A importância para Portugal do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) é tanta que António Costa quer ser o primeiro a entregar à Comissão Europeia o esboço do PRR. Está esta quinta-feira em Bruxelas a entregar em mãos o documento que foi evoluindo desde a sua primeira apresentação, em Setembro. A proposta que foi entregue a Ursula von der Leyen tira dinheiro de umas "gavetinhas" e põe noutras. As mudanças são mais visíveis nas rubricas destinadas às empresas e nas componentes destinadas às infraestruturas, florestas e gestão hídrica. Por fim, Costa deixa um grande ponto de interrogação para negociar com Bruxelas: há medidas que afinal podem ter de ser feitas com recurso a empréstimos, no valor total de 4.295 milhões de euros, desde que se encontre uma maneira de não pesarem na dívida pública.
As contas fazem-se agora aos 13,9 mil milhões de euros de subvenções (dinheiro que pode ser utilizado sem custos do lado português). À partida poderia haver uma diferença para os 12,9 mil milhões anunciados em Setembro, mas os mil milhões a mais explicam-se por serem agora a preços correntes, com a atualização da inflação. Contudo, a diferença entre o plano inicial de Costa e o que agora entrega em Bruxelas, é mais na distribuição das verbas pelas várias componentes do plano do que do seu valor global.
Para responder às exigências europeias, Portugal divide o plano em três grandes áreas: medidas para a Resiliência, que tem alocados 7.449 milhões de euros; medidas para a Transição Climática, com verbas de 2.703 milhões de euros e para a Transição Digital de 2.651 milhões de euros.
Estes grandes números mostram que a distribuição pesou mais nas áreas da Resiliência e da Transição Digital. Os valores para a Transição Climática no global permaneceram idênticos, mesmo com a atualização para preços correntes: nesta gaveta de fundos, há apenas uma diferença a assinalar, havendo uma dotação superior para a mobilidade sustentável (1.031 milhões de euros) e um pouco menos (mesmo a preços constantes) para "Descarbonização e Bioeconomia" (865 milhões em vez de 925 milhões).
A dotação superior na mobilidade sustentável explica-se pela inclusão da expansão do metro de Lisboa até Alcântara (304 milhões) e do Metro do Porto entre a Casa da Música e as Devesas (299 milhões). Ainda ontem, o primeiro-ministro, na apresentação do PRR numa sessão pública em Lisboa, explicava que tinha decidido neste ponto por trocar no PRR a aquisição de material circulante (que passou para o quadro financeiro plurianual) e pelos metropolitanos.
Mais para as empresas
Durante a apresentação do PRR, António Costa tinha sinalizado que tinha alterado as dotações depois de ouvir as críticas, nomeadamente do PSD que referiu que deveria haver mais dinheiro para as empresas. Costa acabou a alocar mais dinheiro a "gavetinhas" a que as empresas também possam concorrer. Dos grandes números entregues em Bruxelas, há uma diferença na grande área da Transição Digital: o governo retira verbas à Escola Digital e aloca-as ao programa Empresas 4.0 (mais 150 milhões de euros a preços correntes) e menos à Administração Pública Digital (na ordem dos 300 milhões a menos, cifrando-se agora nos 1.500 milhões de euros).
Contas feitas por alto, António Costa acredita que só para as empresas há um total de seis mil milhões de euros a que podem concorrer, sozinhas ou acompanhadas com outras entidades, além de, disse, serem as "maiores beneficiárias" das obras públicas que vão ser lançadas. "Não é o Governo a construir, é uma empresa", argumentou, para sublinhar que seriam beneficiárias também indiretamente.
Das três grandes áreas, a que mais muda é a da "Resiliência". O nome desta área esconde investimentos em áreas tão importantes como a saúde, a habitação, as respostas sociais, mas também as respostas direcionadas à coesão territorial e à competitividade. Este é o grupo com mais verbas alocadas, num total de 7.449 milhões de euros. Dentro deste grande grupo, o governo redistribuiu as verbas, apostando agora mais nas medidas destinadas à "competitividade e Coesão Territorial".
O que isto quer dizer é que António Costa quer apostar mais nas "Agendas mobilizadoras para a Reindustrialização", na Floresta e na gestão dos Recursos Hídricos. Nestas rubricas, há cerca de mais 250 milhões de euros.
As dúvidas dos empréstimos
Há um grande ponto de interrogação neste Plano de Recuperação e Resiliência. Quando apresentou as linhas gerais em Setembro, o primeiro-ministro deixou claro que não queria recorrer à fatia dos empréstimos, apenas às subvenções. Mas no esboço entregue em Bruxelas há um quadro sobre as "dúvidas" que o Governo tem sobre três investimentos que quer fazer. São "investimentos que requerem clarificação" se têm de ser classificados ou não como "empréstimos".
São eles o grande investimento de 2.745 milhões de euros na criação de um parque público de habitação, os 300 milhões de aquisição de material circulante (que António Costa admitiu ter trocado pelos metros de Lisboa e Porto neste programa) e por fim a "capitalização de empresas e resiliência financeira/Banco do Fomento) num valor também avultado de 1.250 milhões de euros. Dois destes três investimentos são as grandes apostas do ministro das Infra-estruturas e Habitação, Pedro Nuno Santos. A ideia é negociar com Bruxelas uma solução que não pese na dívida pública.
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