“Trocámos as renováveis e o potencial de Sines por um prato de lentilhas.” PSD arrasa acordo para interligações energéticas
MIGUEL A. LOPES/ Lusa
Paulo Rangel considera que o acordo anunciado por Portugal, Espanha e França “prejudica o interesse nacional”. “Portugal ficou para trás”, avalia o vice-presidente social-democrata, que lança o apelo: “senhor primeiro-ministro, mostre-nos o acordo na íntegra”
Dois dias depois do acordo anunciado entre o Presidente francês e os primeiros-ministros espanhol e português, o PSD fala de “um mau acordo” em que “ganharam o nuclear e a França na eletricidade” e “ganharam a Espanha e o porto de Barcelona no gás”. “Portugal ficou para trás”, resumiu este sábado o primeiro vice-presidente do PSD. Em conferência de imprensa na sede nacional do partido, em Lisboa, Paulo Rangel adiantou que os sociais-democratas exigem conhecer o acordo “na íntegra” e irão promover “todas as diligências ao seu alcance na Assembleia da República e junto das instituições europeias”.
Foto publicada por António Costa no Twitter após um acordo que venceu a histórica resistência francesa sobre as interligações
O acordo “prejudica o interesse nacional” e, “em nome de Portugal, António Costa nunca o devia ter aceitado”, sublinhou. “Num filme parecido com o que vimos recentemente com o corte de pensões de mil milhões de euros, o primeiro-ministro voltou a aparecer com anúncios triunfais de supostos benefícios, enquanto omitia as perdas graves que este acordo tem para Portugal. É inaceitável que diante de um insucesso, agora evidente, o primeiro-ministro tenha exibido um tal triunfalismo”, acrescentou.
Rangel disse mesmo que “uma encenação desta natureza, tal como a do corte de pensões, desqualifica a democracia e fomenta os populismos”. O vice-presidente do PSD explicou ainda que o seu partido considera este “um mau acordo para Portugal por duas razões fundamentais”. Primeiro, “Portugal ficou pior porque caíram os compromissos que existiam – firmes, calendarizados e financiados desde 2014 – para a construção de duas interligações elétricas nos Pirenéus. Mais: “esta troca de gasodutos vai secundarizar o terminal de Sines”, adiantando que, sendo “útil” o transporte de gás importado, é “muito menos interessante” para Portugal do que para Espanha. Rangel acusou ainda o Governo de Costa de, durante sete anos, ter feito “muito pouco” e “nada” ter conseguido nas interligações elétricas.
E o que se tinha conseguido numa “negociação difícil” há oito anos, durante o Governo liderado por Passos Coelho, “foi deitado fora”, criticou, “contentando-se” o primeiro-ministro, segundo Rangel, com “uma fórmula vaga, remota e pia de que um dia mais tarde, sem prazo, se identificarão, avaliarão e implementarão novos projetos de interligações de eletricidade”. “Em resumo”, disse, “a poderosa indústria nuclear francesa ganhou, as energias renováveis portuguesas perderam”.
Sines terá de “competir com sete terminais em território espanhol”
A segunda razão por que o PSD considera este “um mau acordo” está relacionada com as interligações do gás e com a valorização dos terminais espanhóis de Barcelona e Valência, fazendo com que “Sines deixe de ter importância estratégica”. “Fica assim em causa o objetivo nacional, que tantas vezes repetiu António Costa, de fazer do porto de Sines a porta de entrada atlântica do gás natural liquefeito na Europa”, avaliou Rangel. Isto porque Sines estará ligado a Barcelona, mas terá de “competir com sete terminais existentes em território espanhol”.
Lançando o apelo “senhor primeiro-ministro, mostre-nos o acordo na íntegra”, o vice-presidente do PSD sublinhou ainda: “Temos mesmo de conhecer o acordo, que ninguém sabe como está feito e se está sequer assinado. E temos de começar agora do zero. Foi um desperdício de tempo, dinheiro, logística, trabalho no terreno.” E deixou várias “perguntas essenciais” que estão por responder: “quanto vai custar este projeto a Portugal (quando o anterior tinha todo o financiamento previsto e garantido), quem vai pagar, que aumento terá a fatura de energia dos portugueses, quanto tempo vai demorar?” Se a imprensa espanhola fala em cinco a sete anos, a imprensa francesa já só fala em 2030, lembrou. “Afinal, não será isto apenas areia para os olhos dos portugueses?”, perguntou-se.
Nas interconexões, “pela mão de Costa, passámos de cavalo para burro”
Acresce que se Costa não foi capaz de levar o Presidente francês a cumprir o acordo anterior, “que garantia temos de que vai cumprir este acordo?” – de resto, “um acordo sem prazo, sem preço, que não serve o interesse nacional nem o interesse europeu”. “Em matéria de interconexões, na quinta-feira, pela mão de António Costa, trocámos o valor das nossas renováveis e o potencial do porto de Sines por um prato de lentilhas, passámos de cavalo para burro”, avaliou, dizendo tratar-se “apenas de um número e, para mais, de um número sem números concretos e reais para fazer propaganda”.
Por isso, “o PSD exige a divulgação detalhada dos termos do acordo e uma avaliação técnica, independente das suas consequências”, promovendo para tal “todas as diligências ao seu alcance na Assembleia da República e junto das instituições europeias”. No caso nacional, uma vez que se está a entrar na discussão do Orçamento do Estado, “algumas” dessas diligências terão “provavelmente” de ficar para mais tarde, concedeu.
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