Política

Operação Miríade: ministro dos Negócios Estrangeiros também soube do caso pela imprensa

Operação Miríade: ministro dos Negócios Estrangeiros também soube do caso pela imprensa
MANUEL DE ALMEIDA

“Não me compete saber processos que, aliás, estão em segredo de justiça”, disse Augusto Santos Silva, em declarações à RTP. No entanto, o governante assegurou que o canal para informar as Nações Unidas “foi ativado em devido tempo”. A ONU foi informada pelo ministro da Defesa no início do ano passado, mas o Presidente da República nada soube

Operação Miríade: ministro dos Negócios Estrangeiros também soube do caso pela imprensa

Hélder Gomes

Jornalista

Operação Miríade: ministro dos Negócios Estrangeiros também soube do caso pela imprensa

Hugo Franco

Jornalista

Além de Marcelo Rebelo de Sousa, também o ministro dos Negócios Estrangeiros soube do caso do tráfico de diamantes, ouro e droga que envolve militares portugueses na República Centro-Africana (RCA) através da imprensa. Questionado pela RTP em Paris, à margem da 41.ª Conferência Geral da UNESCO, Augusto Santos Silva disse não lhe competir a ele “saber de processos que, aliás, estão em segredo de justiça”.

“Trata-se de uma investigação judicial que é conduzida sob a responsabilidade das entidades competentes”, acrescentou, lembrando que vigora em Portugal “o princípio da separação de poderes”. Santos Silva garantiu ainda que todos os canais foram ativados. “Quanto ao único elemento com relevância do ponto de vista da política externa, nós temos um canal de comunicação direto entre o Ministério da Defesa Nacional e o departamento das Nações Unidas responsável pelas missões de paz. E esse canal foi ativado para informar as Nações Unidas em devido tempo”, afirmou.

O esquema começava na RCA, envolvendo fornecedores locais de diamantes, ouro e droga, material que era traficado nos aviões militares que não são sujeitos a controlo das autoridades aeroportuárias. Depois, era tudo vendido no norte da Europa, nomeadamente em Antuérpia, na Bélgica.

Em dezembro de 2019, o comandante da 6.ª Força Nacional Destacada na RCA avisou o Estado-Maior-General das Forças Armadas sobre o que se estava a passar. A Polícia Judiciária Militar foi ativada mas depressa o Ministério Público colocou a investigação nas mãos da Polícia Judiciária civil.

O ministro da Defesa, João Gomes Cravinho, disse ter tido conhecimento do caso nessa altura, tendo alertado as Nações Unidas no início do ano seguinte.

O Presidente da República, que é por inerência do cargo o comandante supremo das Forças Armadas, é que não foi informado. Marcelo Rebelo de Sousa revelou que o ministro da Defesa lhe “explicou” esta terça-feira que “naquela altura [início de 2020] comunicou às Nações Unidas, porque se tratava de uma força das Nações Unidas, que havia suspeitas relativamente a um caso em investigação judicial, e que na base de pareceres jurídicos tinha sido entendido que não devia haver comunicação a outros órgãos, nomeadamente órgãos de soberania, Presidência da República ou Parlamento”.

Na véspera, o chefe de Estado, em visita a Cabo Verde, tinha considerado que a investigação “não atinge minimamente o prestígio das Forças Armadas”. “Pelo contrário”, sustentou o Presidente da República em declarações à RTP: o facto de as Forças Armadas investigarem “casos isolados que possam ter ocorrido” e de terem tomado “essa iniciativa” “só as prestigia em termos internacionais”. Desta vez, Marcelo abriu uma exceção, uma vez que “normalmente, em território estrangeiro”, não faz comentários sobre a situação portuguesa. “Mas aqui é uma situação de projeção internacional, de prestígio das Forças Armadas, nomeadamente numa intervenção neste continente, o continente africano”, justificou.

“A ideia é levar as investigações o mais longe possível para apurar o que se passa, confirmar se são casos isolados, como à primeira vista há quem entenda que sejam”, disse ainda. Sendo casos isolados, estes “não afetam em termos de generalização e de prestígio das nossas Forças Armadas, que está incólume”. Um prestígio que o Presidente disse ser “exatamente o mesmo” que testemunhou em março de 2018, quando esteve na RCA.

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