Política

Entre festas, dragões, desfiles e discursos será desta que Marcelo e Bolsonaro ficam a sós?

Entre festas, dragões, desfiles e discursos será desta que Marcelo e Bolsonaro ficam a sós?
MIGUEL PEREIRA DA SILVA/Lusa

Depois de um almoço desmarcado na última visita do Presidente português ao Brasil espera-se que Jair Bolsonaro finalmente abra as portas a Marcelo Rebelo de Sousa. A possibilidade de um encontro a sós está no programa, mas permanecerá em suspenso até acontecer

O Presidente português chega esta terça-feira a Brasília num voo comercial da TAP, com chegada ao aeroporto Juscelino Kubistscheck prevista para as 15h25 locais (em Portugal serão já 19h25) e com um encontro a sós com Bolsonaro no programa. Cerca de três horas mais tarde, a comitiva portuguesa é aguardada no Palácio do Itamaraty, onde Marcelo será recebido pelo ministro das Relações Exteriores do Brasil, Carlos França, acompanhado pela solenidade característica do primeiro regimento da cavalaria de guardas, conhecido como os Dragões da Independência.

Na atual deslocação do Presidente português ao Brasil, tudo parece ser pacífico e divulgável, mas haverá sempre margem para a surpresa, seja porque Marcelo Rebelo de Sousa arranja sempre maneira de ter intervenções extra-programa, sejam porque Bolsonaro também gosta de furar programas e quererá fazer agora o encontro que não aconteceu em julho, quando cancelou o almoço que deveria ter levado o Presidente a Brasília, quando foi ao Brasil comemorar a primeira travessia aérea do Atlântico Sul e acompanhar a Bienal do Livro. Agora, numa nova visita, desta vez oficial, os Presidentes vão estar juntos, mas em cerimónias públicas. O programa tem, contudo, previsto um encontro a sós de 15 minutos já esta terça-feira.

Será no gabinete de Carlos França que Bolsonaro terá encontros com os presidentes da Guiné Bissau e de Cabo Verde, também convidados para o bicentenário da independência. Usa-se o condicional para referir o encontro porque com Bolsonaro nada parece estar completamente garantido, pelo menos a contar com a sua atitude deste verão, quando desmarcou um almoço com Marcelo Rebelo de Sousa por não ter gostado que o Presidente português tivesse se reunido antes com o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva, seu concorrente nas eleições presidenciais deste ano.

Os desencontros de julho foram desvalorizados em Belém, onde contudo esta visita de setembro foi gerando algumas preocupações. Marcelo está convencido que o carácter institucional das cerimónias e a presença de outros chefes de Estado da CPLP (Comunidade de Países de Língua Portuguesa) o defenderá de qualquer agravo por parte de Bolsonaro, assim como de aproveitamentos eleitoralistas por candidato do Presidente-candidato. Contudo, uma vez que estão previstos encontros bilaterais com os outros chefes de Estado presentes, o que seria estranho era não ocorrer com Marcelo.

Corações, receções, desfiles e discursos

Em plena campanha eleitoral, o clima político no Brasil é atualmente muito crispado, com a comemoração do bicentenário da independência a ser considerado um dos momentos mais delicados nos dias que separam a população de 2 de outubro, quando se realizará a primeira volta das eleições para Presidente, senadores, deputados e governadores estaduais.

Assim, a viagem de Marcelo Rebelo de Sousa terá de ser gerida com pinças para que nada possa ser considerado uma ingerência da “ex-metrópole” na vida interna da sua “ex-colónia”. A seguir ao que se espera seja o encontro com Jair Bolsonaro, o Presidente português tem agendada uma visita à exposição “Um coração ardoroso: vida e legado de D. Pedro I”, em que o ponto alto é a presença do órgão do monarca português preservado em formol e emprestado por Portugal aos brasileiros.

Ao início da noite, os chefes de Estado presentes deverão participar de uma receção comemorativa do bicentenário da independência do Brasil nos jardins do Palácio do Itamaraty. E desta forma chega ao fim o primeiro dia da visita oficial de Marcelo Rebelo de Sousa a capital do Brasil.

No dia a seguir, a agenda não será menos intensa, mas certamente deverá ser menos tensa. Ultrapassado o ponto Bolsonaro, a quarta-feira começará logo às 9h com a assistência da comitiva portuguesa ao “Desfile Cívico-Militar do Sete de Setembro”, na Esplanada dos Ministérios.

Desde junho que Jair Bolsonaro tem convocado os seus apoiantes a participarem em manifestações de apoio ao 7 de setembro, de tal forma espera-se milhares de presenças e uma tensão crescente na região da Esplanada dos Ministérios, que, já foi anunciado, vai contar com um reforço na segurança e com o recurso a atiradores de alta precisão e ao esquadrão antibomba do Distrito Federal.

A seguir ao desfile, Marcelo Rebelo de Sousa oferece um almoço aos seus congéneres da CPLP na residência oficial do embaixador de Portugal. À tarde, o Presidente encontra-se com a comunidade portuguesa e está previsto que venha a jantar com o presidente do Senado brasileiro, embora a comunicação social daquele país ainda levante dúvidas sobre a presença de Rodrigo Pacheco em Brasília neste dia.

O outro ponto alto da viagem ocorre na manhã de quinta-feira, quando Marcelo Rebelo de Sousa vai discursar no plenário da Câmara dos Deputados do Congresso Nacional. Findos estes compromissos, o Presidente partirá em direção ao Rio de Janeiro, onde, na manhã de sexta-feira, promove uma receção com a comunidade portuguesa no Navio Escola Sagres. E, ainda neste mesmo dia, regressa a Lisboa.

Polémica diplomática

Esta segunda-feira, a colunista do jornal brasileiro “Globo” Bela Megale publicou um texto em que afirmava que “a exposição do coração de D. Pedro I no Palácio do Itamaraty gerou constrangimento entre boa parte dos diplomatas” daquele país.

“A avaliação feita por integrantes do Ministério das Relações Exteriores é que uma das principais comemorações do bicentenário acabou por se transformar em um ‘evento quase mórbido, de adoração a um órgão conservado em formol, além do uso espúrio do protocolo de Estado para uma espécie de culto anacrónico ao período monárquico’” pode ler-se no artigo.

Segundo Bela Megale, "a leitura de diplomatas é que a data deveria ter sido aproveitada para debater a trajetória histórica do Brasil de maneira mais ampla, ‘estimulando uma reflexão sobre o futuro’”.

O coração de D. Pedro, emprestado pela autarquia do Porto, foi transportado para o Brasil num jato da Força Aérea Brasileira (FAB), tendo sido recebido pelo Presidente Jair Bolsonaro, na rampa do Palácio do Planalto, sede do governo brasileiro. "Dois países, unidos pela História, ligados pelo coração. Duzentos anos de independência. Pela frente, uma eternidade em liberdade. Deus, pátria, família! Viva Portugal, viva o Brasil!", afirmou Bolsonaro durante a receção do órgão. Em Brasília, a exposição ao público do órgão preservado chegou ao fim no último domingo, estando previsto o seu regresso ao Porto ainda esta semana.

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