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Centeno recusa divulgar relatório... que o Governo de Costa queria conhecer

Mário Centeno e Carlos Costa
Mário Centeno e Carlos Costa
LUÍS BARRA

Quando Centeno estava no Governo, Costa chegou a revelar ter "muita curiosidade" em conhecer a auditoria à ação do Banco de Portugal na resolução do BES. Agora, Banco de Portugal recusa divulgar o documento

Centeno recusa divulgar relatório... que o Governo de Costa queria conhecer

Liliana Valente

Coordenadora de Política

"Nós, o governo, solicitámos ao BdP o envio da auditoria e o BdP não nos revelou a auditoria. Pergunta-me se eu tenho curiosidade? Claro que tenho curiosidade. Todos temos curiosidade, qualquer português tem curiosidade.” As palavras, ditas em resposta a Catarina Martins durante um debate quinzenal, são de António Costa, então com Mário Centeno como ministro das Finanças a seu lado. Agora, o mesmo Centeno - mas já enquanto governador do Banco de Portugal - acaba de recusar... divulgar esse mesmo relatório, relativo à atuação do Banco de Portugal no processo de resolução do BES.

A recusa chegou ao Bloco de Esquerda na manhã desta quarta-feira. De acordo com a carta a que o Expresso teve acesso e que é assinada pelo secretário-geral do Banco de Portugal, José Queiró, o documento não pode ser revelado porque se encontra "sujeito a dever de segredo". A violação dessa norma, prossegue a carta, implicaria uma violação do Código Penal. "Neste contexto, e não se encontrando verificada nenhuma das circunstâncias legalmente previstas que determinam o afastamento do referido dever legal de segredo, o Banco de Portugal encontra‐ se impedido de proceder ao envio", termina.

A carta chegou em resposta a um requerimento enviado pelo Bloco de Esquerda no final de julho, de forma a que fosse a nova administração do regulador da banca - já presidida por Mário Centeno - a decidir. Esse requerimento exigia a divulgação dos resultados da auditoria interna à atuação do próprio regulador na resolução do BES.

Como o Bloco recordava no texto, a auditoria nunca foi conhecida e o antigo governador, Carlos Costa, referia-se a ela como um "documento interno, para uso interno, pedido pelo governador", ou seja, pelo próprio. Por isso, argumentava o partido, e tendo em conta as declarações de Mário Centeno na sua audição para suceder a Carlos Costa - em que chegou a dizer que o governador não pode viver numa "torre de marfim" -, Centeno deveria manter a posição do Governo que integrou e revelar o documento.

A história desta auditoria interna já vai longa. Nos últimos anos, várias têm sido as tentativas para conhecer o relatório que ficou conhecido como "relatório Costa Pinto", nome do então presidente do Conselho de Auditoria do Banco de Portugal. O documento explosivo para a atuação do banco foi sempre pedido pela esquerda, incluindo pelo PS, nas várias comissões de inquérito (CPI) bancárias, nas CPI ao BES, mas também na CPI à recapitalização da Caixa Geral de Depósitos. Foi nesta última comissão de inquérito à CGD que João Costa Pinto chegou a ser ouvido e que defendeu que o tal relatório secreto é "útil para não se repetirem erros passados". Contudo, explicava que o documento era confidencial, protegido pelo sistema europeu de bancos centrais e que quem o deveria revelar era quem o tinha pedido, no caso, Carlos Costa, então governador do Banco de Portugal. Aliás, de acordo com informações dadas nas comissões de inquérito foi o então governador o único a aceder ao relatório.

Tendo em conta que a autoridade que decidiu a resolução bancária do BES foi o Banco de Portugal e dado que a resolução do BES foi experimental, os partidos têm tentado perceber como é que o próprio banco viu a sua atuação naquele caso, sem sucesso. Durante os anos em que foi pedida, só se ficou a conhecer as recomendações que o documento deixava, nunca as suas conclusões. Também ainda não foi desta, contudo, poderá estar a caminho nova comissão de inquérito ao universo Novo Banco (antigo BES). E é quase certo que este será um dos documentos pedidos.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: lvalente@expresso.impresa.pt

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