pinheiro, o adjunto que ficou com Galamba mas acabou demitido na sequência da noite de confrontos em pleno ministério. Em conjunto, preparam-se para lançar um livro que se apresenta como uma prestação de contas sobre a condução política do caso TAP. Mas será mais do que isso.
Se o título já indica que se propõem contar o que se passou dentro do Governo (“Patos desalinhados não voam — por dentro da viagem mais turbulenta da TAP”), a frase que ficou na capa desenhada pela editora de Carlos Vaz Marques, a Zigurate, desvenda um pouco mais: “Estiveram no olho do furacão e foram muitos os que tentaram liquidá-los publicamente. Prestam agora contas, desmontando equívocos e atropelos da feroz controvérsia política em torno da TAP.”
A palavra a reter é “atropelos”. E nem todos foram externos: segundo apurou o Expresso, na obra são feitas críticas a António Costa e ao papel que foi tendo na gestão política da companhia aérea. Mas haverá também a denúncia de falta de apoio e alinhamento dentro do Executivo sobre um dos assuntos mais sensíveis da atualidade.
Reconhecendo que o ministério que representavam — e cuja cara era Pedro Nuno Santos — não foi capaz de transmitir uma narrativa vencedora perante a opinião pública (contra uma outra, pró-privatização, mais imediata e emocional), os autores assumem-se vencidos mas não convencidos. Pelo que do livro resulta também uma crítica ao processo de privatização da maioria do capital da TAP, desencadeado esta quinta-feira pelo Governo de que já não fazem parte.
Prometendo ser muito documentada, esta obra política do pedronunismo (que não foi escrita “por procuração”, afirmam os autores) dedica-se exclusivamente à TAP, deixando de fora os eventos nas Infraestruturas que acabaram por se tornar centrais na Comissão de Inquérito da primavera passada (esses ficam reduzidos a uma breve nota), procurando antes explicar todos os passos e decisões tomadas naquele período de mais de dois anos.
Hugo Mendes, o secretário de Estado que chegou a dizer à CEO da TAP para ter atenção a um pedido de mudança de voo do Presidente da República porque ele podia ser “o nosso maior aliado” mas também “o maior pesadelo”, e Frederico Pinheiro, o ex-adjunto que se viu envolvido em confrontos no Ministério de João Galamba, foram figuras centrais na comissão de inquérito à TAP, chegando mesmo a ser identificados como as duas únicas pessoas (a par de Pedro Nuno Santos) que tinham acesso ao plano de reestruturação da companhia aérea.
Nas longas audições no Parlamento, Pedro Nuno Santos recusou sempre falar sobre o plano de privatização que estava em marcha, e Hugo Mendes tentou desfazer a ideia de que o plano de reestruturação já previa uma privatização imposta pela Comissão Europeia. Ainda assim, sem uma privatização imposta, Hugo Mendes admitiria que sempre foi claro para o Governo que dificilmente a TAP se poderia manter sozinha, fora de um grande grupo.
Ainda assim, foi sempre visível o desconforto, tanto de Hugo Mendes como de Frederico Pinheiro, em relação a António Costa. O ex-adjunto chegou mesmo a admitir processar o primeiro-ministro e João Galamba, e Hugo Mendes mostrou-se irritado com as declarações de Costa sobre si próprio (“se soubesse, tê-lo-ia demitido na hora”): sem grandes palavras, Hugo Mendes lembrou que se foi membro do Governo foi porque o primeiro-ministro o quis lá.
O livro estará nas bancas no dia 9 de novembro, precisamente um mês depois de Pedro Nuno se estrear como comentador na SIC Notícias. Hugo Mendes e Frederico Pinheiro apresentarão a obra publicamente alguns dias depois.
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