Política

Três ou quatro coisas sobre o PSD

Três ou quatro coisas sobre o PSD

José Matos Correia

Advogado, presidente do Conselho de Jurisdição Nacional do PSD

Como se os erros do passado não fossem já bastantes, vivemos agora a novela da transição de liderança

Que o PSD atravessa um momento complexo da sua história é manifesto. Que os tempos que se avizinham serão árduos é claro. E que muito daquilo que vem ocorrendo desde as eleições de 30 de Janeiro não ajuda nada é óbvio.

Na discussão interna em curso têm sido identificados desafios que são reais e a que importa atalhar. Surpreendentemente, porém, apontam-se, também, supostas dificuldades que não existem. E, neste texto, gostaria de deixar algumas notas sobre ambos.

Quando qualquer problema sério se coloca, a condição necessária para a sua resolução reside na identificação das respectivas causas.

Assim sendo, a primeira coisa a fazer é reconhecer que a responsabilidade pelos maus resultados eleitorais do PSD é, em larga medida, do próprio PSD.

Com efeito, ficou patente que a estratégia seguida nos últimos anos assentou em vários erros de estratégia.

Em primeiro lugar, numa prática de oposição muito aquém do necessário, agravada pela sistemática insistência na necessidade de estabelecer acordos com o PS, mesmo depois de este não ter respeitado os que foram assinados no início da legislatura e de ter chegado ao ponto de dizer que, no dia em que o Governo dependesse de entendimentos com o PSD, não teria condições para permanecer em funções.

Em segundo lugar, num incompreensível acantonamento político-ideológico, quase diabolizando os votos à sua direita e reiterando, à exaustão, a ideia de que o PSD é, em exclusivo, um partido ao centro.

O resultado dessas más escolhas era previsível e concretizou-se: o partido não foi encarado, por uma significativa percentagem dos eleitores, como uma alternativa real ao PS, não mobilizou, em seu favor, nem os abstencionistas, nem os potenciais votantes situados ao centro e alienou os eleitores á sua direita.

Há quem, em sentido divergente, defenda que as razões da derrota são, fundamentalmente, exógenas, a saber, o esvaziamento dos partidos à esquerda do PS, por via do voto útil, e o crescimento dos partidos à direita do PSD, na medida em que nesse espaço se não gerou uma lógica similar de transferência de apoios.

Mas, mesmo que assim fosse – e, insisto, não foi – a culpa é de quem?! Do PS, que fez aquilo que tinha que fazer?! Dos partidos à direita, que aproveitaram o vazio gerado pela (in) acção política do PSD?!

Como se os erros do passado não fossem já bastantes, vivemos agora a novela da transição de liderança.

Afigura-se-me evidente que não faz qualquer sentido apontar para que o partido só tenha um novo presidente e uma nova direcção política em finais de Junho ou no início de Julho. É que, a ser assim, perder-se-ia, sem qualquer motivo justificativo, tempo precioso, quando aquilo de que o País e o PSD precisam, face à maioria absoluta socialista, é a urgente afirmação de uma oposição exigente e de uma alternativa consistente.

A acrescer a tudo isso, a discussão de nomes. Há que reconhecer que o tema é, por razões óbvias, incontornável. Mas, se alguns dos que são aventados reúnem, indiscutivelmente, condições para assumir a liderança no desafiante período que se avizinha, a circunstância de outros, colocando-se em bicos de pés, quererem arrogar-se uma capacidade e um estatuto que não têm, também não ajuda, em nada, à credibilidade do partido.

Uma coisa boa, ainda assim, emergiu do Conselho Nacional do passado fim de semana: a recusa da ideia peregrina de realização de um Congresso de reflexão interna, que só contribuiria para debilitar, ainda mais, a nossa imagem perante os Portugueses.

O PSD não precisa de parar para meditar, muito menos para falar sobre estatutos e organização interna. Precisa, isso sim, de reagir rapidamente.

Por outro lado, popularizou-se, fora do PSD, mas, o que é pior, também dentro dele, a ideia de que é necessário discutir o que o partido é e para onde deve ir.

Ora, a meu ver, isso é um equívoco terrível. O PSD não precisa de ir para lado nenhum. Precisa, isso sim, de voltar a ser aquilo que tradicionalmente foi e que o conduziu às vitórias eleitorais.

No plano político, um partido interclassista, capaz de recolher apoios no espaço que vai do centro-esquerda à direita democrática.

No plano dos princípios e dos valores, um partido que encara a pessoa humana e a sua dignidade como o referencial primeiro (reconhecendo, consequentemente, a centralidade do princípio da igualdade de oportunidades), que defende a liberdade dos cidadãos e da sociedade no seu conjunto face a um Estado que dificulta – quando não impede – a afirmação de todas as suas potencialidades e que coloca, sempre, o interesse nacional acima de interesses partidários, particulares ou corporativos.

No plano da acção, um partido com cultura de decisão, com capacidade reformista, que valoriza o papel da concertação social, agregador de apoios dos sectores mais

dinâmicos da sociedade, sabendo conciliar estratégias correctas de desenvolvimento, e de modernização, com profundas preocupações sociais.

Não é necessário, portanto, “inventar a pólvora”. E, muito menos, modificar o código genético que é o seu. Basta que o PSD demonstre competência na afirmação da sua identidade própria e da sua mensagem política.

Se o conseguir fazer, não só os apoios, que agora fugiram para outros, retornarão naturalmente, como a eles se somarão os indispensáveis para, sozinho ou liderando convergências à sua direita, assentes, antes do mais, no respeito pelos valores democráticos essenciais, realizar o objectivo essencial: arredar os socialistas do poder e dar, a Portugal, o futuro que merece.

A tarefa é complexa? É! A sua concretização é possível? É! Desde que saibamos levá-la a cabo. E, quanto mais cedo começarmos, melhor.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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